• Sarah Smith e Max Matza
  • Da BBC News em Washington

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Trump em discurso que antecedeu invasão do Congresso americano no início de 2021

O ex-presidente americano Donald Trump e parte de seus apoiadores no Partido Republicano são uma ameaça à democracia, disse o presidente dos EUA, Joe Biden (Partido Democrata), que vem endurecendo as críticas contra seu rival em meio a uma melhora de seus índices de aprovação.

“As forças do Maga estão determinadas a levar este país para trás”, disse Biden em um discurso televisionado no horário nobre. Maga é uma referência ao slogan de campanha de Trump “Make America Great Again” (‘Tornar a América grande novamente’), que se tornou uma espécie de ideologia conhecida pela sigla Maga.

Biden disse que não estava condenando todos os 74 milhões de americanos que votaram em Trump na eleição de 2020. “Nem todos os republicanos, nem mesmo a maioria dos republicanos, são republicanos ligados ao Maga”, afirmou o presidente.

“Mas não há dúvida”, continuou Biden, “de que o Partido Republicano hoje é dominado, dirigido e intimidado por Donald Trump e pelos republicanos do Maga. E isso é uma ameaça a este país”.

Biden disse que os apoiadores de Trump viam a multidão que invadiu o Capitólio dos EUA no ano passado como patriotas, e não pessoas que fizeram uma insurreição contra o país. A invasão à sede do Congresso americano, que deixou cinco mortos, tentou impedir a oficialização da vitória de Biden contra Trump sob alegações sem prova de fraude eleitoral. Para alguns especialistas, Trump tentou um golpe de Estado, mas fracassou.

Mais de 700 pessoas foram presas e indiciadas por crimes como invasão e destruição de propriedade pública e lesão corporal a policiais. Manifestantes inclusive gritavam “enforquem Mike Pence”, enquanto o então vice-presidente e sua família eram levados para um esconderijo seguro no prédio. Cerca de 70 já foram julgadas e quase metade delas cumprem pena em cadeias pelo país.

As contestações ao resultado eleitoral e os ataques ao sistema político americano não pararam por ali. Atualmente, mais de 30 milhões de americanos ainda dizem que a eleição de 2020 foi vencida por Trump, que pretende disputar o cargo novamente em 2024.

Crédito, Reuters

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Para Biden, Trump e parte de seus apoiadores são uma ameaça à democracia americana

Biden, filiado ao Partido Democrata, fez seu discurso contra Trump no Independence Hall, na Filadélfia, onde a Declaração de Independência dos EUA foi assinada em 1776. Em 2020, o tema da campanha de Biden era restaurar a “alma da América”.

“Durante muito tempo”, disse Biden, “dissemos a nós mesmos que a democracia americana estava garantida. Mas não está. Temos que defendê-la. Protegê-la. Defendê-la. Cada um de nós.”

Em resposta ao discurso de Biden, o líder da minoria na Câmara dos Representantes e um dos principais nomes do Partido Republicano, Kevin McCarthy, afirmou que Biden “feriu gravemente a alma da América”.

Para McCarthy, Biden “escolheu dividir, rebaixar e menosprezar seus compatriotas americanos” simplesmente “porque eles discordam das políticas dele”. O republicano exigiu que o democrata se desculpasse por “caluniar dezenas de milhões de americanos como fascistas”.

Trump, por sua vez, postou uma defesa de seu slogan Maga e disse que seu rival “ameaçou a América”. “Se ele não quer tornar a América grande novamente, o que por meio de palavras, ação e pensamento ele mostra que não quer, então ele certamente não deveria estar representando os Estados Unidos da América”, escreveu o ex-presidente.

Durante todo o discurso de Biden, alguém foi ouvido interpelando o presidente por meio de um megafone. Biden citou a interrupção duas vezes, dizendo na segunda vez: “Eles têm o direito de serem ultrajantes. Isso é uma democracia”.

Embate cada vez mais acirrado nos EUA

O presidente, que assumiu o cargo prometendo unir o país, endureceu sua retórica contra Trump e seus apoiadores (tanto políticos quanto eleitores).

Na semana passada, Biden comparou o que chamou de republicanos “extremistas” e “semi-fascismo”.

O acirramento dos embates entre democratas e republicanos se ampliam a dois meses das eleições de meio de mandato, que decidirão o equilíbrio de poder em Washington.

Atualmente, o Partido Democrata tem ampla maioria na Câmara dos Representantes, mas uma maioria frágil no Senado. Ambas as maiorias podem ser perdidas para o Partido Republicano em novembro deste ano, o que se tornaria um grande obstáculo para os democratas avançarem com suas propostas.

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Republicano Kevin McCarthy afirma que governo Biden tem afundado o país

Biden e o Partido Democrata têm conseguido implementar propostas importantes da campanha de 2020, como um programa de quase R$ 2 trilhões para combater as mudanças climáticas e uma bilionária redução da dívida de estudantes universitários nos EUA.

Por outro lado, em seu discurso na cidade natal de Biden, Scranton, o republicano Kevin McCarthy disse que a presidência de Biden afundou os EUA com inflação crescente, fronteiras abertas, fechamento de escolas por causa da covid, a saída “malfeita” do Afeganistão e a mais alta onda de crimes no país em duas décadas.

Em meio à troca de acusações, eleitores ouvidos pela BBC na pequena cidade de Newfoundland, a 190km de onde o presidente Biden falou, não pareciam preocupados com uma suposta ameaça à democracia.

O preço da gasolina foi a principal preocupação dos americanos ouvidos pela reportagem. Vários eleitores contrastaram diretamente a economia sob o presidente Trump com a situação atual.

Mas um dos eleitores entrevistados, que disse ser eleitor republicano ao longo da vida, disse que nunca votaria em Trump ou em qualquer um dos candidatos que o ex-presidente tenha endossado.

O nome de Trump não estará em nenhuma cédula de votação em novembro deste ano, mas sua influência está presente na disputa.

Trump será a atração principal de um rali na área de Scranton neste fim de semana. Vários dos candidatos republicanos neste Estado da Pensilvânia ganharam suas indicações graças ao apoio do ex-presidente.

Análise

Anthony Zurcher, correspondente da BBC na América do Norte

Pela primeira vez em quase um ano, a sorte política do presidente Joe Biden parece estar melhorando. Seus índices de aprovação se recuperaram de francamente desastrosos para apenas ruins.

Além disso, as batalhas presidenciais de Biden não parecem estar se traduzindo em veneno nas urna para seus colegas de partido. Repetidas vezes nos últimos meses, os democratas tiveram desempenho superior em confrontos diretos com os republicanos.

Biden tem sido frequentemente um espectador dessa reversão da sorte – por causa de sua recente infecção por covid e dos limites inerentes ao poder presidencial – mas tirar o crédito por boas notícias fora do controle nunca foi problema para políticos.

O discurso de quinta-feira (02/09) contra Trump trata-se tanto sobre estabelecer as condições para obter crédito se as coisas continuarem indo bem quanto para destacar as ameaças à democracia americana ou para enquadrar o debate para as campanhas eleitorais de médio prazo.

E se as coisas derem errado mais uma vez, ele seria considerado culpado de qualquer jeito mesmo.

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