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Idade, sexo, mas também personalidade e fatores psicológicos podem influenciar como experimentamos ressaca

Se você acordou de ressaca neste 1º de janeiro de 2023, você não está sozinho.

Mas, surpreendentemente, nem todo mundo sofre os mesmos efeitos após uma noite de intensa bebedeira.

Estudos científicos medem a ressaca em uma escala de 11 pontos (zero, sem efeito e 10, ressaca extrema).

Em minha própria pesquisa, os participantes relataram ter ressaca nesta escala entre um (muito leve) e oito (grave), enquanto outro levantamento estimou que cerca de 5% das pessoas podem ser resistentes à ressaca.

Mas o que explica essa diferença?

Não se trata apenas do quanto bebemos.

Pesquisadores estão começando a analisar os muitos mecanismos biológicos e psicológicos que podem influenciar nossa experiência de ressaca.

Mecanismos biológicos

Algumas pesquisas sugerem que pessoas com uma variação do gene ALDH2 costumam ter ressacas mais graves.

Quando consumimos álcool, a enzima álcool desidrogenase (ADH) o transforma em acetaldeído, uma proteína importante para o aparecimento dos sintomas da ressaca. No entanto, a variante do gene ALDH2 limita a quebra do acetaldeído, levando ao aumento do acúmulo da proteína e, portanto, ao aumento dos sintomas de ressaca.

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Algumas pesquisas sugerem que pessoas com variação do gene ALDH2 costumam ter ressacas mais graves

A idade e o sexo também podem influenciar a experiência da ressaca. Uma pesquisa online recente com 761 consumidores holandeses de álcool descobriu que a gravidade da ressaca diminui com a idade, mesmo quando ajustada para a quantidade de álcool consumida.

Curiosamente, os autores também relataram diferenças na gravidade da ressaca entre homens e mulheres.

Essas diferenças entre os gêneros foram maiores em bebedores mais jovens, com homens jovens (de 18 a 25 anos) tendendo a relatar ressacas mais graves em comparação com bebedores mais jovens. No entanto, atualmente não se sabe por que essas diferenças existem.

Fatores psicológicos

Certos traços psicológicos podem estar relacionados a como experimentamos a ressaca, incluindo ansiedade, depressão, níveis de estresse e até personalidade.

No passado, a ciência sugeria que a neurose, um amplo traço de personalidade que muitas vezes leva as pessoas a ver o mundo de maneira negativa, poderia prever a gravidade de uma ressaca. No entanto, essa ideia foi recentemente contestada por outro estudo que não encontrou nenhuma relação entre ressacas e personalidade.

Isso é um tanto surpreendente, uma vez que a extroversão está associada a comportamentos de consumo excessivo de álcool entre estudantes universitários, embora não pareça estar relacionada a ressacas piores. E isso apesar da evidência de que beber muito e frequentemente está ligado a ressacas mais graves.

Ansiedade, depressão e estresse também estão ligados a ressacas mais graves. Cada um desses humores está associado a um “viés negativo”, uma tendência a interpretar o mundo de forma mais negativa.

Nossas descobertas mostram que as ressacas também tendem a fazer com que as pessoas interpretem o mundo dessa maneira. Como resultado, as ressacas podem exacerbar esse viés negativo, fazendo com que algumas se sintam pior do que outras.

É possível que a forma como lidamos com situações adversas esteja no cerne dos motivos pelos quais temos experiências de ressaca tão distintas.

A “catastrofização” da dor ocorre quando uma pessoa enfatiza a experiência negativa da dor. Pesquisas mostram que pessoas com altos níveis de “catastrofização” da dor relatam ressacas mais graves.

Isso indica que elas estão se concentrando em seus sintomas negativos e possivelmente os amplificando.

Outros estudos também mostraram que pessoas que tendem a lidar com seus problemas ignorando-os ou negando-os tendem a ter ressacas piores.

A regulação emocional é outro mecanismo psicológico importante que nos ajuda a lidar com situações difíceis, gerenciando as experiências emocionais e respondendo a elas com eficácia.

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Estudo indica que estratégia comumente usada por estudantes para lidar com miséria de uma ressaca — “sofrer” juntos e compartilhar essa experiência — pode ser útil para aliviar pelo menos alguns dos efeitos emocionais negativos

Curiosamente, embora as pessoas com ressaca relatem achar mais difícil regular suas emoções, esse pode não ser o caso, pois pesquisas mostram que os participantes conseguem controlar sua resposta emocional tanto quanto aqueles que não estavam de ressaca.

Isso pode significar que as pessoas escolhem estratégias regulatórias mais fáceis (mas menos eficazes) durante uma ressaca, como evitar sentimentos de culpa ou vergonha. Mas isso ainda está para ser determinado.

O que podemos fazer?

Embora os pesquisadores já tenham identificado alguns compostos naturais que aliviam os sintomas gerais da ressaca, mais pesquisas ainda precisam ser feitas para determinar se eles devem ser recomendados para o seu tratamento. Enquanto isso, cabe a você decidir a melhor estratégia para aliviar a ressaca.

No entanto, um estudo indica que uma estratégia comumente usada por estudantes para lidar com a miséria de uma ressaca — “sofrer” juntos e compartilhar essa experiência — pode ser útil para aliviar pelo menos alguns dos efeitos emocionais negativos.

Cuidar do seu bem-estar pessoal e encontrar melhores estratégias para reduzir os níveis de estresse, além de adotar melhores mecanismos de enfrentamento, também pode ajudar a lidar com as consequências negativas de uma ressaca.

Mas, claro, se você realmente deseja evitar uma ressaca, pode escolher alternativas não alcoólicas.

Pense nisso da próxima vez que quiser “encher a cara”.

*Craig Gunn é professor de psicologia na Universidade de Bristol.

Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Clique aqui para ler a versão original (em inglês).