A ofensiva do Irã é uma retaliação ao ataque ao seu consulado em Damasco, na Síria, que matou comandantes militares iranianos no início deste mês. O ataque foi atribuído a Israel, embora o país não tenha assumido a autoria.
O ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, afirmou que o confronto com o Irã “ainda não acabou”.
Mas o Irã disse que o ataque “alcançou seus objetivos” e acrescentou que usará uma força maior força se Israel realiar.
Para entender o que pode acontecer agora em uma região que já é palco da guerra na Faixa de Gaza, a BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) conversou com Lina Khatib, pesquisadora especialista em Oriente Médio ligada à Chatham House, uma consultoria e centro de pesquisas em Londres.
BBC News Mundo – Porque é que o Irã fez este ataque agora?
Lina Khatib – Acredita-se que o objetivo do Irã com este ataque foi proporcionar uma espécie de espectáculo para o mundo testemunhar.
(A ofensiva) foi amplamente coreografada e bastante limitada. E até o próprio Irã emitiu uma declaração após o ataque em que dizia: “consideramos o assunto encerrado”, referindo-se à possibilidade de retaliação.
Isto mostra que o Irã queria enviar uma mensagem muito clara e firme para impor respeito e ser visto como capaz de responder diretamente a Israel (após o ataque em Damasco).
Mas é claro que o Irã não quer que a coisa se torne uma escalada de tensões.
BBC News Mundo – Israel disse que “o confronto com o Irã não acabou”. Existe o perigo de qualquer um dos lados lançar outro ataque e escalar a disputa?
Khatib – Estamos em um momento muito perigoso porque mostra a ‘audácia do Irã’, como descrito pelos políticos ocidentais.
Penso que o Irã é um país que se sente muito vulnerável militarmente diante de Israel e dos Estados Unidos, e essa vulnerabilidade traduz-se muitas vezes em ‘audácia’.
Portanto, não creio que este seja o fim das tensões entre o Irã e Israel e isto mostra a importância de os aliados ocidentais apresentarem uma estratégia abrangente contra o Irã.
BBC News Mundo – A resposta ao ataque foi uma demonstração da capacidade do sistema de defesa aérea de Israel, que conseguiu interceptar a maioria dos mísseis e drones lançados por Teerã?
Khatib – Sim. E Israel mostrou ao Irã que não está sozinho.
A intercepção de mísseis iranianos no sábado dependeu em grande parte dos Estados Unidos e de seus aliados na região, como a Jordânia e o Egito.
Isto foi muito bem demonstrado após o ataque e foi uma mensagem para Teerã.
Da mesma forma, o Irã mostrou que possui um poder militar significativo, mas este poder não será suficiente para derrotar militarmente Israel.
BBC News Mundo – Mas os Estados Unidos estariam dispostos a participar de um ataque contra o Irã se Israel decidisse realizá-lo?
Khatib – Não creio que alguém esteja disposto a fazer isso. A resposta israelense já foi bastante firme.
Mas também penso que se alguém foi recompensado pelas ações do Irão no sábado, foi o governo de Benjamin Netanyahu, que alcançou uma vitória importante ao defender com sucesso Israel após o ataque.
BBC News Mundo – Alguns analistas afirmaram que foi Israel quem iniciou esta escalada de tensões com o ataque ao consulado iraniano em Damasco no início de abril. Você concorda?
Khatib – Não. Este período específico (de tensões) faz parte do quadro mais amplo que começou em 7 de outubro com o ataque do Hamas a Israel.
Pouco depois desse ataque, o Hezbollah no Líbano, os Houthis no Iêmen e grupos apoiados pelo Irã na Síria e no Iraque também começaram a atacar Israel.
Portanto, trata-se de um contexto mais amplo que vai além deste conflito.
BBC News Mundo – Os Estados Unidos falam frequentemente em respeitar as leis e os sistemas jurídicos internacionais e, no entanto, Israel matou pessoas dentro de um consulado, com um ataque direto.
Khatib – Me parece que Israel planejou habilmente um ataque que poderia ser considerado como não tendo violado qualquer lei internacional, porque o edifício que atacaram supostamente não foi designado como território oficial iraniano. Essa foi a justificativa que eles deram.
Infelizmente, neste contexto da guerra no Oriente Médio e em outros conflitos em geral, tem havido interpretações muito criativas do direito internacional e das leis em matéria de direitos humanos, que permitiram que todos os agentes continuassem a fazer tudo o que queriam.
BBC News Mundo – O objetivo de alcançar algum tipo de estabilidade no Oriente Médio está mais distante agora do que nunca?
Khatib – Completamente. Tanto a crise israel x palestina, um conflito que está em ebulição há décadas, como as intervenções do Irã que estão desestabilizando o Oriente Médio, mostram que o objetivo está mais distante.
Infelizmente, tanto o Reino Unido quanto os Estados Unidos e a Europa sempre ignoraram o papel desestabilizador do Irã porque se concentraram no programa nuclear iraniano. E agora estamos vendo as consequências de “fechar os olhos”.
E o mesmo aconteceu com o conflito nos territórios palestinos, que foi ignorado durante décadas sem que se tentasse encontrar uma solução.
Portanto, a única forma de estabilizar a região é tentar resolver estas duas questões em conjunto.
Fonte: BBC
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