- The Conversation*
- Fernando Lino Vázquez González
Ultimamente, há uma doença que está ganhando terreno e não parece disposta a nos dar trégua: a depressão. A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que pelo menos 322 milhões de pessoas no mundo sofram com o problema, 18% a mais do que há uma década.
Também conhecido como transtorno depressivo maior, o quadro é caracterizado por mau humor, diminuição do interesse, função cognitiva prejudicada e problemas de sono ou apetite. Também é recorrente e tende a se tornar crônico, gerando sofrimento e incapacidade.
Infelizmente, não sabemos as causas exatas da doença. No entanto, há estudos suficientes sobre fatores de risco, ou seja, as características e circunstâncias que aumentam a probabilidade de sermos afetados.
Alguns, como o esperado, estão relacionados a eventos dramáticos da vida, como a morte de um ente querido ou o diagnóstico de uma doença grave.
No entanto, existem muitos outros fatores de risco para a depressão que não são tão conhecidos, embora ainda sejam importantes. São fatores sociodemográficos, genéticos e neurológicos, pessoais, experiências adversas e diferentes comorbidades.
Fatores sociodemográficos: duas vezes mais mulheres deprimidas
Talvez o fator de risco para depressão mais consistente e conhecido dentro dos fatores sociodemográficos seja o gênero.
Universalmente, independentemente do país ou cultura, as mulheres são duas vezes mais propensas a sofrer de depressão do que os homens após a puberdade.
No entanto, outros fatores de risco para depressão também foram encontrados, como idade, estado civil, escolaridade ou raça. Especificamente, esse distúrbio ocorre com mais frequência em adultos jovens; em solteiros, separados ou divorciados; e naqueles de menor escolaridade e de raça branca.
Constatou-se também que a depressão é mais comum em pessoas de baixa renda, desempregados e moradores de áreas urbanas.
Fatores genéticos: a tendência à depressão é herdada
Parentes de primeiro grau de pacientes com depressão apresentam um risco aproximadamente três vezes maior de desenvolver esse transtorno.
Estudos sugerem que entre 26% e 42% das variações na depressão se devem a influências genéticas. Há também indicações de que essa hereditariedade é mais evidente em depressões de início precoce e que são recorrentes.
Ainda assim, nenhum gene específico ou conjunto de genes foi associado de forma confiável à depressão.
Fatores neurológicos: a amígdala torna-se hiperativa
Em paralelo, foram documentadas anormalidades neuronais em adultos em certas regiões do cérebro. Mais especificamente, anormalidades estruturais foram encontradas no hipocampo, amígdala, córtex cingulado anterior e córtex pré-frontal dorsolateral.
Estar deprimido também altera a função neuronal. Há uma ativação cerebral aumentada em regiões de processamento de emoções subcorticais, como a amígdala e os circuitos límbicos, combinada com ativação atenuada em regiões de controle cognitivo.
Isso não acontece apenas em adultos. As mesmas anormalidades na função e estrutura neuronal foram identificadas em filhos de pais com depressão, mesmo antes do início do episódio depressivo. E isso nos faz suspeitar que a hereditariedade nos torna mais vulnerável a essa doença.
Fatores pessoais: introversão e autocrítica excessiva
Há evidências de que a tendência a vivenciar emoções negativas (medo, raiva, tristeza, ansiedade), assim como alterações de humor e pensamentos negativos, implicam em maior risco de desenvolver um quadro depressivo. Isso é conhecido como neuroticismo.
Por outro lado, há mais casos de depressão entre pessoas com pontuação alta em introversão, ou seja, naquelas pessoas que tendem a preferir atividades solitárias, mais focadas em seus pensamentos, sentimentos e humores do que na busca de estímulos externos.
A ciência também sugere uma relação entre transtorno depressivo e uma baixa pontuação de consciência, que é característica de indivíduos sem objetivo, informais, preguiçosos, descuidados e indisciplinados.
Também contribuem negativamente o excesso de autocrítica (inclinação a sentimentos de culpa e fracasso derivados de expectativas irreais de si mesmo) e dependência/sociotropia (sentimentos de desamparo e medo de abandono como resultado de uma alta dependência emocional dos outros).
Outra atitude que promove a depressão é o que se conhece como Estilo atributivo negativo (pessimismo). É a tendência de explicar os resultados negativos de suas experiências por causas internas, estáveis e globais. Por exemplo, “não consegui o emprego porque sou inútil, sempre fui, em todas as áreas da minha vida”, e pensamentos semelhantes.
Algo parecido ocorre com a ruminação, definida como pensamento repetitivo que focaliza a atenção nos sintomas depressivos e suas implicações, causas e significados para a pessoa que os vivencia.
Finalmente, o déficit de recursos pessoais (habilidades sociais, estratégias apropriadas de resolução de problemas ou habilidades de enfrentamento em circunstâncias estressantes) também está relacionado a um maior risco de sintomas depressivos.
Mais de 40 anos de pesquisa documentaram o papel de eventos graves da vida no início da depressão. Dependendo do tipo de amostra em estudo, aproximadamente 50% a 80% das pessoas com depressão relataram um evento de vida agudo e grave antes do início do transtorno.
Com base em uma estimativa conservadora, pudemos estabelecer que as pessoas com depressão têm 2,5 vezes mais chances de ter experimentado um evento grave na vida antes do início dos sintomas em comparação com aquelas que não tiveram a mesma experiência. Esses são tipicamente problemas de saúde com risco de vida, separação e luto, exposição à violência, perda de emprego e insegurança financeira.
Igualmente importante é considerar eventos ou fenômenos cataclísmicos. Ou seja, eventos repentinos, únicos e poderosos que afetam um grande número de pessoas, que muitas vezes estão além do controle de indivíduos ou grupos e são considerados universalmente estressantes. Um bom exemplo é a pandemia da covid-19.
A exposição a eventos negativos na infância também nos coloca em risco de depressão à medida que crescemos. Esses eventos incluem abuso físico e sexual, negligência psicológica (ou abandono), exposição à violência doméstica, doença mental dos pais e criminalidade.
Pessoas com histórico de trauma na infância (especialmente sendo intimidadas e abusadas ou emocionalmente negligenciadas durante a infância) têm mais que o dobro do risco de desenvolver depressão.
Comorbidades
Provavelmente, um dos aspectos mais surpreendentes da depressão é que ela é frequentemente acompanhada por outros transtornos mentais. Em particular, transtornos de ansiedade, transtornos relacionados a substâncias, transtornos alimentares e problemas de sono.
Por outro lado, doenças médicas crônicas ou graves são um fator de risco para a depressão. Além disso, foi encontrada uma inter-relação entre a depressão e um grande número de doenças físicas: infarto agudo do miocárdio, asma, câncer, arritmia cardíaca, doença arterial coronariana crônica, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), insuficiência cardíaca congestiva (ICC), algumas doenças neurológicas, como Mal de Alzheimer. Também está na lista a epilepsia, problemas de tiroide, diabetes, obesidade, algumas patologias do aparelho digestivo, hipertensão, osteoartrite, osteoporose, insuficiência renal, artrite reumatóide, acidente vascular cerebral (AVC)… Sem esquecer a fibromialgia e a fadiga crônica.
Levar todos esses fatores em consideração pode ajudar a prevenir, mas também a entender melhor a depressão. E talvez nos permita diminuir o ritmo com o qual a doença avança.
*Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em espanhol).
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