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Caso Lucas Lyra completa 10 anos: confira entrevista com a família

Essa é uma história sobre ápice. Se você é um “Lyra”, já entendeu. É que nessa família, as palavras têm mais de um significado. Lá, 1% é tudo. A “Aurora da Minha Vida” não é apenas um trecho de um poema de Casimiro de Abreu. “Pãezona” é mais do que um neologismo. Lá, se fala com os olhos, escuta com o coração. Lá, justiça é mais do que um direito: é uma necessidade. Há exatos 10 anos, uma tentativa de assassinato fez o futuro do jovem Lucas, de então 19 anos e agora de quase 30, mudar. O tempo passa igualmente a todos, mas só de forma cronológica. Para ele, o dia 16 de fevereiro de 2013 é vivido até hoje. Uma dor foi plantada, mas ele resistiu. Eles resistiram. Resistem. Resistirão. Como? A resposta também tem a assinatura única deles: “só os loucos sabem”.

Apaixonado pelo Náutico, Lucas estava indo a um jogo do clube, nos Aflitos, quando houve uma confusão envolvendo alguns torcedores do Sport, que estavam em um ônibus que passava em frente ao estádio. No tumulto, José Carlos Feitosa Barreto, segurança da empresa Pedrosa, que fazia a escolta do veículo, atirou na cabeça do alvirrubro. O jovem passou três anos internado, recebendo alta apenas em 2016. No ano seguinte, teve uma piora e precisou passar dois meses na UTI do Real Hospital Português, sendo novamente liberado e seguindo com o tratamento em casa.

“Lucas perdeu a audição. Por uso de corticoides, ele tem osteoporose, o lado esquerdo do corpo um pouco paralisado e quase não enxerga com o olho direito. Sente dores quase 24 horas por dia. Tem um problema sério de engasgo e, muitas vezes, se ele tem crise de riso, a gente precisa pedir para ele parar de sorrir para não engasgar. É difícil ver meu filho em cima de uma cama, passando por tudo isso”, afirmou a mãe de Lucas, Cristina Lyra. O jovem é assistido diariamente por duas enfermeiras, pagas pela Pedrosa, que também arca com 90% do aluguel do imóvel em que a família mora, na Torre, no Recife, além de gastos com medicamentos. Christina, porém, alerta. “Ainda não recebemos a indenização que a empresa deve”.

Condenado está livre

Em setembro de 2018, José Carlos Feitosa Barreto foi condenado a oito anos de prisão por tentativa de homicídio qualificado, em júri popular, no Fórum Rodolfo Aureliano. “Eu passei o tempo todo olhando para ele, mas ele ficou assim (sinal de cabeça baixa). Ele não foi homem”, disse Lucas. A defesa do réu, porém, entrou com um recurso e, desde então, o ex-segurança segue em liberdade.

“É uma série de sentimentos. Indignação, tristeza. Passaram-se dez anos, mas é como se tudo tivesse acontecido ontem. Não tivemos o ciclo fechado. O réu confesso, condenado pela Justiça, permanece solto, gozando de liberdade e vivendo a vida. Meu filho está repleto de sequelas, impedindo de viver os sonhos e projetos dele. Minha alma sangra muito”, lamenta a mãe. “Quantos casos já ocorreram depois do que houve com Lucas? Isso gera revolta. Ele precisa pagar pelo crime que cometeu”, frisou.

“Eu te ápice”

Antes de acordar do coma, Lucas relatou um encontro que mudou sua vida. “Eu faleci duas vezes e tive uma EQM (Experiência de Quase Morte). Subi aos céus. Tive uma visão linda. Na frente, em cima e dos lados, tinha um céu azul de verão. Apareceu um ser de um tamanho inimaginável. Ele me perguntou: ‘o que você está fazendo aqui?’ Aí foi quando eu olhei para baixo e vi as nuvens. Perguntei: ‘aqui é o céu?’ Ele disse que sim. Perguntei se morri, mas ele disse que não. Eu falei: ‘só Deus pode explicar isso’. Aí ele falou  que era Deus e que não tinha chegado a minha hora. Ele disse: ‘volte, continue amando as pessoas que você sempre amou’”.

Diariamente, é isso que Lucas faz e recebe. “Ele diz que eu sou a ‘Pãzeona’, me chama de ‘Aurora da Minha Vida’. Quando ele estava na UTI, Deus falou comigo e disse para eu não escutar os médicos. Se ele tinha 1% de chance na medicina, os outros 99% eram de Deus”, contou Christina.

“Fui filha única até os sete anos, quando Lucas nasceu. Todos os dias antes de dormir, eu me ajoelhava e pedia um irmão. E eu era exigente: pedia a Deus que fosse um menino. Fui presenteada com Lucas e, dois anos depois, com Joel. Apesar de ser mais velha, eu corria para ele quando eu estava em dúvida de algo, angustiada. Corria para abraçar, sentir o cheiro, dizer que amo. Todos os dias a gente dizia ‘te amo’, como falamos até hoje. O meu maior momento de dor foi quando eu disse ‘te amo’ e ele, em coma, não respondeu”, contou Mirella, irmã mais velha de Lucas. “Eu canto, mesmo sabendo que ele não ouve. A gente se abraça, beija. Lucas é nosso combustível. Ele fala ‘eu te amo’ até no olhar”, revelou.

Lucas tem uma tatuagem do Náutico na perna e, recentemente, foi homenageado pelo irmão mais novo, Joel. “Ele fez uma tatuagem em homenagem a Lucas, com a frase ‘só os loucos sabem’, com a caligrafia de Lucas. Temos também uma escrita ‘Lyra de Deus, a família do milagre’. Lucas transmite amor todos os dias. Uma vez, ele perguntou a mainha se existia algum sentimento maior do que o amor. Ela disse que o amor era o ápice dos sentimentos. Desde então, aqui em casa, a gente não fala mais ‘eu te amo’. A gente fala eu te ápice”.

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Fonte: Folha PE

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