27/07/2022 – Durante dois dias, 25 e 26 de julho, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) proporcionou um debate substancioso sobre o centro do Recife, um território que passa por problemas estruturais e sociais. No Fórum Centro do Recife: Desafios e Soluções, organizado pelo Núcleo de Proteção ao Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (NPHAC) e pela Escola Superior do MPPE, especialistas de diversas áreas trouxeram ideias e experiências para que se tornem medidas efetivas, no sentido de reverter o estado de degradação em que se encontram os bairros que compõem o coração da capital pernambucana, atualmente com prédios degradados, comércios fechados, grande acúmulo de pessoas em situação vulnerável, etc.
O resultado foi considerado extremamente proveitoso pelos participantes, diante de um público que quase lotou o auditório do Centro Cultural Rossini Alves Couto, na Boa Vista. A conclusão foi de que existem saídas e de que é possível reconstruir esse centro do Recife, que a maioria considera não apenas local de compras e trabalho, mas de lembranças afetivas, lugar histórico, com edifícios, obras de arte e espaços que carregam momentos expressivos do passado, presente e futuro, não só de Pernambuco, mas do Brasil. Assim, podem se somar soluções de curto, longo e médio prazo, para que a população sinta que o trabalho é feito e não estaciona.
Na abertura, o procurador-geral de Justiça do MPPE, enalteceu a iniciativa e a descreveu como de grande importância para o Ministério Público. “Precisamos sair daqui com propostas robustas para que o poder público possa colocá-las em prática. Algo que se concretize e tenha efetividade”, afirmou ele.
O coordenador do NPHAC, o promotor de Justiça José da Costa Soares, analisou das discussões como avaliações críticas e construtivas, que, somadas, montaram reflexões nos presentes e vão se coadunar em uma Carta de Conclusões, que será redigida em conjunto e divulgada em breve como síntese dos dois dias de debates. “Trata-se de um cenário de desafios e de soluções que não são fáceis, nem imediatas. O MPPE reconhece as necessidades sociais e o atual momento do centro do Recife. Assim, traremos respostas pensadas e sólidas que foram expostas em nosso fórum para que o trabalho de recuperação seja fortalecido”, revelou ele.
O diretor de ESMP, o procurador de Justiça Sílvio Tavares, frisou que “chegar a consensos sobre as possíveis saídas é o que dá a perspectiva de que dá para restaurar o centro do Recife, com novas visões baseadas em estudos e experiências que deram certo”.
Discussões – O primeiro dia do fórum contou com a conferência do comunicador social e gestor responsável pela retomada urbanística, social e econômica do Centro Urbano de Medelín/Colômbia, Jorge Melguizo. Ele trouxe exemplos do que foi êxito em seu trabalho sob uma nova ótica de tratar problemas urbanos. Logo iniciou contando que para entender a cidade precisou não só trabalhar de dia, mas também à noite. Que caminhava, junto a assessores, pelas ruas de Medellín pela madrugada observando e entendendo a dinâmica das pessoas, desde as que se divertiam, trabalhavam, as em situação de rua, as que se prostituíam, que se drogavam, que vendiam drogas, etc.
“Foi preciso criar articulação e integração entre todas as secretarias municipais. Traçar projetos estruturantes que conectassem os diferentes problemas e suas soluções”, explicou ele. Segundo Melguizo, cuidar do lado social é primordial para recuperar um centro. “A recuperação de um centro histórico é para os habitantes da cidade e não para os turistas. Tem de haver a participação cidadã, o fortalecimento da sociedade civil, oferecendo espaços de convívio, cultura e cidadania”, atestou.
A coordenadora do Gabinete do Centro do Recife (Recife), órgão da Prefeitura, Ana Paula Vilaça, apresentou os planos para revitalização do centro e também mencionou que é preciso respeito às pessoas e ao ambiente natural e cultural. Segundo ela, a combinação entre poder público e iniciativa privada tem norteado a gestão para a transformação socioterritorial. “Planejamos melhorias urbanas com novos investimentos, dinamização econômica e cultural, recuperação do patrimônio histórico, sem perder o foco no acolhimento das populações vulneráveis, da diversidade e da inclusão”, adiantou ela.
O segundo dia contou com quatro painéis: Desafios e perspectivas: o que fazer para devolver ao Centro do Recife a viabilidade social e econômica que o notabilizou no passado?; A pauta ambiental e o desafio de tornar o Centro do Recife um espaço urbano novamente habitado; A salvaguarda do patrimônio urbanístico e histórico do Centro do Recife: como garantir a sua preservação em harmonia com as novas demandas da sociedade?; e O Centro do Recife enquanto foco de produção cultural, artística e turística.
Todos os temas, praticamente, fizeram também a combinação entre o social e o estrutural, entre recuperar edificações e espaços públicos, mas garantir que a pessoas frequentem o centro do Recife não apenas como visitantes e trabalhadores, sobretudo como moradores, tornando a área segura e atrativa para despertar o interesse em habitá-la.
Segundo Karla Zapata, gerente-geral de Governança e Articulação Estratégica do Recentro, que participou do primeiro painel do dia, o primordial é reconciliar o cidadão com o centro do Recife. “Fazer uma conexão de toda a cidade com o centro, pela cultura, pelo fluxo produtivo, mostrando ser ele sustentável, saudável e inclusivo”, resumiu ela.
Iana Ludemir, professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que falou no painel A salvaguarda do patrimônio urbanístico e histórico do Centro do Recife: como garantir a sua preservação em harmonia com as novas demandas da sociedade?, lembrou como há lógicas diferentes de se ver o centro da cidade, onde pessoas em situação de vulnerabilidade enxergam prédios abandonados e históricos como locais de moradia, setores empresariais veem como edificações obsoletas e uma parcela dos cidadãos como algo velho e descartável. Ela defende uma reeducação de olhares. “São edificações que estão, muitas vezes, em bom estado e podem ser recuperadas para diversos fins, habitacionais ou comerciais, mas que estão sendo vistas de forma inadequada. Inclusive, ameaçadas de demolição para construir algo moderno no lugar.”
No mesmo painel, o jornalista Francisco José fez uma apresentação da sua relação com o Recife, contando casos de sua atuação como repórter e demonstrando o amor que as pessoas que entrevistava tinham pela cidade, se empolgando em falar sobre ela, seja durante os dias comuns ou os de carnaval.
O último painel reuniu depoimentos de especialistas sobre o potencial cultural, artístico e cultural do Recife e como não é difícil atrair investimentos para a cidade, sob esses pontos de vista. Roderick Jordão, turismólogo, ativista da sociedade civil e empreendedor, apresentou passeios que podem ser feitos dentro do centro do Recife, que até mesmo moradores locais desconhecem, fazendo-os ter um novo olhar sobre locais que lhes parecem por demais conhecidos, mas que ainda guardam descobertas a serem feitas. “Podemos, no Recife Antigo, ver o Sol nascer no mar e no rio Capibaribe. É um dos diferenciais de nossa cidade.”
Atividades culturais – Nos dois dias, o público presente pode acompanhar a exposição fotográfica De Olho no Recife, onde imagens do centro do Recife foram expostas no hall de entrada do Centro Cultural Rossini Alves Couto e poderiam ser vistas através de monóculos. Também houve mostra de peças de artesanato e literatura de cordel e recital de poesias de autoria de Giuseppe Macena e Gleison Nascimento.