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Infecção de células de gordura contribui para agravamento da Covid-19, sugere estudo brasileiro

Embora a Covid-19 esteja a apenas um mês de completar três anos desde que provocou os primeiros surtos na cidade chinesa de Wuhan, muito ainda não se sabe em relação ao vírus. Por isso, o patógeno continua alvo de diversos esforços em instituições científicas por todo o mundo, inclusive no Brasil.

Recentemente, uma dessas pesquisas, publicada na revista científica Nature Communications, constatou que o coronavírus infecta as células de gordura do corpo humano, e que isso pode ter implicações diretas no agravamento do quadro causado pela doença – indicando um dos motivos pelos quais pessoas com obesidade são mais suscetíveis a hospitalizações e óbitos.

O estudo teve início com a descoberta inédita por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em julho de 2020, de que o Sars-Cov-2, vírus causador da Covid-19, era capaz de infectar o tecido adiposo, e que as células de gordura atuam como um reservatório para o vírus.

Com isso, a equipe da Unicamp se juntou a cientistas da Universidade de São Paulo (USP) para avaliar os impactos da contaminação de diferentes células adiposas. Isso porque a gordura no corpo humano é dividida principalmente entre visceral – a que fica alojada entre os órgãos e é considerada um fator de risco alto para doenças cardiovasculares – e a gordura subcutânea, localizada abaixo da pele, mais fácil de ser observada.

Uma das maneiras de diferenciar ambos os tipos é que a visceral é mais rígida, portanto mais difícil de ser eliminada, e dá a aparência de uma gordura “dura”. Já a subcutânea é responsável pela grande maioria das células adiposas do corpo, e tem a aparência “mole”, como os famosos “pneus”, sendo mais aparente.

Para avaliar as diferenças, primeiro eles obtiveram 47 amostras de gordura da região torácica de pacientes que morreram no Hospital das Clínicas da USP de Ribeirão Preto. Em laboratório, constataram a presença do material genético do Sars-CoV-2 em 23 unidades, 49%, o que confirmou a infecção dos tecidos adiposos.

Em seguida, os cientistas coletaram células de gordura de três doadores que haviam passado, antes da pandemia, por uma cirurgia abdominal no Hospital das Clínicas da Unicamp. Eles expuseram então o material ao vírus, e detectaram 240 vezes mais RNA do Sars-Cov-2 e 770 vezes mais partículas infectantes nas células da gordura visceral, quando comparado às da gordura subcutânea.

“Foi possível observar que o adipócito visceral é mais suscetível à infecção pelo SARS-CoV-2, pois a carga viral aumenta bem mais nesse tipo de célula de gordura do que no adipócito subcutâneo. Acreditamos que isso se deve, principalmente, à maior presença da proteína ACE-2 (à qual o vírus se conecta para invadir a célula) na superfície celular”, explica o professor do Instituto de Biologia da Unicamp Marcelo Mori, um dos líderes da pesquisa, à Agência Fapesp.

Além disso, os cientistas explicam que a maior quantidade de células infectadas está associada a uma maior produção de citocinas, moléculas inflamatórias importantes para ativar o sistema imune, mas que em excesso provocam quadros graves de inflamação nos tecidos. Mori destaca que o evento chamado de tempestade de citocinas atua como um importante gatilho na progressão para o quadro grave da Covid-19.

“A gordura visceral é uma fonte importante de produção de citocinas, mas, quando o vírus infecta esse tecido, há produção ainda maior, o que pode gerar uma inflamação ainda mais alta”, esclarece em comunicado da Unicamp.

Por outro lado, no tecido adiposo subcutâneo, a equipe percebeu que a contaminação pelo vírus provocou uma diminuição de um processo de quebra dos lipídios em ácidos graxos chamado de lipólise. Isso pode ter um efeito negativo para o microrganismo, acredita Mori, uma vez que ele precisa dessa quebra para se replicar.

“Nossa hipótese é que isso representa uma resposta celular antiviral. Há estudos mostrando que a inibição da lipólise diminui a capacidade replicativa do Sars-CoV-2, o que pode ser explicado pelo fato de o vírus precisar de lipídeos para produzir seu envelope (camada mais externa que protege o material genético) e, além disso, demandar energia da célula para fazer cópias de seu material genético”, explica Mori à Fapesp.

Além dos pesquisadores da Unicamp e da USP, o estudo contou com a participação de profissionais do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio-CNPEM), do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor). O trabalho recebeu financiamento do Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp – SP).

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Fonte: Folha PE

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