- Laura Boubert
- The Conversation*
O que determina quão generosa uma pessoa é? Poderia ser quanto dinheiro você tem? Quão amável você é? Ou talvez se resuma aos seus valores. Todas essas suposições parecem razoáveis, mas um novo estudo da Universidade de Berkeley (EUA) sugere que algo que parece tão trivial quanto quão bem você tem dormido ultimamente também pode afetar sua benevolência em um determinado dia. Descobriu-se que a privação do sono leva a uma redução da generosidade.
Para isso, os pesquisadores testaram quão gentis as pessoas eram quando estavam cansadas de três maneiras diferentes.
No primeiro estudo, eles privaram 21 voluntários de sono por 24 horas e, em seguida, perguntaram a eles o quanto estariam dispostos a ajudar em vários cenários, como ajudar um estranho a carregar suas sacolas de compras.
Eles pediram aos participantes que repetissem o questionário de altruísmo após uma noite normal de sono. Os pesquisadores também estudaram os níveis de atividade cerebral dos 21 participantes usando imagens de fMRI (ressonância magnética funcional).
Em seguida, 171 voluntários recrutados online mantiveram um diário de seu sono antes de fazer o mesmo questionário. Para ambos os experimentos, os pesquisadores descobriram que os participantes cansados pontuaram mais baixo no questionário de altruísmo. Esse foi o caso independentemente dos traços de empatia dos participantes e se a pessoa que eles deveriam ajudar era um estranho ou alguém familiar a eles.
Finalmente, os pesquisadores analisaram mais de 3,8 milhões de doações de caridade feitas nos EUA antes e depois da mudança dos relógios para o horário de verão, o que faz com que todos percam uma hora de sono. As doações diminuíram 10% nos dias após a mudança dos relógios em comparação com as semanas anteriores e posteriores à transição.
A análise de ressonância magnética mostrou que a privação do sono parece estar ligada à atividade reduzida na área do cérebro ligada à cognição social, que regula nossas interações sociais com os outros. A mudança na atividade cerebral não foi relacionada à qualidade do sono, apenas à quantidade. A boa notícia é que esse efeito é de curta duração e desaparece quando retornamos ao nosso padrão normal de sono.
O que diz a pesquisa
Há muito tempo foi estabelecido que o sono é fundamental para muitos aspectos de nossa saúde e bem-estar. Isso foi demonstrado em 1959, quando o DJ americano Peter Tripp ficou acordado para uma transmissão ao vivo da Time Square de Nova York por 201 horas seguidas. O recorde de Peter foi batido em 1964 por Randy Gardner, um adolescente que ficou acordado por 260 horas (quase 11 dias) para um projeto de feira de ciências da escola.
Randy e Peter pareceram bem ao longo de suas experiências. Mas, à medida que o desafio avançava, eles começaram a falar de forma inarticulada, às vezes ficavam confusos e lutavam para concluir tarefas simples, como falar o alfabeto.
Ambos também tiveram alucinações vívidas. Peter viu teias de aranha em seus sapatos e acreditou que uma gaveta da escrivaninha havia pegado fogo.
Agora sabemos que a privação do sono está ligada a problemas de saúde mental, incluindo alucinações e psicose. Peter e Randy pareciam se recuperar de suas provações, mas pesquisas mostram que a privação grave do sono a longo prazo pode levar a problemas neurológicos duradouros.
Desde as experiências de Peter e Randy, pesquisas apontaram que a privação do sono afeta a maioria dos aspectos do nosso comportamento, principalmente nossas habilidades básicas de pensamento, como memória e tomada de decisão. Em 1988, a Associação das Sociedades de Sono Profissionais publicou um relatório na revista científica Sleep, alertando que um sono ruim leva a um risco aumentado de acidente, como uma colisão na estrada ou um acidente de tarefas feitas em casa.
Um estudo de 2015 comparou o número de acidentes de trânsito fatais nos EUA logo após os relógios mudarem para o horário de verão, quando se perde uma hora de sono. Conclusão: houve um aumento significativo no número de acidentes no dia seguinte.
Tudo faz sentido
Os psicólogos acreditam que bondade e generosidade fazem parte de nossa cognição social, um conjunto complexo de processos que controlam como interagimos com os outros e como tomamos decisões sobre nosso comportamento em relação a eles.
Essas decisões são baseadas em muitos fatores. Cada um desses fatores é afetado pela qualidade do sono; nossa memória, todos os aspectos da memória de situações anteriores, a qualidade de nossas decisões, quão impulsivos somos e principalmente nossas emoções e quão bem podemos regulá-las. É de se esperar que a quantidade de dinheiro que estamos dispostos a doar também seja sensível ao sono.
Então, da próxima vez que um amigo pedir para você fazer uma benfeitoria, certifique-se de que você tenha uma boa noite de sono antes.
*Laura Boubert é professora de Psicologia na Universidade de Westminster (Reino Unido)
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).
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