- James Waterhouse
- Correspondente da BBC na Ucrânia
Um novo sistema criado para ajudar soldados russos que desejam se render está recebendo até 100 pedidos por dia, segundo o governo ucraniano.
O projeto “I Want To Live” (“Eu Quero Viver”, em tradução livre para o português) foi lançado em setembro.
Ao ligar para uma linha telefônica direta ou enviar os dados por meio de aplicativos de mensagens, militares russos são auxiliados sobre como eles podem encontrar a melhor maneira de se render às forças ucranianas.
Autoridades em Kiev dizem ter recebido mais de 3,5 mil contatos de invasores, bem como de suas famílias.
A procura pelo serviço aumentou nos últimos meses quando o presidente russo, Vladimir Putin, mobilizou centenas de milhares de homens do país para a guerra e desde que a cidade de Kherson foi libertada do controle de Moscou.
A BBC recebeu gravações de algumas das ligações telefônicas..
Como já indicam os corredores escuros, a sede do Serviço de Tratamento de Prisioneiros de Guerra na Ucrânia não é imune aos apagões de energia que assolam o país.
Em um pequeno escritório, encontramos Svitlana (nome fictício), uma atendente ucraniana que fala diariamente com soldados russos.
Eles podem entrar em contato por telefone ou por meio da maioria dos aplicativos de mensagens, como Telegram e WhatsApp.
Ela explica que as noites são mais movimentadas, pois é quando os soldados têm mais tempo livre, podem escapar da supervisão dos superiores e fazer uma ligação.
“Geralmente, ouvimos uma voz masculina”, explica ela. “Muitas vezes é meio desesperada, meio frustrada, porque eles não entendem completamente como a linha direta funciona ou se é apenas uma armação.”
“Também há curiosidade, porque muitos ligam não para se render, mas para saber como poderiam, se necessário. É diferente a cada vez.”
Svitlana não tem permissão para nos dizer quantos russos ela já ajudou, ou exatamente como isso aconteceu. Os militares apenas são instruídos a compartilhar a localização antes de receberem mais instruções.
Alguns soldados russos também entram em contato para fazer provocações, relata Svitlana, embora ela não ache que todos acreditem nas alegações infundadas do Kremlin de que a Ucrânia é governada por nazistas.
“Não podemos julgar um país inteiro”, diz. “A maioria deles está preocupada com as próprias vidas.”
Svitlana também se lembra de uma ligação de um homem que vivia na Crimeia ocupada e foi mobilizado para lutar contra sua própria família e país.
Parece que Moscou agora bloqueou os números de telefone do serviço ucraniano dentro da Rússia. Ligações de chips do Reino Unido ou da Rússia passaram a ouvir uma mensagem de erro.
“Faça a si mesmo a seguinte pergunta: pelo que você está lutando?”, questiona a narração dramática no vídeo de propaganda do projeto “Eu Quero Viver” dirigido aos soldados russos.
Explosões aparecem em sincronia com uma música evocativa. Há imagens de soldados russos aparentemente se rendendo antes de dois números de telefone serem mostrados no final.
Eles até são instruídos a acenar com uma bandeira branca se estiverem muito perto da linha de frente.
Isso, claro, faz parte da guerra de informação e mostra a anatomia das tentativas da Ucrânia de enfraquecer o moral russo.
Nas paredes do escritório de Svitlana há fotos de prisioneiros de guerra ucranianos. Acredita-se que todos ainda estejam vivos, e esta linha direta é fundamental para os esforços de Kiev de trazê-los de volta para casa.
Uma vez que eles se rendem, os prisioneiros de guerra russos podem ser usados como moeda em futuras trocas.
De acordo com o Instituto para o Estudo da Guerra, dos Estados Unidos, o Kremlin também está realizando mais trocas de prisioneiros de guerra enquanto tenta acalmar os críticos dentro da Rússia.
Acredita-se que ambos os lados tenham milhares de prisioneiros de guerra, mas os números exatos não são claros.
“Queremos atingir especialmente os parcialmente mobilizados, que não apenas não podem lutar, mas são usados como bucha de canhão”, diz Vitalii Matviyenko, que lidera o serviço ucraniano.
“Este projeto foi criado para que as vidas deles sejam garantidas se esses indivíduos se renderem voluntariamente.”
Para a Ucrânia, que está em menor número no embate, também se espera que o esforço desmobilize as forças do invasor.
Reportagem adicional de Daria Sipigina, Hanna Chornous e Moose Campbell.
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