Crédito, Getty Images

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou a jornalistas nesta terça-feira (18/4) que o governo desistiu de derrubar a isenção do imposto de importação para compras de até US$ 50 entre pessoas físicas.

A proposta havia sido anunciada na semana passada.

Segundo Haddad, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediu na segunda-feira (17) que, em vez de derrubar a isenção, haja foco em combater fraudes e em acirrar a fiscalização.

“O presidente pediu para tentar resolver isso administrativamente, usar o poder de fiscalização da Receita Federal, sem a necessidade de mudar a regra atual. Porque estava gerando confusão de que isso poderia prejudicar as pessoas que, de boa fé, recebem encomendas do exterior”, disse o ministro, reconhecendo que “não vai ser fácil” aumentar a fiscalização e que isso pode trazer mais custos.

Haddad afirmou que, nos últimos dias, foi contatado pelo presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e por diretores de várias empresas de varejo, inclusive estrangeiras — como a Shopee, que enviou uma carta, e a AliExpress, que teve uma reunião presencial no ministério.

Segundo o ministro, todos demonstraram apoio aos esforços para regular o setor.

“Ninguém teme a concorrência. O problema é a concorrência desleal, que é o que está acontecendo”, disse Haddad, acrescentando que o governo vai estudar como outros países estão coibindo fraudes no comércio online internacional.

Crédito, Reuters

Legenda da foto,

Haddad em foto do dia 3 de abril; ministro disse que foi apoiado por representantes da Shopee e AliExpress

Na semana passada, ao apresentar a proposta de derrubar a isenção em falas públicas, representantes do governo não haviam citado plataformas de comércio online específicas.

O que foi dito é que havia fraudes nesse setor, com empresas usando nomes de pessoas físicas ou dividindo as compras em pacotes menores para ter a isenção e deixar de pagar o imposto de 60% sobre produtos importados.

Com isso, o governo argumentou que derrubar a isenção — o que seria feito via medida provisória (MP), que não chegou a ser apresentada — protegeria a indústria nacional e aumentaria a arrecadação.

A proposta gerou reações negativas nas redes sociais, às quais o governo respondeu afirmando que não iria criar um imposto sobre o comércio internacional online, e sim iria fazer valer uma tributação que já existe e vinha sendo burlada.

Devido à repercussão ruim nas redes sociais, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, minimizou o impacto para o consumidor em um post no Twitter.

“Tô aqui no avião com o Ministro Haddad que me explicou direitinho essa história da taxação. Se trata de combater sonegação das empresas e não taxar as pessoas de compram”, escreveu Janja na rede social no dia 12.

No entanto, caso a medida prosseguisse, o vice-presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Unafisco), Kleber Cabral, disse que seria inevitável o encarecimento de produtos para o consumidor dessas plataformas.

“Lógico que fica mais caro. Os varejistas internacionais obviamente que vão repassar o custo disso e vai ficar na mão do consumidor final”, disse Cabral.

Um dos empresários brasileiros que tem liderado a pressão pela regulação do setor é Luciano Hang, dono das lojas Havan. Apesar da sua proximidade com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a demanda não emplacou no governo anterior.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto,

Segundo relato de Haddad, Lula demonstrou preocupação com consumidores que seriam prejudicados pela medida

As compras internacionais mais do que triplicaram entre 2018 e 2021 no Brasil, de acordo com o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), uma associação de empresas do setor.

Dados da consultoria NielsenIQ Ebit apontam que essas transações passaram de R$ 7,7 bilhões para R$ 36,2 bilhões neste período. A estimativa é de que tenham chegado a R$ 50 bilhões em 2022.

Shein e AliExpress (da China), Shopee (de Singapura) e Amazon (EUA) são as quatro principais empresas desse mercado no Brasil hoje, segundo Alberto Serrentino, consultor especialista em varejo e fundador da Varese Retail.

Essas companhias, porém, refutam as acusações de “contrabando digital”.

A Shopee afirma que mais de 85% das suas vendas são de vendedores brasileiros.

“A Shopee está no Brasil desde 2019, tem dois escritórios na cidade de São Paulo e emprega mais de 3 mil colaboradores diretos. Além disso, a taxação que está sendo discutida vale para compras internacionais de forma geral e não apenas para plataformas asiáticas. Temos origem em Singapura, mas nosso foco é local”, disse a empresa por meio de nota.

A Shopee disse ainda concordar com o governo “em qualquer mudança tributária que apoia o empreendedorismo brasileiro, pois também compartilhamos do mesmo propósito e queremos contribuir com o desenvolvimento do ecossistema local”.

A AliExpress, por sua vez, respondeu à BBC News Brasil que “cumprir as regulamentações dos locais onde operamos é nossa principal prioridade”.

A empresa disse ainda ser “um marketplace global que conecta compradores e vendedores de todo o mundo” e que “tem o compromisso de fornecer aos consumidores brasileiros produtos de qualidade e participar ativamente no desenvolvimento da economia

A Shein afirmou que “está comprometida em gerar valor para a indústria, consumidores e economia do Brasil.”

“Reconhecemos a importância em propor melhorias para as regras no Brasil de modo a fornecer segurança jurídica para os operadores e garantir que milhões de brasileiros possam continuar a ter acesso ao mercado mundial, bem como a artigos produzidos localmente”, disse a empresa.

A Amazon não quis se manifestar.