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Segundo Lula, “ninguém toma dinheiro emprestado a 13,75%”; petista também disse que estatais foram vendidas “simplesmente para pagar juros da dívida pública”.

Em pronunciamento na manhã desta segunda-feira (24/4) no Fórum Empresarial Brasil-Portugal, em Matosinhos, na região do Porto, em Portugal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a criticar a alta taxa de juros do Brasil e reiterou que não vai vender empresas estatais.

“Nós temos um problema, primeiro-ministro (António Costa, premiê de Portugal), que não sei se Portugal tem, que a nossa taxa de juros é muito alta, é muito alta. No Brasil, a taxa Selic, que é a taxa referencial, está a 13,75%. Ninguém toma dinheiro emprestado a 13,75%, ninguém”, disse Lula, que está em viagem oficial em Portugal desde sexta-feira (21/4).

“E a verdade é que um país capitalista precisa de dinheiro, e esse dinheiro precisa circular, não apenas na mão de poucos, na mão de todos”.

“É por isso que eu digo sempre: a solução do Brasil é a gente voltar a colocar no Orçamento, é a gente garantir que as pessoas pobres possam participar, porque quando eles virarem consumidores, eles vão comprar; quando eles comprarem, o comércio vai vender; quando o comércio vender, vai gerar emprego; quando o comércio vender, vai comprar mais produtos da fábrica; não precisa importar da China, pode comprar produtos produzidos no Brasil, e a gente vai gerar mais emprego, e mais emprego vai gerar mais salário; é uma coisa mais normal da roda gigante da economia funcionando e todo mundo participando”.

“Já fizemos isso uma vez e vamos fazer outra vez”, acrescentou.

Lula também reiterou que seu governo não vai vender estatais.

“No Brasil, não vamos vender as empresas públicas. Queremos convidar os empresários para fazer parcerias naquilo que a gente precisa criar de novo”, afirmou.

Segundo Lula, nos últimos seis anos, estatais foram vendidas “simplesmente para pagar juros da dívida pública”.

“Ou seja, nos desfizemos do nosso patrimônio, e a qualidade do serviço não melhorou”, disse o petista, citando o caso da Eletrobras.

Lula falou a empresários na sequência do primeiro-ministro português, António Costa.

Juros altos

Não é a primeira vez que o petista critica os juros no Brasil. Desde o início de seu mandato, ele vem se queixando do patamar dos juros e pressionando por sua redução.

Também tem feito críticas públicas ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Parlamentares e empresários, também.

Na semana passada em Londres, no Reino Unido, Campos Neto destacou a independência do Branco Central e defendeu a subida dos juros no ano passado.

“O Banco Central fez a maior alta de juros num ano de eleição na história do mundo. Isso mostra que o BC atua de forma bastante independente. Na política monetária, quando você age antes, o custo é menor”, disse o presidente do BC em palestra na conferência em Londres.

Na visão de Campos Neto, se os juros não tivessem subido em ano de eleição, a inflação não seria 5,8%, mas de 10%, como previsto pelas projeções.

“A inflação esperada no outro ano seria 14% e, se isso tivesse acontecido, basicamente a gente teria que estar com juros de 18,75% para ter o mesmo objetivo. E teria, muito provavelmente, que subir o juros para o ano que vem, colocando o país numa recessão, alguma coisa entre 3% e 4%, que foi a última coisa que aconteceu da última vez que o Brasil tentou ‘cair’ os juros”, assinalou ele, falando para uma plateia de empresários, ex-ministros da Fazenda, ex-presidentes do Banco Central e parlamentares.

Segundo Campos Neto, embora o “anseio dos juros seja político” o trabalho do Banco Central “é técnico”.

“O timing técnico é diferente do timing político, por isso a autonomia é importante. O custo de combater inflação é alto e sentido no curto prazo, mas o custo de não combater é mais alto e perene”, afirmou.

Para o presidente do Banco Central, a taxa Selic alta se justifica porque as previsões econômicas para os próximos anos no Brasil se deterioraram.

“De novembro para cá, as expectativas começaram a se deteriorar, tanto para 2025 quanto 2026.”

No dia anterior, em fala no mesmo evento, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pediu a Campos Neto uma redução das taxas de juros no Brasil.

Diante do presidente do BC, que estava na plateia da conferência, Pacheco afirmou haver um “consenso” entre o governo federal, o Congresso Nacional e empresários de que a taxa de juros precisa baixar.

“Não conseguiremos crescer o Brasil com taxa de juros a 13,75%. Temos um novo governo com uma forma de pensar o país, um Congresso que tem suas perspectivas. Há divergências no meio empresarial. Mas se há algo que nos une é o desejo de reduzir a taxa de juros no Brasil”, disse.

“Nós aprovamos a autonomia do Banco Central, que foi fundamental. Mas a perspectiva dessa autonomia é para que o BC não fosse suscetível a interferências indevidas. Há um sentimento de que precisamos encontrar caminhos para a redução imediata da taxa de juros.”

Segundo Pacheco, a redução dos juros “é o desejo do Congresso, da economia e do setor produtivo, junto com o arcabouço fiscal.”

O que é a taxa Selic?

A taxa Selic (sigla para Sistema Especial de Liquidação e de Custódia) serve como referência para todas as taxas de juros do mercado brasileiro e é definida pelo Copom, grupo composto pelo presidente e diretores do Banco Central. Eles se reúnem para definir a trajetória da Selic.

A Selic é o principal instrumento de política monetária usado pelo Banco Central para controlar a inflação.

Quando a taxa sobe, os juros cobrados em financiamentos, empréstimos e no cartão ficam mais altos e isso desencoraja o consumo — o que, por sua vez, estimula uma queda na inflação. Por outro lado, se a inflação está baixa e o BC reduz os juros, isso barateia os empréstimos e incentiva o consumo.

Para definir o que fazer com a Selic, o BC avalia as condições da inflação, da atividade econômica, das contas públicas e o cenário externo — sempre com o objetivo de manter a inflação dentro da meta.

O instrumento é usado por todos os governos e autoridades monetárias. O Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, define os juros básicos da economia americana. O Banco Central Europeu faz o mesmo com os juros nos países que compõem a zona do euro.

No Brasil, o mais recente ciclo de alta começou em 17 de março de 2021. Desde então, a Selic subiu 12 vezes consecutivamente, de 2% para 13,75%, patamar atingido em agosto do ano passado. Desde então, permanece inalterada. É o nível mais alto desde 2016, quando a taxa começou o ano em 14%.