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Marinho fez com que Bolsonaro interrompesse o silêncio: dos EUA, ex-presidente tem ligado para pedir votos para seu ex-ministro

Nos últimos dias, políticos e eleitores apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) adotaram um novo objetivo: levar o ex-ministro e senador eleito Rogério Marinho (PL-RN) à Presidência do Senado.

A campanha foi abraçada também por opositores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que não são bolsonaristas, mas querem derrotar o atual chefe da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Mesmo não sendo de esquerda, o senador mineiro recebeu o apoio do Palácio do Planalto – por isso, a eleição de Marinho passou a ser vista pela oposição como o caminho mais fácil para dificultar a vida de Lula no Congresso.

“Rogério Marinho tem reais chances de ser eleito presidente do Senado”, disse no Twitter o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, ao compartilhar uma postagem do deputado eleito Gustavo Gayer (PL-GO).

De acordo com as contas do bolsonarista de Goiás, as candidaturas de Rogério Marinho e Eduardo Girão (Pode-CE) somam 32 votos, ante 34 de Pacheco – outros 15 senadores estariam indefinidos. “Eleger Rogério Marinho para a presidência do Senado Federal é um passo decisivo!”, tuitou o senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS).

“E o time não para! A campanha para Rogério Marinho presidir o Senado está linda demais!”, postou a senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF) na mesma rede.

Militantes bolsonaristas vão além e enxergam na vitória de Marinho um caminho para pôr em andamento um processo de impeachment contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes – embora o próprio Marinho esteja tentando se afastar do bolsonarismo radical em declarações públicas.

Mesmo isolado nos Estados Unidos desde o fim do ano passado, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tem atuado a favor de Marinho.

A pedido do presidente do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto, Bolsonaro passou a ligar para senadores pedindo votos para seu ex-ministro.

Na noite da segunda-feira (30/01), Bolsonaro ligou para o candidato para desejar-lhe boa sorte, durante um jantar promovido pelo PL.

Em outra frente, o partido chefiado por Valdemar Costa Neto atraiu outras duas legendas de direita para a formação de um bloco no Senado: PP e Republicanos.

Trata-se de um agrupamento de legendas que tem por objetivo ocupar espaços na estrutura da casa, como presidências de comissões permanentes na Casa e cargos na Mesa Diretora.

Crédito, Edilson Rodrigues/Agência Senado

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Segundo especialista, projeções indicam que Pacheco deve ganhar, mas não com o mesmo placar que teve contra Simone Tebet (esq.) em 2021

Retrato da oposição

“Os números que a gente tem visto dos dois lados apontam para uma vitória do Rodrigo Pacheco. Porém, é importante lembrar: ele teve, na última eleição (para o comando do Senado) 57 votos, quando ele venceu a Simone Tebet (MDB-MS). É muito improvável que ele repita esse número. Muito mais provável que fique na casa dos 40 e tantos. Mostra a dificuldade que ele vai ter. Não é mais a unanimidade que foi há dois anos”, diz o pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Thomas Traumann.

Ele faz a ressalva de que este tipo de prognóstico é ainda mais difícil de ser feito em eleições legislativas de começo de mandato, quando há muitos congressistas novos.

Traumann diz ainda que a disputa será importante para definir o tamanho do bolsonarismo e da oposição no Senado.

“Quantos são os bolsonaristas (ou oposicionistas) no Senado? São 35? São 30? É por isso que é importante: para dizer o tamanho e para dar ao bolsonarismo uma espinha dorsal de atuação parlamentar que eles não tinham, nem mesmo durante o governo (de Jair Bolsonaro). Se eles fizerem 33, 35 votos, isso significa que eles não conseguirão impedir o governo Lula de aprovar projetos. Mas conseguirão barrar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional), por exemplo”, diz o analista.

“A eleição do Senado, em especial, tem mobilizado uma espécie de ‘luta pela sobrevivência’ do bolsonarismo, e de lideranças desse campo político”, diz o cientista político Cláudio André de Souza, que é professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, a Unilab. Trata-se de uma universidade federal com campi na Bahia e no Ceará.

“Com uma bancada significativa dentro do Senado, esses líderes enxergam uma possibilidade de barganhar por espaços de poder. Mesmo que Marinho seja derrotado, a candidatura pode servir para projetá-lo como líder dentro desse campo conservador”, acrescenta.

Crédito, Edilson Rodrigues / Agência Senado

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Davi Alcolumbre venceu eleição para o comando da Casa em ‘reviravolta’ em 2019

Em fevereiro de 2019, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) foi eleito presidente do Senado numa reviravolta.

