- Rafael Barifouse
- Da BBC News Brasil em São Paulo
Felipe Terrezo é dono de duas farmácias no Rio de Janeiro, mas, quando sua neta ficou doente na última semana, ele não tinha novalgina em solução em suas lojas para dar à menina para baixar a febre.
“Não encontro no mercado há cerca de dez dias, e não estou conseguindo comprar. Por sorte, eu tinha um frasco aberto em casa que resolveu o problema dessa vez”, diz Terrezo, que é presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos do Rio.
O empresário diz que notou recentemente que está excepcionalmente difícil encontrar alguns antibióticos para abastecer suas farmácias.
“Quando os clientes chegam e o remédio está em falta, a gente busca ajudar e substituir por um de outra marca ou um genérico, mas e o que não tem substituição?”
Situações assim têm sido frequentemente noticiadas em diferentes partes do país. No Paraná, por exemplo, havia 500 medicamentos em falta no início de maio, segundo o sindicato de varejistas farmacêuticos.
O desabastecimento na farmácias também preocupa em ao menos outros 17 Estados e no Distrito Federal.
A falta de remédios já foi relatada em Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, Pará, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.
“Embora não haja dados que nos permitam afirmar de forma categórica que há um desabastecimento excepcional, temos ouvido, sim, muitos relatos de falta de medicamentos específicos, especialmente os muito baratos, que a indústria não tem interesse em produzir, como é o caso de alguns antibióticos”, diz o advogado Matheus Falcão, pesquisador do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Falcão explica que a razão do problema normalmente não está nas lojas, mas nos fabricantes.
“O Brasil tem um problema estrutural de capacidade de produção e depende das importações do medicamento em si ou dos insumos farmacêuticos ativos [o principal ingrediente de um medicamento], e, em 2022, os lockdowns na China por causa da covid e a guerra na Ucrânia afetaram o fornecimento”, diz o pesquisador do Idec.
Sérgio Barreto, presidente da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), diz que, além da maior dificuldade para a chegada de insumos ao país, o setor farmacêutico enfrentou uma espécie de “efeito dominó”.
“Outros produtos que estavam faltando exigiram mais dedicação da indústria, acarretando a redução na fabricação de outros produtos”, diz.
O aumento de casos de gripe ao mesmo tempo em que as infecções pelo coronavírus voltaram a crescer no Brasil também são apontados como motivos para o desabastecimento.
Houve uma maior demanda por determinados antibióticos no início deste ano, segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), que afirma serem problemas pontuais e que as fabricantes estão ajustando sua produção para atender o mercado.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) explicou à BBC News Brasil que, apesar de ser a responsável por regular e monitorar esse mercado, não cuida das relações comerciais do setor, como as aquisições e distribuição de medicamentos, e diz que não tem meios legais para obrigar as fabricantes a garantir a oferta de medicamentos no país.
Mas as empresas têm algumas obrigações a cumprir em caso de desabastecimento, e o consumidor pode tomar algumas medidas caso se depare com algum medicamento em falta na farmácia.
O primeiro passo deve ser ligar para o serviço de atendimento ao consumidor do laboratório que fabrica o remédio para verificar se há realmente algum problema no fornecimento, diz a Anvisa.
Caso a fabricação ou importação de um produto tenha sido interrompida temporariamente ou definitivamente, a empresa deve informar os motivos e datas em seus sites e canais de atendimento.
“A empresa tem ainda o dever de informar onde o consumidor pode conseguir o medicamento na região onde vive”, afirma Matheus Falcão, do Idec.
2. Consulte a Anvisa
Mas há casos em que o produto simplesmente não está disponível no mercado, e não vai adiantar ir de farmácia em farmácia em busca dele.
O consumidor deve consultar a Anvisa para confirmar se é o caso, porque as fabricantes têm a obrigação de notificar a agência que um medicamento será descontinuado de forma definitiva ou temporária com no mínimo seis meses de antecedência.
A agência mantém em seu site uma lista das notificações. Se um medicamento estiver nela, o consumidor deve checar a data em que o aviso foi feito, porque a agência determina que o fornecimento deve ser garantido por ao menos seis meses depois disso.
Quando a descontinuação puder gerar um risco de desabastecimento, como é o caso de quando há um único medicamento de certo tipo disponível ou esse produto responde por uma grande fatia do mercado, o aviso deve ser feito um ano antes, segundo a Anvisa.
3. Denuncie
Se um medicamento estiver em falta porque deixou de ser fabricado e isso não tiver sido notificado à Anvisa, o consumidor pode denunciar a empresa na central de atendimento da agência, pelo telefone 0800 642 9782, ou em sua ouvidoria.
A agência informa que isso pode configurar uma infração sanitária e levar à abertura de um processo administrativo contra o laboratório, que pode ser punido.
As denúncias também ajudam a agência a monitorar se há desabastecimento ou risco de desabastecimento e tomar as medidas necessárias para tentar garantir a disponibilidade do medicamento no mercado.
“A Anvisa pode pedir informações a outros fornecedores e informar a população da escassez de um medicamento específico”, diz Falcão.
Há casos em que a falta de um medicamento pode gerar uma crise de saúde pública. Em casos assim, pode ser necessário recorrer ao Ministério da Saúde.
“O ministério pode tomar medidas pontuais e ir atrás dos produtores, se articular com a Anvisa para fazer uma negociação para que o produto volte a ser fabricado”, afirma Falcão.
Procurado pela BBC News Brasil, o Ministério da Saúde disse que trabalha para manter a rede pública abastecida, mas não tratou do desabastecimento relatado na rede privada em sua resposta aos questionamentos enviados pela reportagem.
4. Acione a Justiça
Muitas vezes, alguém precisa de um tratamento de curto prazo, e não vale a pena recorrer à Justiça para conseguir ter acesso a um remédio.
Mas há outros casos, como de medicamentos de alto custo e de uso continuado, em que o desabastecimento pode implicar em uma violação do direito de uma pessoa à saúde.
Matheus Falcão explica que, nestes casos, é possível recorrer a uma ação judicial.
“A pessoa pode entrar na Justiça para que a empresa justifique por que o produto não está sendo disponibilizado e para conseguir o medicamento”, afirma o advogado do Idec.
5. Procure um profissional de saúde
Quando houver um desabastecimento de um determinado produto, o consumidor deve procurar um profissional de saúde para substituir o medicamento que foi originalmente indicado pelo médico.
Isso pode ser feito em alguns casos pelo farmacêutico responsável pela farmácia, que irá indicar um produto de outra marca ou genérico.
Mas há situações em que o médico indica na receita que um remédio não pode ser substituído por um genérico ou não há um produto equivalente de outras fabricantes.
Nestes casos, o paciente deve procurar o médico para que ele faça a substituição mais adequada do medicamento que foi prescrito.
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