Antes de revelar publicamente que sofreu um estupro e que ficou grávida após o crime, a atriz Klara Castanho, de 21 anos, teve detalhes sobre sua situação vazados para a imprensa e para o meio artístico.
No sábado (25/06), a atriz publicou em suas redes sociais um texto contando que foi vítima de violência sexual, que engravidou em consequência do estupro e que, mesmo tendo direito ao aborto legal, decidiu levar a gravidez até o fim e posteriormente entregar a criança para adoção.
Klara disse que resolveu fazer o “relato mais difícil” de sua vida porque havia diversas pessoas comentando o seu caso publicamente e a atacando nas redes sociais – embora seu nome não tivesse sido revelado, outras informações e detalhes do caso tornavam possível sua identificação.
A jovem disse ainda que, logo após o parto, enquanto ainda estava sob os efeitos da anestesia, foi abordada por uma enfermeira que teria especulado em voz alta sobre uma possível publicação das informações.
Tanto a Constituição brasileira quanto as regras de sigilo médico protegem os dados de saúde dos pacientes, e uma violação da privacidade e do sigilo como a sofrida pela jovem é algo ilegal em diversas esferas.
“Em um vazamento de dados de saúde, temos não só a questão do sigilo profissional – as profissões da área de saúde tem normas próprias sobre o sigilo – quanto um dano moral é um ilícito por parte do hospital quanto à LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados)”, afirma o advogado e doutor em direito José Luiz Toro, especialista em direito de saúde.
As consequências do vazamento
Registros médicos e dados sobre saúde em geral são considerados dados pessoais sensíveis pela LGPD, diz Toro.
Ele explica que o vazamento dessas informações – tanto no caso de uma pessoa famosa quanto no caso de alguém menos conhecido – pode gerar consequências em diversas esferas.
Uma delas é o campo profissional – médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde têm o dever ético de manter sigilo quanto às informações dos pacientes.
As entidades responsáveis por investigar situações de infração ética por parte de profissionais de enfermagem são o Coren (Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo) e o Cofen (Conselho Federal de Enfermagem).
Tanto o Coren quanto o Cofen afirmam que estão apurando se teria sido uma enfermeira quem divulgou detalhes sobre o caso de Klara à imprensa.
O Cofen divulgou uma nota manifestando “profunda solidariedade” à atriz e dizendo que tomará todas as providências para a identificação de responsáveis pelo vazamento.
“Após ser vítima de violência sexual, (Klara) teve o seu direito à privacidade violado, durante processo de entrega voluntária para adoção, conforme assegura o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”, diz a entidade.
De acordo com o código de ética da enfermagem, infrações éticas podem ser punidas com advertência, multa, suspensão temporária do exercício profissional e – em casos mais graves – cassação do registro, ou seja, fim do direito de exercer a profissão.
A possível penalidade aplicada no caso específico de Klara vai depender das investigações e das decisões do Coren e do Cofen.
Danos morais
Segundo José Luiz Toro, um caso de vazamento de dados de saúde por profissional também pode dar direito a uma indenização na esfera da Justiça Civil.
“Para isso acontecer, a pessoa que se sente lesada teria que entrar com um processo contra o profissional que fez o vazamento”, afirma. “São questões relacionadas aos direitos de personalidade, à vida privada.”
O valor de indenizações por dano moral, no entanto, não costuma ser muito alto na Justiça brasileira – raramente ultrapassando os R$ 100 mil. “A jurisprudência tem sido modesta quanto a esses valores”, explica Toro.
O hospital
Um hospital de onde dados de saúde tenham sido vazados também pode enfrentar consequências legais, segundo Toro.
Caso a vítima decida processar o hospital, a Justiça pode determinar que a entidade também faça uma indenização por danos morais.
Além disso, a instituição também está sujeita a punições relativas à LGPD. Informações sobre saúde são considerados dados pessoais sensíveis, portanto têm direito a uma proteção extra dentro da Lei Geral de Proteção de Dados, explica Toro.
Caso as autoridades de proteção de dados entendam que a instituição responsável por um vazamento cometeu uma infração da LGPD, explica o advogado, o hospital pode ter que pagar uma multa – que vai até R$ 50 milhões. O dinheiro, no caso, não iria para a pessoa lesada, mas para um fundo de proteção de dados.
O hospital onde a atriz ficou internada, na região metropolitana de São Paulo, disse em nota que uma sindicância interna foi aberta para investigar o caso denunciado pela jovem.
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