- Andrea Díaz Cardona
- BBC News Mundo
“Canadá? Mas lá o frio é insuportável e o país é vazio…”
Quem já imigrou ou pensa em se mudar para o país da América do Norte com certeza já ouviu esse tipo de comentário de algum interlocutor.
E também é muito provável que a pessoa tenha mencionado os subsídios ou auxílios oferecidos pelo governo canadense como motivos para imigração.
Mas o quanto tudo isso é verdade? A BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, analisou três mitos sobre a imigração para o país.
1. O frio é insuportável?
A resposta é sim e não: faz muito frio, mas não é necessariamente insuportável.
No Canadá, o inverno é longo e, em muitos casos, com bastante neve, mas há vários fatores a serem considerados antes de fazer generalizações.
A primeira coisa é que o clima não é o mesmo em todas as regiões. O Canadá é o segundo maior país em território, depois da Rússia, com 9,98 milhões de quilômetros quadrados que se estendem do Atlântico ao Oceano Pacífico.
Por isso, o clima varia conforme a localização e sua proximidade com a costa e com o Polo Norte.
Os invernos mais rigorosos, por exemplo, “ocorrem no centro do país, nas províncias de Saskatchewan e Manitoba, porque são as mais afastadas dos oceanos que, por não congelarem, ajudam a manter as costas um pouco mais quentes”, explica Phil Austin, professor associado de Ciências Atmosféricas da Universidade de British Columbia.
Por outro lado, na costa oeste, onde fica Vancouver, os invernos são menos frios e com menos neve.
“Em Vancouver, o vento vem do oeste, do Oceano Pacífico que nunca congela, sopra sobre águas mais quentes. A única vez que você tem tempestades de neve de verdade é quando o vento vem do Ártico e traz ar muito frio, algo raro”, acrescenta.
Os locais com clima mais adverso estão no norte do país, onde estão as províncias de Yukon e Territórios do Noroeste, que, por sua proximidade com o Ártico, são muito frias, têm muita neve e dias mais escuros.
Outro fator importante em relação ao inverno é a quantidade de luz solar, pois o frio intenso não significa que os dias sejam mais escuros.
A questão então é o que cada um prefere: menos neve e ao mesmo tempo menos luz, ou muita neve e céu limpo.
“Em Saskatchewan e Manitoba, por exemplo, você pode ter dias muito claros com céu claro e o sol refletindo na neve, enquanto em Vancouver quase não há neve durante o inverno, mas você também não vê muito sol”, explica a professora.
“Depende muito do tipo de personalidade da pessoa, se ela prefere dias ensolarados ou se seu humor é afetado por dias mais cinzentos”.
E, finalmente, devemos considerar que o inverno influencia a infraestrutura e a cultura do Canadá, além do modo de vida. Por isso, o frio está longe de ser um fator de paralisia ou confinamento.
O aquecimento artificial está disponível em todos os lugares, as cidades onde costuma nevar têm sistemas de remoção de neve para evitar bloqueios de estradas e há muitos lugares interconectados para que você não precise andar na rua.
É o caso do metrô de Montreal. Várias estações se ligam a shopping centers, instituições de ensino e repartições públicas por meio de passagens subterrâneas.
Soma-se a isso a cultura dos esportes de inverno; as crianças, por exemplo, muitas vezes aprendem desde cedo a praticar diversos esportes e, assim, têm várias opções de lazer ao ar livre durante os meses frios.
“Para alguém como eu, que imigrou dos Estados Unidos há 30 anos, foi incrível ver a importância do hóquei no Canadá. Realmente é quase uma religião e é por isso que eles comemoram e colocam rinques de patinação nos parques e no quintal de casa”, diz Phil Austin, da Universidade de British Columbia.
“Eles realmente fazem do inverno uma parte crucial de sua identidade.”
Austin cita como exemplo o grande rinque de patinação que o Canal Rideau se transforma em Ottawa, capital do país.
Com 7,8 quilômetros e acesso gratuito, ele oferece diversão e uma forma alternativa de locomoção pelo centro da cidade.
Dado que o Canadá tem há várias décadas uma política de imigração regulamentada, com a qual procura atrair mão-de-obra estrangeira, difundiu-se a crença de que é um país despovoado, onde há muita terra e pouca gente.
Mas isso não é inteiramente verdade.
