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A internet e o presunto

Anda circulando pela internet um vídeo sobre o presunto pata negra. Aproveito para passar para o leitor algumas informações que já dei neste espaço, anteriormente. Desde a mais remota antiguidade, o homem compreendeu ser necessário armazenar o que havia caçado. Como uma estratégia de sobrevivência. E logo aprendeu que, para preservar as carnes por mais tempo, bastava tirar delas todo o líquido. Persunctu, em latim, quer dizer exatamente isso – inteiramente sugado. Presuntos, assim dizemos delas. Curioso é que, mesmo quando servidas cruas, elas não estragavam. Precisamente por serem curadas, inibindo assim o crescimento de bactérias. Sem contar que o processo não apenas funcionava bem, como ainda deixava essas carnes muito mais saborosas. Sobretudo as de porco. A fabricação dos presuntos se faz, desde muito, por etapas bem definidas – salga, defumação, secagem, condimentação, maturação. “Há quase tantos presuntos quantas sejam as combinações entre esses cinco procedimentos”, sugere Robert Wolke (em O que Eisntein disse a seu cozinheiro – ciência na cozinha). Mas, entre esses tantos, nenhum se iguala ao presunto (em espanhol, jamón) conhecido como pata negra. No gosto e na fama.  O segredo de sua qualidade está na rigorosa técnica de preparar, claro. Mas, também, na raça do porco, a ibérica – um animal quase selvagem, gordo, com pelos negros, pernas longas, canelas finas e famosas unhas escuras (nem sempre, em verdade). Daí veio seu próprio nome, pata negra. 

Esses porcos, domesticados há mais de cinco mil anos, ainda hoje continuam sendo criados livres. Dividindo espaço com ovelhas, em regiões montanhosas e arejadas. Na Espanha, em Dehesa (Extremadura, limite com Portugal), responsável por 80% da produção mundial; em Guijuelo e Candelario (Salamanca) e em Jabugo (Andaluzia). E, em Portugal, no Alentejo e no Algarve. Só nesses lugares. Fora dali, todos os rebanhos suínos são de raças brancas europeias. Especialmente, a Duroc-Jersey. Apesar de menos famosos, destaque para: os italianos de Parma e San Daniele; os ingleses de York; os belgas de Ardennes; os alemães da Floresta Negra; os chineses de Yunnan; os norte-americanos de Kentucky, Vermont, Geórgia, Carolina do Norte e Virginia; e os excelentes serranos portugueses, claro. 

A qualidade da carne (aroma e sabor) é determinada, basicamente, pela alimentação do porco. Melhor é o jamón ibérico de bellota – com os que comem só bolotas (bellotas, em espanhol), frutos do azinheiro e do sobreiro (a árvore da cortiça), com cada animal chegando a consumir até 12 quilos delas (e a engordar até 1 quilo) por dia. Depois, menos valorizado, o jamón ibérico de recebo – com os que se alimentam de bolotas e cereais. Por fim, de menor qualidade, o jamón ibérico de pienso – com os que se alimentam apenas de cereais. Em todos os casos, esses porcos são abatidos em chacineria, quando atingem por volta dos 140 quilos (entre 14 e 18 meses). Depois de mortos por choque elétrico (única novidade recente, no processo), cumprem ritual que se reproduz há séculos. Primeiro sendo lavados em água morna, tosados e resfriados por 24 horas. Depois, cortados em partes, reservando-se as pernas traseiras para fazer presunto. Do restante da carne do ibérico se faz chorizo – fino ou grosso, seco ou defumado, temperado com ervas e colorau; e lomo embuchado – lombo curado, limpo de gorduras e bem temperado.

As carnes destinadas ao presunto são penduradas, até que todo o sangue escorra. Em seguida, cobre-se tudo com uma camada grossa de sal, permanecendo assim por 14 dias. Próximo passo é lavar e armazenar, por seis semanas, em locais frescos (entre 6º e 8º C) que mais parecem adegas. Após o que se inicia o processo da cura, pendurando-se o presunto (com cordas ou ganchos) em secadores (secaderos). A entrada de ar fresco é regulada por dispositivo especial. Essas carnes então transpiram, chegando a perder até um terço do seu peso inicial. Depois vão para local com temperatura ainda menor, onde ficam penduradas por mais 14 meses. Tempo necessário para que um fungo, o Penicillium roquefortis (aquele mesmo do queijo roquefort), possa cobrir as carnes, já com sua gordura marmorizada, produzindo sabor e aroma característicos do presunto. Nesse ponto um calador faz a prova, espetando o punze (objeto pontiagudo, feito de osso ou chifre) em várias partes do jamón, daí retirando pedacinhos de carne. Se tiver as qualidades exigidas, fica ainda mais algum tempo curando. Quando não, é logo descartado. Todo o processo de preparação e cura dura, em média, 30 meses. Depois de pronta, cada peça terá entre seis e oito quilos. Nasce, então, o presunto pata-negra. Que tem um só defeito, nesse vasto e insensato mundo. E grande. O preço.

Receita:

Pão de tomate com presunto cru 

Ingredientes:


8 fatias de pão italiano, dentes de alho sem casca, 4 tomates maduros, 120 ml de azeite de oliva, 150 g de presunto cru (Pata negra ou Parma) cortado em fatias finas.

Preparo:


Asse levemente as fatias de pão.


Esfregue o alho, delicadamente, em cada fatia.


Corte os tomates ao meio e esfregue, também, a polpa nas fatias.


Regue cada fatia com azeite de oliva e cubra com o presunto cru.

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Fonte: Folha PE
Autor: Letícia Cavalcante

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