- Author, Luís Barrucho
- Role, Da BBC News Brasil em Londres
- Twitter, @luisbarrucho
Igor Murilo, Maria Eduarda Carvalho e Camilla Lopes são alguns dos afetados pelo temporal que atingiu o litoral norte de São Paulo no último fim de semana.
Cada um à sua maneira, eles tentam agora superar a tragédia que vivenciaram e agir em prol do bem coletivo, seja participando de mutirões de limpeza, buscando desaparecidos ou arrecadando doações.
Em comum, todos estavam em São Sebastião, a cidade mais atingida pelas chuvas históricas.
Eles conversaram com a BBC News Brasil por telefone e explicaram como foram de vítimas a voluntários nessa tragédia.
Igor Murilo, de 22 anos, professor de CrossFit e morador de Camburi, conta que perdeu tudo, “com exceção da TV e da geladeira”.
Ele diz que estava em casa com o filho e a mulher “tirando um cochilo” após a família ter curtido o Carnaval na tarde de sábado (18/2) quando recebeu um telefonema de sua mãe: era um alerta sobre os alagamentos causados pelas chuvas.
“Minha mãe, que mora no bairro vizinho, me ligou por volta de 1h e nos perguntou sobre como estava a situação no entorno da nossa casa. Ela mora em uma casa mais alta do que a minha e disse que por lá já estava tudo alagado”, diz, lembrando que sua casa nunca havia alagado antes.
“Fiquei preocupado e quando me dei conta faltavam quatro dedos para a água entrar na nossa casa. Falei para a minha esposa que era preciso levantar os objetos, mas só conseguimos salvar a TV e a geladeira. Quando saí para o quintal, a água já batia na altura do meu peito”.
“Conseguimos chegar ao carro que estava numa parte mais alta e tivemos que dormir dentro dele. A situação ainda está muito ruim aqui, com pessoas ainda soterradas”, acrescenta.
Desde o domingo (19/2), Murilo tem coordenado ações de mobilização em Camburi.
“Tem muita gente precisando (de ajuda). Estamos recebendo dinheiro das vaquinhas que fizemos. Conseguimos unir mais de 20 motoboys para fazer entrega de marmitex. Cada localidade tem uma pessoa que está liderando. Só ontem (segunda-feira) consegui lavar minha casa”, assinala.
Ele diz que os esforços vêm se concentrando na Vila Sahy, uma das áreas mais afetadas, onde alagamentos e deslizamentos de terra deixaram mortos, feridos, desaparecidos e desabrigados.
Abrigo em escola
A casa de Maria Eduarda Carvalho, de 18 anos, fica nessa localidade. Ali ela morava com os sogros e o noivo.
“Quando a chuva começou, eu e meu namorado estávamos em casa e havíamos pedido uma pizza. Mas o motoboy disse que não conseguia entregá-la e achamos estranho. Meu namorado desceu para a praça principal para buscá-la e viu que já estava alagado, donos de supermercados metendo a mão em bueiros para tentar fazer escoar a água, sem sucesso.”
“Como alagamentos são comuns por aqui, não nos preocupamos muito. Comemos a pizza e dormimos por 20 minutos. Acordamos quando a água começou a entrar no nosso quarto”, relembra.
“A nossa casa era a única da rua que não enchia. Começamos a nos desesperar e tentamos criar barreiras para a água não passar”.
“Quando saímos de casa para buscar nosso material de trabalho na praia, a água já estava na altura da nossa cintura”, acrescenta Carvalho, que trabalhava com uma barraca de praia.
Ela e o namorado se abrigaram na casa de um cliente que fica num condomínio luxuoso na Barra do Sahy — ali não houve danos extensivos, embora, segundo Maria Eduarda, alguns imóveis de alto padrão localizados na encosta tenham sido completamente destruídos.
Os sogros dela estão alojados em uma escola convertida em abrigo e, em breve, vão se juntar ao casal no mesmo imóvel.
“Ajudei na limpeza da escola e estamos agora nos mobilizando para recolher doações. Felizmente, não há ninguém passando fome ou sede. As doações estão chegando de barco e de helicóptero.”
Em um condomínio da mesma localidade, estavam Camilla Lopes e suas amigas.
Naturais da capital paulista, as jovens estudam no interior juntas e haviam viajado ao litoral norte para passar o Carnaval em uma casa de praia da família de uma delas. Desde domingo, vêm atuando como voluntárias.
“No sábado à noite, fomos a uma casa de shows em Camburi e, no caminho de volta, já chovia bastante. Percebemos que não conseguiríamos passar de carro devido ao volume de água, que já estava na altura da cintura. Decidimos nos arriscar e atravessar a pé. Felizmente, nada aconteceu com a casa onde estávamos.”
“No dia seguinte, ao acordarmos, percebemos uma movimentação estranha no condomínio, e foi só então que conseguimos a entender a dimensão da tragédia.”
“Quando soubemos que havia muitos feridos, mortos e desaparecidos, decidimos nos mobilizar para ajudar. Fizemos de tudo, de limpeza até a organização da cozinha. Separamos roupas e itens de higiene pessoal.”
“Agora estamos nos focando nas doações; entre nossos amigos, conseguimos arrecadar um grande valor de doação e agora estamos organizando como fazer a distribuição desse recurso.”
Camilla também diz que vem ajudando a localizar desaparecidos — como há áreas sem acesso à internet, multiplicam-se pedidos de familiares para encontrar parentes com os quais não conseguiram contato até agora.
“Passamos por todos os abrigos e tentamos entender a necessidade de cada um deles. Também usamos as redes sociais para encontrar essas pessoas”.
Sem poder voltar ao interior onde estudam, devido ao bloqueio da maior parte das rodovias que dão acesso ao litoral norte de São Paulo, Camilla e as amigas concordaram que vão permanecer na região até o fim da semana ajudando nos esforços de mobilização.
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