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Erdogan venceu a eleição na Turquia no domingo (28/5)

A reeleição de Erdogan deve significar a continuidade de seu projeto: de consolidação da Turquia como potência regional no cenário internacional — com relações ambíguas com o Ocidente e de proximidade com a Rússia.

Internamente, Erdogan é considerado um promotor do desenvolvimento turco e também se posiciona contra o secularismo no país.

Erdogan governa a Turquia há quase nove anos e é considerado o político mais poderoso do país nos últimos anos. Mesmo assim, ao chegar ao pleito deste ano, ele estava em sua posição vulnerável, e seus oponentes acreditavam que poderiam derrotá-lo.

Críticos culpam suas políticas econômicas por exacerbar a crise do custo de vida na Turquia. Os preços dos alimentos disparam e a inflação atingiu 43% em 12 meses até abril de 2023.

Depois de sobreviver a uma tentativa de golpe em 2016, ele concentrou ainda mais poderes na presidência, reprimindo seus oponentes e dissidentes.

Potência regional

Como primeiro-ministro desde 2003 e depois como presidente desde 2014, Recep Tayyip Erdogan ampliou a influência da Turquia como potência regional e promoveu causas islâmicas.

Embora seja chefe de Estado de um país da Otan — a aliança militar que se opõe à Rússia na guerra da Ucrânia — Erdogan se posicionou como um intermediário na guerra e dificultou a entrada da Suécia na aliança defensiva ocidental. Sua diplomacia irritou aliados na Europa e no Ocidente.

Erdogan mantém laços estreitos com Vladimir Putin há anos. Ele comprou um sistema de defesa antimísseis russo e escolheu a Rússia para construir o primeiro reator nuclear da Turquia.

Sua vitória agradou ao Kremlin. Este é o resultado que o presidente Vladimir Putin queria — não é surpresa que ele tenha sido um dos primeiros a parabenizar o líder turco. Putin fez o que pôde para influenciar no resultado, inclusive adiando um pagamento de US$ 600 milhões pelo gás natural russo.

Antes da eleição, Erdogan procurou reforçar suas credenciais junto aos eleitores nacionalistas e conservadores, acusando o Ocidente de agir contra ele.

“Minha nação vai frustrar essa conspiração”, afirmou.

Os presidentes dos EUA e da França também parabenizaram Erdogan, logo depois de Putin.

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Erdogan tem bom trânsito com Vladimir Putin

Apesar de não gostarem da aproximação de Erdogan com o Kremlin e de seu histórico com relação à liberdade de expressão e democracia, para eles a Turquia ainda é um aliado crucial — embora difícil e imprevisível.

A Turquia é um membro chave da aliança militar da Otan, participando de todas as suas missões. Erdogan pode manter laços estreitos com a Rússia — mas também fornece ajuda militar à Ucrânia.

Ele negociou um acordo pelo qual a Rússia pôs fim a um bloqueio ao fornecimento de grãos da Ucrânia, permitindo que os grãos chegassem a partes do mundo que dependem deles.

Após longa hesitação, ele deu sua aprovação oficial para a Finlândia, vizinha da Rússia, ingressar na Otan. No entanto, a Turquia — assim como a Hungria — ainda não aprovou o ingresso da Suécia.

No passado, Erdogan foi um defensor ferrenho da entrada da Turquia na União Europeia. Mas hoje em dia ele fala em “tornar a Turquia grande novamente”. Para ele, isso significa adotar uma política externa mais independente.

País dividido

A Turquia é considerada hoje um país mais dividido.

Erdogan polarizou seu país, mas sempre saiu por cima. Seus partidários o chamam de reis, palavra turca que significa “chefe”.

Acusando seus oponentes de tratar o eleitorado da Turquia com desprezo e não conseguir conquistá-los, ele declarou após a vitória: “Como 85 milhões, protegeremos nosso voto, nossa vontade e nosso futuro.”

O oponente de Erdogan — Kemal Kilicdaroglu — terminou o pleito apenas quatro pontos percentuais atrás dele. Essa polarização será agora um desafio para Erdogan administrar.

Em sua campanha, Kilicdaroglu inicialmente prometia uma nova primavera para a Turquia. Mais tarde, ele enveredou para a direita, prometendo expulsar todos os refugiados. Isso lhe rendeu algum apoio extra entre os nacionalistas, mas não o suficiente para ganhar a eleição.

Recep Tayyip Erdogan é um líder com formação islâmica.

Muitos que compareceram à festa de vitória de Erdogan disseram que a reeleição do presidente é um recado para o mundo.

“Fomos abençoados pelo fato de nosso presidente estar novamente nos liderando”, disse Hatice Duran, de 50 anos. “Não há outro sentimento maior do que este. Deixe o mundo ouvir isso. Ele é o líder que desafiou o mundo inteiro e ensinou uma lição ao mundo inteiro.”

Essa é uma parte fundamental de seu apelo aqui: Erdogan é um líder forte, uma espécie de “sultão moderno” que não se curva.

Em seu discurso de vitória, Erdogan disse que “apenas a Turquia foi a vencedora” — e atacou a oposição e a comunidade LGBTQ.

Ambos podem agora ser ainda mais visados, e os direitos humanos e a liberdade de expressão podem ser ainda mais corroídos nos próximos anos, segundo analistas. Há poucos freios e contrapesos, e Erdogan não é conhecido por sua moderação.

Os que queriam mudanças na Turquia — quase 48% dos eleitores — ficarão desapontados, e talvez com medo.

Muitos prevêem que haverá mais religião e menos liberdade na vida pública desta república secular, que marcará seu centenário em outubro.

A Turquia é agora uma nação dividida com uma economia falida. Os críticos dizem que o presidente não tem solução para nenhum dos dois problemas.