Crédito, Juan Ignacio Roncoroni/Reuters

Legenda da foto, O presidente argentino Javier Milei mencionou os “laços de amizade” entre seu país e a Argentina

O libertário argentino Javier Milei agradeceu o Brasil do esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A cena inesperada aconteceu na quinta-feira (1/8), porque o governo brasileiro, a quem Milei ataca frequentemente e com quem reduziu as relações, assumirá a embaixada da Argentina em Caracas, capital da Venezuela.

O Brasil tomará a coordenação da representação do país vizinho, a pedido da Argentina, após o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, ter rompido relações diplomáticas com o país de Milei e ter ordenado a expulsão dos diplomatas argentinos do país.

O mesmo está sendo negociado com o Peru, cujas tratativas ainda estão em curso.

Essa será ao menos a segunda vez que essa condução diplomática acontece. Durante a Guerra das Malvinas, um conflito ocorrido em 1982 entre a Argentina e o Reino Unido pelos arquipélagos localizados no Atlântico, o Brasil assumiu a embaixada argentina no Reino Unido.

Agora, as negociações ocorrem depois que Maduro agiu em represália às críticas do presidente argentino ao processo eleitoral venezuelano.

Segundo a autoridade eleitoral da Venezuela, Maduro conquistou seu terceiro mandato na eleição de domingo (28/7), mas os números são rejeitados pela oposição.

Até o momento, ao menos sete embaixadores e diplomatas foram expulsos da Venezuela.

Além da Argentina e Peru, Chile, Costa Rica, Panamá, República Dominicana e Uruguai tiveram seus representantes diplomáticos removidos do país após a eleição de domingo.

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Legenda da foto, Publicação de Milei na rede social X nesta quinta-feira (1/7)

O gesto de Milei, que foi à rede social X (antigo Twitter) agradecer nominalmente ao Brasil, é inédito.

Há menos de 30 dias, Milei voltou a chamar Lula de “corrupto, na mesma rede social. Ele também citou, sem mencionar nomes, um “perfeito dinossauro idiota”.

Milei participou do evento, organizado pela direita radical brasileira, ao mesmo tempo que deixou de ir à 64ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul.

Lula e Milei nunca se encontraram. Em dezembro do ano passado, quando o argentino tomou posse, o petista não estava presente.

A ausência ocorreu na esteira de uma série de insultos proferidos por Milei ao longo de sua campanha presidencial, a Lula.

“Comunista nervoso”, “presidiário comunista”, “ladrão” e “socialista com vocação totalitária” foram alguns dos ataques feitos pelo argentino a Lula.

O tom, agora, é outro. “Aprecio muito a disposição do Brasil de cuidar da custódia da embaixada da Argentina na Venezuela. Também apreciamos a representação momentânea dos interesses da República Argentina e de seus cidadãos lá”, disse Milei.

“Os laços de amizade que unem a Argentina com o Brasil são muito fortes e históricos”, prosseguiu o argentino.

Milei afirmou que os diplomatas argentinos deixaram a Venezuela na quinta-feira “como uma retaliação do ditador Maduro pela condenação que fizemos da fraude que perpetrou no domingo passado”.

Pela manhã, a bandeira do Brasil foi hasteada na representação argentina. Milei também postou esta imagem em seu X.

A decisão vai muito além do simbólico. À frente da embaixada, o Brasil cuidará dos imóveis e arquivos e também atenderá questões ligadas aos cidadãos argentinos na Venezuela.

Brasil responsável também por opositores venezuelanos

O movimento também é acompanhado de perto pela oposição venezuelana.

O motivo é que dentro da embaixada estão abrigados seis opositores de Maduro que pediram asilo político.

“Estamos protegendo os aliados da [María] Corina [líder da oposição]. Isso tem que ter aceitação do governo Maduro”, ressaltou um fonte diplomática à BBC News Brasil.

Embaixadas estrangeiras estão protegidas pela inviolabilidade prevista na Convenção de Viena, o que significa que as autoridades locais não podem entrar nas instalações diplomáticas sem o consentimento do país responsável por elas.

Nos últimos dias, havia um temor sobre o que poderia acontecer com esses opositores.

Na terça-feira (30/7), o governo argentino responsabilizou Maduro por ações “hostis” em relação à embaixada depois que o prédio teve fornecimento de energia cortado.

Em nota no mesmo dia, a diplomacia de Milei rejeitou “qualquer ação deliberada que coloque em perigo a segurança do pessoal diplomático da Argentina e dos cidadãos venezuelanos sob proteção” que permanecem na embaixada.

O governo argentino também fez “um apelo à comunidade internacional sobre a importância de lutar pelo cumprimento das normas internacionais que regem as relações diplomáticas entre os Estados”.