A agência de energia atômica da ONU lançou um apelo para a criação de uma zona desmilitarizada em torno do complexo nuclear de Zaporizhzhia, ocupado pela Rússia, na Ucrânia.
“Embora o bombardeio em curso ainda não tenha desencadeado uma emergência nuclear, continua a representar uma ameaça constante à segurança e à proteção nuclear com impacto potencial em funções críticas de segurança que podem levar a consequências radiológicas com grande importância em termos de segurança”, diz a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) em seu último relatório.
Os especialistas encontraram grandes danos na usina nuclear, que está no front da guerra na Ucrânia.
“A AIEA ainda está seriamente preocupada com a situação na ZNPP (acrônimo em inglês para usina nuclear de Zaporizhzhia) — isso não mudou”, acrescenta o relatório.
Mas, afinal, como os combates podem danificar a usina e quão grave seria um acidente nuclear no local?
O que está acontecendo na usina nuclear?
A Rússia tomou a usina nuclear de Zaporizhzhia no início de março, na segunda semana de sua invasão da Ucrânia.
Os combates entre forças ucranianas e russas se aproximaram da usina, que fica perto da cidade de Enerhodar, e um dos prédios do complexo pegou fogo, causando preocupação em toda a Europa.
A usina tem seis reatores de água pressurizada e vários depósitos de resíduo nuclear radioativo.
Na época, um ucraniano membro da equipe alegou que a usina estava sendo “bombardeada diretamente” e um dos reatores foi danificado.
O incêndio no complexo acabou sendo apagado, mas o incidente foi seguido por uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU — e o bombardeio da usina foi condenado internacionalmente.
A Rússia respondeu alegando que “sabotadores ucranianos” causaram o incêndio.
Desde meados de julho, as preocupações com a segurança da usina de Zaporizhzhia aumentaram, quando as forças russas foram acusadas de efetuar disparos a partir de áreas próximas à instalação.
A agência nuclear da Ucrânia afirma que foguetes russos danificaram parte da usina; a Rússia, por sua vez, acusa as forças de Kyiv de disparar contra o complexo.
Em diversos momentos, a usina acabou tendo cortado seu acesso a fontes externas de abastecimento — cruciais para o funcionamento seguro.
Qual é o pior cenário possível?
O risco mais óbvio de um dos reatores ser atingido por um projétil ou foguete é que pode danificar as barreiras externas de contenção. Os reatores são projetados para suportar uma certa quantidade de pressão externa ou dano, mas não o impacto direto de munições pesadas.
Se o escudo ou o sistema de resfriamento de um reator estiver danificado, é provável que ocorra um vazamento de radiação. Há também o risco de uma explosão nuclear ou de hidrogênio.
“Se um foguete atingir um dos reatores, o vazamento de radiação subsequente terá consequências para a Europa, para a Crimeia [anexada pela Rússia] e, claro, para toda a Ucrânia”, disse Olha Kosharna, especialista independente em energia nuclear ucraniana, antes do lançamento do relatório da AIEA.
Já o físico russo Andrey Ozharovsky, especialista na eliminação segura de resíduos nucleares, afirmou que se um acidente ocorresse na usina de Zaporizhzhia, causaria a liberação de grandes quantidades de césio-137 radioativo, um subproduto da fissão nuclear, conhecido por sua capacidade de viajar longas distâncias pelo ar.
A dispersão do césio-137 teria consequências potencialmente desastrosas para a saúde humana — e também poderia causar contaminação de terras agrícolas, o que afetaria as colheitas nos próximos anos.
Além disso, dependendo do clima e da direção e da força do vento, países mais distantes podem ser afetados.
Além dos reatores, as instalações de armazenamento de resíduo nuclear da usina de Zaporizhzhia também representam um risco. Se forem atingidas por um foguete ou bombardeadas, intencionalmente ou por acidente, isso teria consequências perigosas, segundo especialistas nucleares.
O que a comunidade internacional pode fazer?
Atacar usinas nucleares é proibido pelas Convenções de Genebra. De acordo com o Protocolo 1 adicional às Convenções de 1949, barragens, diques e usinas nucleares não devem ser alvo de ataque se perdas civis “graves” podem resultar de inundações ou radioatividade.
No entanto, uma usina de energia pode se tornar um alvo legítimo de um ataque se for usada para fins militares, em vez de civis.
Regulamentos semelhantes se aplicam a alvos militares situados próximos a outros tipos de infraestrutura perigosa.
A Ucrânia pediu anteriormente para a comunidade internacional “fechar os céus” sobre a usina de Zaporizhzhia — ou seja, fornecer defesas aéreas capazes de impedir qualquer ataque direto à instalação.
Mas parece improvável que isso aconteça, uma vez que os países que apoiam a Ucrânia temem que o ato possa ser interpretado pela Rússia como envolvimento direto no conflito.
Texto adaptado a partir de reportagem anterior de Artem Voronin.
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