- Author, Redação
- Role, BBC News Brasil
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O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela anunciou na madrugada desta segunda-feira (29/7) que o presidente Nicolás Maduro venceu as eleições presidenciais deste domingo, consideradas uma das mais imprevisíveis dos últimos anos e nas quais a oposição apostava que poderia alcançar um triunfo histórico após 25 anos de chavismo no governo.
Segundo o presidente do CNE, Elvis Amoroso, Maduro obteve 51,2% dos votos, contra 44,2% do opositor Edmundo González, com 80% das urnas apuradas. Amoroso, um aliado de Maduro, disse que os resultados são irreversíveis e que o país investigará ataques ao sistema eleitoral.
O anúncio veio depois de horas em que o país mergulhou em tensão à espera dos resuktados e com a oposição denunciando supostas irregularidades no processo e declarando também ter vencido o pleito.
Durante todo dia, a incerteza foi a sensação dominante nas ruas de Caracas, quando o país viveu uma jornada eleitoral que transcorreu sem grandes incidentes, mas com grande participação – diferentemente do Brasil, na Venezuela o voto não é obrigatório – e longas filas para votar, relata Norberto Paredes, enviado especial da BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, à Venezuela.
O presidente Nicolás Maduro, de 61 anos, que dirige o país desde 2013, vinha se mostrando confiante na vitória que lhe dará um terceiro mandato a partir de janeiro, apesar do entusiasmo da oposição, que aparecia na frente na maioria das pesquisas.
Analistas como Luis Vicente León, presidente do instituto de pesquisa Datanálisis, apontavam, no entanto, que a capacidade de mobilização do governo com o uso da máquina estatal também seria um fator importante de impacto do resultado.
Durante a campanha, a líder da oposição María Corina Machado, inabilitada para exercer cargos públicos, transferiu seu apoio ao candidato Edmundo González, um ex-diplomata de 74 anos escolhido para representar a coalização contra o chavismo.
Na avaliação de analistas, desde 2013 a oposição não aparecia com tamanha possibilidade de derrotar o governo, apesar das denúncias de que o processo eleitoral não teve condições justas de competição, por conta da própria inabilitação de Machado ou das dificuldades para o voto dos milhões de venezuelanos que estão no estrangeiro por causa da longa crise econômica e política do país.
O anúnicio do resultado, no entanto, não deve dissipar as tensões em Caracas.
Desde o encerramento das urnas – às 18h de Caracas (19h em Brasília) – os dois principais nomes da oposição intensificaram os pedidos para que seus eleitores continuassem em “vigília” nos centros eleitorais.
María Corina Machado também pediu que os oposicionistas atuando como fiscais exigissem atas de resultados nos centros de votação, citando que esse era um direito previsto em lei.
“Esses são minutos cruciais, horas decisivas”, disse Machado. “Precisamos que todos os venezuelanos permaneçam nos centro de votação acompanhando os observadores.”
“Essa jornada vai terminar como começou. Vamos terminar em paz e comemoraremos em paz”, disse González, ao lado da opositora em uma entrevista coletiva.
Os apelos foram seguidos de denúncias de opositores sobre supostas irregularidades em centros de votação. Pouco antes do anúncio oficial, González disse no Twitter ter ganhado a disputa.
Reação e papel do Brasil, Colômbia e dos EUA
O processo eleitoral foi seguido de perto pelos países vizinhos e pelos EUA, mas teve uma reduzida participação de observadores internacionais, depois que o governo Maduro, que controla o CNE, retirou o convite para que uma missão da União Europeia acompanhasse o pleito.
O governo brasileiro enviou Celso Amorim, ex-chanceler e influente assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para temas internacionais, para Caracas.
Na noite de domingo, Amorim divulgou nota celebrando que “a jornada tenha transcorrido com tranquilidade, sem incidentes de monta”, com “participação expressiva do eleitorado”.
“Estou em contato com diferentes forças políticas e analistas eleitorais, além de membros da equipe de observadores do Centro Carter e do Painel de Especialistas da ONU. O presidente Lula vem sendo informado ao longo do dia. Vamos aguardar os resultados finais e esperamos que sejam respeitados por todos os candidatos”, disse o ex-chanceler.