Mesmo estando em seu primeiro mandato na Casa, deixou para trás nomes conhecidos, como Esperidião Amin (PP-SC), o ex-presidente da República Fernando Collor (Pros-AL) e o ex-presidente do Senado Renan Calheiros (MDB-AL).

Além do apoio do governo recém-eleito de Jair Bolsonaro, outro fator ajudou na eleição do amapaense: a pressão direcionada da militância bolsonarista sobre os senadores indecisos nas redes sociais.

A cobrança foi tanta que levou o principal adversário de Alcolumbre, Renan Calheiros, a retirar a candidatura.

Mesmo com o voto secreto, vários senadores passaram a mostrar as cédulas de votação ou a declarar o voto da tribuna para atender aos internautas.

A mesma tática está sendo tentada novamente agora pela oposição ao governo Lula. O deputado eleito bolsonarista Gustavo Gayer chegou a montar um “placar” de votos e uma lista de “indecisos” a serem pressionados: nomes como Soraya Thronicke (União Brasil-MS) e Romário (PL-RJ).

No Movimento Brasil Livre (MBL), a tática é coordenar a pressão sobre os senadores por meio das “lives” dos coordenadores do grupo – na última sexta-feira, por exemplo, as cobranças recaíram sobre o capixaba Marcos do Val, do Podemos.

O coordenador nacional do MBL, Renan Santos, pediu aos pouco mais de 3 mil seguidores que assistiam à transmissão que comentassem (“com educação”) nas redes sociais do senador. A pressão deu resultado: em sua própria “live” naquele dia, Marcos do Val se comprometeu a votar em Marinho.

“Virar uns cinco ou seis (votos de senadores) é possível. A impressão que os caras (aliados de Pacheco) querem passar é a de que ele ‘já ganhou’. E não é verdade”, diz Renan Santos.

O MBL deixou de apoiar Bolsonaro ainda em março de 2019 e passou os últimos anos fazendo críticas ao governo do capitão da reserva, mas entende que apoiar Rogério Marinho é importante para derrotar o PT.

A reportagem da BBC News Brasil procurou políticos bolsonaristas como Gustavo Gayer, o ex-vice-presidente e senador eleito Hamilton Mourão (Republicanos-RS), e o senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS), mas eles não retornaram os contatos.

Crédito, Geraldo Magela/Agência Senado

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A tática de pressão nas redes está influenciando votos a favor de Marinho: na última sexta, Marcos do Val (Podemos-ES) se comprometeu a votar no potiguar

Rogério Marinho tem 59 anos e foi ministro do Desenvolvimento Regional de fevereiro de 2020 até março do ano passado, quando deixou o posto para se candidatar ao Senado.

O potiguar começou a carreira política na esquerda, no Partido Socialista Brasileiro (PSB), sigla com a qual conquistou dois mandatos de vereador na capital do Estado, Natal, antes de eleger-se para a Câmara dos Deputados em 2006.

Como ministro de Bolsonaro, notabilizou-se como um dos principais negociadores das emendas de relator, mecanismo que deu origem ao chamado Orçamento Secreto.

Em debate na Câmara dos Deputados, em junho do ano passado, Marinho negou qualquer irregularidade nos procedimentos das emendas e rebateu a ideia de que houvesse algo “secreto”.

“Emendas RP9 são de responsabilidade de alocação do Parlamento brasileiro. Colocadas pelo relator, mas votadas pela Comissão Mista de Orçamento e pelo Plenário do Congresso Nacional, de forma transparente, à luz do dia, com todos os senhores aqui presentes participando”, conforme relatou a Agência Câmara.

Como funciona a eleição para presidente do Senado?

Ao contrário do que acontece no Poder Executivo, por exemplo, os presidentes do Senado e da Câmara não são “chefes” dos demais parlamentares: a função deles é a de organizar os trabalhos do Plenário, além de decidir quais projetos serão votados.

O presidente do Senado também é considerado o presidente do Poder Legislativo, e é o segundo na linha de sucessão do presidente da República, logo após o presidente da Câmara dos Deputados.

“A eleição do presidente do Senado pode acontecer já no primeiro ou no segundo turno, desde que alguém alcance os 41 votos, ou seja, maioria absoluta”, explica o cientista político Cláudio André de Souza.

“Para os partidos políticos interessa apoiar o candidato vencedor, porque ele é fundamental na divisão dos espaços de poder dentro de cada Casa: as comissões, os cargos na mesa diretora. Tudo isso é levado em conta na negociação dos apoios. Inclusive porque esses espaços de poder trazem consigo cargos que podem ser indicados pelos parlamentares”, acrescenta.