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Tarcísio ao lado do então presidente Bolsonaro

Segundo pesquisas com eleitores do ex-presidente, o nome que tem despontado com mais força para herdar seus votos é o do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Para analistas políticos ouvidos pela BBC News Brasil, Tarcísio tem três pontos fortes que o tornam competitivo para representar a direita na disputa pelo Palácio do Planalto:

  • projeção nacional por comandar o Estado mais poderoso do país;
  • forte identificação com o bolsonarismo, já que foi ministro da Infraestrutura durante todo o governo Bolsonaro e disputou o governo paulista com apoio do ex-presidente;
  • e, ao mesmo tempo, uma postura vista como mais moderada, que dialoga bem com o campo conservador mais tradicional — característica que fica clara pela aliança com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, seu Secretário de Governo e ex-ministro dos governos do PT.

A conjunção desses fatores, dizem analistas, permitiria ao governador de São Paulo atrair tanto o apoio do eleitorado bolsonarista, como de setores mais moderados da centro-direita.

“Ele tem o que o Bolsonaro tem de melhor, que é o apoio da direita, sem os problemas que o Bolsonaro tem, como a rejeição acumulada durante a pandemia de covid e pelas declarações, infelizes para muita gente, sobre democracia”, nota o cientista político Felipe Nunes, diretor do instituto de pesquisa Quaest.

O governador de São Paulo, em declaração semanas antes de sua posse, disse que “nunca foi bolsonarista raiz”.

“Comungo das ideias econômicas principalmente desse governo Bolsonaro. A valorização da livre iniciativa, os estímulos ao empreendedorismo, a busca do capital privado, a visão liberal. Sou cristão, contra aborto, contra liberação de drogas, mas não vou entrar em guerra ideológica e cultural”, se autodefiniu, em entrevista à emissora CNN Brasil.

Para Camila Rocha, doutora em Ciência Política e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) , “Tarcísio tem um pé no bolsonarismo, mas também tem um pé no campo das direitas mais tradicionais”.

Ela ilustra a importância dessa articulação política mais ampla citando o andamento da disputa pela prefeitura de São Paulo em 2024.

De perfil mais extremo, outro ex-ministro de Bolsonaro, o atual deputado federal Ricardo Salles (PL-SP) acabou não conseguindo viabilizar sua pré-candidatura, porque seu partido preferiu apoiar a reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Ele anunciou sua desistência após o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, afirmar ao canal CNN Brasil: “O que eu penso para São Paulo é que não podemos ter um candidato de extrema-direita, porque (o deputado Guilherme) Boulos (do PSOL) vem forte. São Paulo é uma cidade com votos de esquerda. Temos que ter um candidato de centro-direita em São Paulo”.

‘Todos respondem: Tarcísio’

A percepção dos analistas sobre a força do governador de São Paulo para liderar a direita tem base em pesquisas.

Levantamento realizado pela Quaest em junho questionou eleitores em todo o país sobre quem o ex-presidente deveria apoiar em 2026.

Tarcísio foi o nome mais citado entre aqueles que disseram ter votado em Bolsonaro em 2022, com 33% das menções espontâneas.

A ex-primeira dama Michelle Bolsonaro (PL) foi a segunda mais citada (24%), seguida do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), com 11%. O senador Flávio Bolsonaro (PL), filho mais velho do ex-presidente, ficou em quarto, citado por 5% dos entrevistados.

Outra pesquisa da Quaest, desta vez com 92 gestores de fundos, economistas, analistas e outros atores do mercado em São Paulo, também apontou Tarcísio como o preferido da Faria Lima, como é conhecido o polo financeiro da capital paulista.

Para 48% dos entrevistados, Tarcísio será o principal líder da oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos próximos quatro anos.

O governador, que faz questão de usar jargões dos operadores do mercado em suas falas e discursos, ficou à frente mesmo de Bolsonaro (34%) e ganhou com folga de Zema (7%) e de Flávio (2%). A opção “nenhum desses” foi escolhida por 10%.

Enquanto o governo federal sob Lula deu uma guinada pró-Estado e não prevê privatizações, um dos principais projetos de Tarcísio é ceder o controle da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, a Sabesp, à iniciativa privada e defende fazer o mesmo com o Porto de Santos, embora essa decisão não caiba apenas ao governo paulista.

Pesquisas qualitativas com eleitores de Bolsonaro também revelam uma preferência por Tarcísio, aponta Camila Rocha.

Ela estuda o bolsonarismo junto com a pesquisadora Esther Solano e tem se reunido com eleitores do ex-presidente em grupos focais semanais.

“Quando a gente pergunta para as pessoas em quem gostariam de votar para presidente na próxima eleição, todo mundo que votou no Bolsonaro responde: Tarcísio”, diz Rocha.

A pesquisadora lembra que Tarcísio construiu, com apoio de Bolsonaro, uma imagem de ministro “técnico”, com “capacidade executora”, enquanto comandou o Ministério da Infraestrutura, o que contribuiu para sua eleição em São Paulo.

“Ele já era popular entre os eleitores do Bolsonaro quando era ministro. Mas ele é alguém que transita muito melhor (com outros setores). Tem uma forma de comunicação que é muito mais suave em comparação com a agressividade do Bolsonaro, dos filhos dele”, avalia Rocha.

Um exemplo desse maior “jogo de cintura” foi o recuo de Tarcísio no tema das câmeras corporais adotadas pela polícia de São Paulo no governo anterior, de João Doria, que resultaram em redução da violência policial.

Durante a campanha, ele adotou um discurso bolsonarista contra um controle maior das polícias e disse que acabaria com o uso desse instrumento, mas acabou mantendo as câmeras, diante da repercussão ruim.