“O problema do Canadá não é o tamanho da população, mas sua estrutura. Ou seja, não é um problema de quantas pessoas existem, mas da conformação da população em termos de idade”, explica Diva Marcela García, PhD em Demografia pela Universidade Autónoma de Barcelona.
Isso se explica porque o país “tem uma baixa taxa de natalidade, por isso há menos pessoas nas fases iniciais da vida, enquanto a mortalidade ocorre tardiamente graças ao seu alto nível de qualidade de vida e universalidade do acesso à saúde”.
“Esses dois fatores fazem com que seja um país com uma população muito envelhecida”, acrescentou.
Em outras palavras, no Canadá há pessoas de todas as idades, mas há mais pessoas com mais de 65 anos do que crianças crescendo.
Isso fica evidente quando se analisa a taxa de fecundidade, indicador que mede o número de filhos que uma mulher tem ao longo de sua vida.
“A taxa de reposição global é de 2,1 filhos por mulher, número estimado necessário para garantir a sustentabilidade da população. No Canadá, o número de filhos por mulher está abaixo de 2,1 há pelo menos 20 anos”, argumenta Garcia.
Segundo dados das Nações Unidas, esse número é atualmente de 1,47 no Canadá. Assim, a estratégia do país é atrair imigrantes em idade ativa e reprodutiva que contribuam para o crescimento da população jovem a médio e longo prazo, contribuindo simultaneamente para o mercado de trabalho e a previdência.
3. É verdade que eles dão muitos benefícios?
A primeira coisa a esclarecer é que dizer que o governo oferece “presentes” é algo problemático e impreciso.
Imigrantes têm acesso a alguns subsídios, mas eles não são dados necessariamente em dinheiro e estão sujeitos a diversos fatores.
O Canadá é dividido em províncias e cada uma delas tem um governo local autônomo, portanto, administra seu próprio orçamento.
Dessa forma, dependendo do local onde o imigrante mora, ele terá acesso ao auxílio que for oferecido na região. E isso depende de seu perfil.
“Em geral, não há subsídios econômicos diretos para imigrantes no Canadá”, diz Alejandro Hernández, PhD em Sociologia pela Carleton University.
“Pelo contrário, o Canadá, desde a década de 1990, apoia a integração por meio de terceiros. Ele seleciona agências que promovem serviços de integração e assentamento em províncias e comunidades. O orçamento deve ser continuamente solicitado e renovado por essas agências.”
Os serviços mais comuns costumam ser de apoio e assessoria para entrar no mundo do trabalho.
Quem imigra para o país recebe, por exemplo, auxílio na organização de documentos como currículo e carta de intenção, além de treinamento para focar o perfil e se preparar para os processos seletivos. Neste caso, os beneficiários não recebem dinheiro.
Um dos exemplos é o Quebec, província francófona que também é a única que tem total autonomia na regulação da imigração.
“Lá existe algum apoio direto aos imigrantes, que está mais relacionado a uma questão nacionalista e ao domínio do francês”, acrescenta Hernández.
Como naquele território há interesse em conservar o francês como primeira língua oficial (o inglês também é), se o imigrante estudar francês em tempo integral e presencial, “pode receber CAN$ 205 (cerca de R$ 785) por semana, mais transporte apoio”, disse Hernandez.
Para ingressar neste programa, o imigrante deve atender a uma série de requisitos e deve se comprometer com as obrigações do currículo acadêmico. Também deve-se levar em conta que os valores e condições deste programa podem mudar dependendo do governo.
Outro tipo de ajuda que algumas organizações oferecem é a assessoria jurídica e a tradução de documentos para quem precisa validar seu título.
Há também apoios voltados para a adaptação ao inverno, com cursos de esportes na neve, a preços mais acessíveis para os novos imigrantes.
Também é possível encontrar programas e instituições que gerenciam doações de móveis ou roupas para facilitar a vida dos recém-chegados, mas, novamente, as pessoas devem se inscrever nesses tipos de programas e passar por certos filtros.
Por fim, é importante esclarecer que aqueles que são residentes permanentes no Canadá podem acessar outros tipos de subsídios oferecidos pelo governo à população em geral, não exclusivamente aos imigrantes.
Trata-se de auxílio para estudos, para pensão alimentícia ou para pessoas economicamente vulneráveis.
Estes apoios variam para cada província e foram estabelecidos alguns filtros e condições que devem ser cumpridas.
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