O Ministério da Saúde, em nota técnica assinada no final do ano passado pela antiga gestão, alterou as recomendações de uso das vacinas contra a Covid-19 desenvolvidas com a tecnologia de vetor viral, a da Oxford/AstraZeneca e a da Janssen. As mudanças, que repercutiram apenas nesta semana nas redes sociais, envolveram uma análise de risco e benefício na população abaixo de 40 anos – público para o qual as doses deixaram, inicialmente, de ser orientadas.
“As vacinas de vetor viral estão indicadas para uso na população a partir de 40 anos de idade e; [somente] em pessoas de 18 a 39 anos de idade, devem ser administradas preferencialmente vacinas Covid-19 da plataforma de RNAm [como a da Pfizer/BioNTech], entretanto, nos locais de difícil acesso ou na indisponibilidade do imunizante dessa plataforma, poderão ser utilizadas as vacinas de vetor viral (Astrazeneca e Janssen)”, diz o documento.
A mudança definida em dezembro foi motivada por uma análise que apontou 98 casos com suspeita de trombose após as doses da vacina da Covid-19 notificados no e-SUS Notifica até o dia 17 de setembro do ano passado, a maioria relacionada à AstraZeneca. Especialistas ouvidos pelo Globo esclarecem, porém, que a incidência dos eventos adversos, de 0,02 casos por 100 mil aplicações, é raríssima. Eles enfatizam ainda a importância do imunizante, da sua segurança e de seus benefícios.
“Observou-se que abaixo de 40 anos há um risco muito baixo de ter a trombose, são eventos raríssimos. No cenário de pandemia em que é preciso vacinar todo mundo, o benefício da proteção supera muito esse risco. Mas agora em que a pandemia melhorou e a doença está em baixa, e nós temos outra vacina que não causa evento adverso e é considerada mais eficaz, como a da Pfizer, vamos dar preferência a ela. Isso acontece o tempo todo, não é novo. Sempre que temos vacinas com melhor relação risco benefício nós substituímos” explica a epidemiologista Carla Domingues, ex-coordenadora do PNI de 2011 a 2019.
Ela destaca ainda que os imunizantes podem ser orientados novamente para aqueles abaixo de 40 anos caso o cenário epidemiológico da Covid-19 piore no Brasil, e reforça que os poucos efeitos adversos observados foram no período de 30 dias após a aplicação.
“Quem tomou a vacina pode ficar tranquilo, eu mesma tomei. Esses casos raros de trombose aconteceram até 30 dias após a vacinação. Quem já tomou não vai ter um efeito amanhã, ou daqui a 5, 30 anos. É importante passar essa segurança para a população. Até porque ela ainda pode ser usada para os acima de 40 anos. Ela foi limitada para uma população específica, pelo fato de termos outra vacina melhor no mercado” acrescenta a especialista.
O epidemiologista Pedro Hallal reforça ainda que as doses da AstraZeneca e da Janssen são consideradas seguras e eficazes e, portanto, não tiveram seu aval revogado pela Anvisa para uso no Brasil.
“A vacina não foi proibida, desaconselhada ou teve sua efetividade revogada pela Anvisa. Os efeitos adversos, que são raríssimos, são totalmente comuns com qualquer produto medicamentoso. Se tomarmos um paracetamol, basta ver a bula que será observado que existem efeitos adversos, também raríssimo” diz.
Ele lembra ainda que, com a atualização de outras vacinas para variantes mais recentes do coronavírus, como as doses bivalentes da Pfizer que ampliam a proteção contra a variante Ômicron, é normal dar preferência aos imunizantes mais novos.
“Num momento de escassez vacinal, a vacina da AstraZeneca, assim como as outras, foi extremamente importante e segura para prevenir as infecções, os casos graves e desacelerar a pandemia. Agora, com a atualização de tecnologias para as cepas que estão circulando, e num cenário que não há mais escassez, não há sentido em seguir usando essas vacinas, que foram extremamente úteis no começo da pandemia, mas não tem a mesma atualização” explica.
Ele cita de exemplo as doses para gripe, que todos os anos são atualizadas e a anterior deixa de ser recomendada. — Todo ano atualizamos a vacina da gripe, porque ela vai sendo adaptada. Não é que a vacina do ano passado era ruim, mas que agora temos uma melhor para o momento epidemiológico atual.
“O problema está na forma de se comunicar isso para a população, porque se não for feito da maneira correta as pessoas vão achar que a vacina tinha algum problema, o que não tem. Isso precisa ser passado de uma maneira tranquila, sem criar medos ou pânico baseados em informações falsas” complementa.
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Fonte: Folha PE
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