Ele também tem mantido uma relação institucional respeitosa com Lula.

“Para o Brasil ir bem, São Paulo tem que ir bem, agora eu e o presidente Lula somos sócios, temos que torcer para que o Brasil vá bem”, afirmou em fevereiro em evento do agronegócio realizado pela consultoria XP.

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Tarcísio de Freitas tem buscado relação republicana com Lula

Ao analisar outros nomes do campo bolsonarista, Camilla Rocha avalia que Zema tem menos condições de ocupar o espaço do ex-presidente, por ser de um partido pequeno (Novo) e não ter alianças políticas fortes, como a parceria entre Tarcísio e Kassab em São Paulo.

A pesquisadora também não considera os filhos mais velhos do ex-presidente —Flávio, Eduardo (deputado federal por São Paulo pelo PL) e Carlos (vereador no Rio de Janeiro pelo Republicanos) — fortes o suficiente para uma disputa nacional. Sua percepção é que há uma visão negativa sobre eles mesmo entre os eleitores de Bolsonaro.

“As pessoas associam os filhos do Bolsonaro a esquemas de corrupção, como o caso da (acusação de suposta) rachadinha do Flávio Bolsonaro. Ou então associam com um perfil de pessoas com pouca autonomia, pouca luz própria, muito ligados ao pai. As pessoas falam até que seriam meio mimados”, nota Rocha.

Por outro lado, Rocha enxerga potencial de Michelle Bolsonaro na política nacional. Mas avalia que a ex-primeira-dama, que nunca exerceu um cargo público antes, seria mais vista como candidata a vice-presidente.

“Ainda que ela defenda pautas bolsonaristas, faz isso de uma forma muito menos belicosa, mais agregadora”, avalia. “E, da família Bolsonaro, com exceção do Jair, ela é a pessoa com melhor desempenho nas redes sociais. Tem carisma.”

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Michelle Bolsonaro nunca ocupou cargo político, mas agora preside o PL Mulher

Governador desconversa sobre 2026 — por enquanto

Com mais de três anos para a eleição presidencial, o cenário político pode mudar, claro, e Tarcísio deixar de ser o nome mais forte do campo da direita. Ele próprio tem evitado se colocar como um presidenciável com tanta antecedência.

O governador foi questionado em fevereiro sobre seus planos para 2026 durante um evento do banco Credit Suisse, mas desconversou, dizendo que não estava preocupado com isso.

“Estou torcendo para o Brasil dar certo, mas se governo Lula não for bem, vejo possibilidade grande de centro-direita voltar”, avaliou, sem se comprometer como possível candidato.   

Kassab também já afirmou que o “natural” seria ele tentar um segundo mandato em São Paulo. E lembrou, em entrevista à revista Veja, que políticos apressados não tiveram bom resultado nacional, citando como exemplo os ex-governadores tucanos de São Paulo João Doria e José Serra.

Ambos deixaram a prefeitura de São Paulo no meio do mandato para disputar o governo estadual — e foram eleitos. Mas, depois, não conseguiram viabilizar o sonho presidencial.

Felipe Nunes, da Quaest, acha improvável que Tarcísio não seja lançado a presidente caso se firme como o candidato mais forte na direita. Na sua leitura, é mais estratégico não se lançar cedo e tentar evitar desgastes.  

O senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente do PP e ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, é dos que cravam Tarcísio como o favorito para suceder Bolsonaro na direita. Na sua avaliação, Michelle seria uma candidata forte ao Senado.

“Política é fila. O número um é o governador Tarcísio”, afirmou em entrevista ao portal UOL.

Moderado… e sem carisma?

Se, por um lado, Tarcísio parece ter potencial para uma articulação política mais ampla, ele não tem a mesma força carismática de Bolsonaro, avalia Fabio Baldaia, professor de Sociologia do Instituto Federal da Bahia e Pesquisador do Laboratório de Estudos Brasil Profundo.

“Bolsonaro não é exatamente um estadista, um líder político brilhante, não é o Tancredo (Neves), não é o Lula, um Getúlio (Vargas) ou o FHC (Fernando Henrique Cardoso), mas ele consegue estabelecer uma relação de conexão carismática com a população”, ressalta.

“É como se ele representasse aquele brasileiro comum. Não estou dizendo que seja verdadeiro, mas ele faz parecer que ele está representando o brasileiro comum.”

Baldaia, porém, também avalia que há uma tendência de redução da polarização no país, à medida que Bolsonaro vem perdendo força política. Isso, diz, deve favorecer um candidato à direita com perfil mais moderado como Tarcísio.

Ele acredita que valores conservadores mobilizados por Bolsonaro, como a preocupação com segurança pública, costumes e a defesa de um Estado que interfira menos na sociedade, seguem presentes em parte relevante da população e garantem espaço eleitoral para o candidato que conseguir articular essas agendas.

“Em um primeiro momento, não vejo um bolsonarismo pós-Bolsonaro viável. Será viável uma direita, mas essa direita vai se organizar sobre outras bases, não mais uma base do modo de conduta bolsonarista”, diz.

Para Felipe Nunes, da Quaest, a força carismática de Bolsonaro o manterá como um importante cabo eleitoral.

O levantamento do instituto realizado neste mês mediu também qual o peso do seu apoio. Para 64% dos eleitores que votaram nele em 2022, o apoio do ex-presidente aumenta as chances de voto em determinado candidato.  

“Qual é a importância de Bolsonaro? É que ele, de fato, tem identidade com uma parcela importante da sociedade e ele mobiliza essas pessoas. É difícil achar um substituto para o Lula (com essa força carismática no campo da esquerda), assim como é difícil achar um substituto pro Bolsonaro”, analisa.