A declaração reforçou a mensagem de Brasília nos últimos dias de que o resultado, seja qual fosse, deveria ser respeitado. Na última semana, Lula, um aliado do chavismo, marcou uma inusual distância do presidente venezuelano ao criticar a declaração de Maduro de que uma vitória da oposição levaria a “um banho de sangue”.
O Ministério de Relações Internacionais da Colômbia, que ao lado do Brasil é apontado por analistas como um país que pode ser potencial mediador na situação venezuelana, cobrou que a contagem de votos seja feita “com amplas garantias” para todos os atores.
Nem o presidente Lula nem o colombiano Gustavo Petro haviam se pronunciado sobre a jornada eleitoral até a publicação desta reportagem.
Já o chileno, Gabriel Boric, de esquerda, usou as horas de espera para engrossar o coro por respeito aos resultados. Enquanto isso, o libertário argentino Javier Milei, de aberta oposição a Maduro, se manifestou no X (antigo Twitter).
“Fora, ditador Maduro”, escreveu Milei em maiúsculas. “Os dados anunciam uma vitória acachapante”, seguiu, quando ainda não existiam resultados oficiais divulgados.
A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, havia afirmado no início da noite que “vontade do povo venezuelano deve ser respeitada”.
Ainda antes do resultado, Kamala, que será possivelmente a rival de Trump nas eleições deste ano, defendeu um “futuro mais democrático”, sem mencionar nomes.
O papel que terá os EUA é um aspecto aguardado, já que Washington mantém sanções à indústria petrolífera venezuelana para punir o governo Maduro.
Sob pressão da Guerra da Ucrânia e para incentivar o processo eleitoral da Venezuela, a Casa Branca afrouxou as sanções por alguns meses em 2023, após um acordo que prometia a participação da oposição nas eleições.
Como o CNE impediu Maria Corina Machado de concorrer, a redução das sanções foi revertida.
Como funciona o sistema eleitoral
Durante o domingo, a grande participação eleitoral se traduziu em longas filas na Venezuela. Norberto Paredes, enviado da BBC Mundo, visitou o Liceo Andrés Bello, um dos maiores centros de votação da capital venezuelana, onde uma senhora contou que estava há duas horas na fila, mas que estava disposta a passar o dia todo ali, se fosse necessário.
A poucos quilômetros, no Colégio Amanda de Schnell, localizado no bairro El Valle, que no passado foi um bastião do movimento chavista, vários moradores, que haviam permanecido algumas horas sob o sol inclemente de Caracas para votar, contaram que a crise econômica os havia obrigado a votar na oposição pela primeira vez. “Já é impossível justificar o governo de Maduro”, disse um senhor que pediu para não ter seu nome revelado.
Um dos poucos centros onde não havia grandes filas foi no Colégio Manuel Palacio Fajardo, na bairro 23 de Janeiro, uma populosa área de Caracas conhecida por ser um dos grandes redutos do chavismo e onde fica o mausoléu de Hugo Chávez, morto em 2013.
Era lá que Chávez votava e lá ainda vota sua filha, María Gabriela Chávez. Quando Gabriela chegou para votar às 11:30 da manhã, havia apenas uma dezena de pessoas esperando para fazer o mesmo. A maioria disse que votaria no candidato opositor.
Analistas não descartam que a incerteza se mantenha mesmo depois que os resultados forem anunciados.
Um dos grandes potenciais temas será uma possível auditoria dos resultados. Na Venezuela, há sistema de votação eletrônico, mas com diferenças em relação ao brasileiro.
Ao chegar ao local de votação, o eleitor apresenta o documento, que é registrado no sistema. Depois, por meio da biometria, é feita a autenticação e a urna eletrônica é liberada para que ele vote.
As fotos dos candidatos aparecem na tela. No entanto, o sistema indica os candidatos apoiados por cada partido. Quanto mais apoios tiver, mais fotos aparecerão. Assim, Maduro apareceu 13 vezes. González, três.
Depois de votar, o sistema imprime o voto e o eleitor o coloca em uma urna. Após a votação, os fiscais comparam os resultados das urnas eletrônicas com os do papel.
Colaborou Marina Rossi, da BBC News em São Paulo
Fonte: BBC
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