- Author, Daniel Pardo
- Role, Correspondente da BBC News Mundo no México
“Estão procurando ele em todos os lugares, mas o homem sequer está escondido”, diz a letra de uma música do conjunto Los Tucanes em homenagem a Ismael “El Mayo” Zambada.
O famoso traficante de 76 anos, um dos três fundadores e até hoje líder do cartel de Sinaloa, foi preso na quinta-feira (25/7) por autoridades americanas em El Paso, cidade no Estado americano do Texas.
Também foi preso Joaquín Guzmán López, filho de 36 anos do famoso Chapo Guzmán, condenado à prisão perpétua nos EUA — outro dos fundadores do Sinaloa, uma das maiores operações de tráfico de drogas do mundo.
As prisões são um golpe inédito para dois dos traficantes mais procurados do mundo, acusados de extorsão, corrupção, tráfico de narcóticos e lavagem de dinheiro.
É também um golpe em um dos símbolos do tráfico — El Mayo, também conhecido como “O Homem do Sombreiro”, que no passado inspirou admiração, músicas, histórias, além de casos de mortos e de corrupção ao longo de quatro décadas de trajetória.
A música dos Los Tucanes, que tem 10 milhões de visualizações no YouTube, segue: “A lei quer pará-lo, os contras querem matá-lo, mas ninguém conseguiu, o diabo aparece para eles”.
Mas o mito de El Mayo agora já não pode se gabar de uma grande façanha: a de que ele nunca havia sido preso.
A prisão
Em fevereiro, Zambada foi indiciado por promotores americanos por conspiração para produzir e distribuir fentanil, uma droga mais poderosa que heroína, considerada principal fator da crise de opioides dos EUA.
Os detalhes da prisão de ambos traficantes não foram divulgados. Mas aparentemente ambos viajaram de avião aos EUA.
Citando fontes oficiais no México e nos EUA, o jornal americano Wall Street Journal noticiou que Zambada teria sido enganado por um funcionário de alto escalão do cartel de Sinaloa, que estaria cooperando com autoridades americanas como o FBI.
Segundo o jornal, El Mayo acreditava que estava embarcando no avião para supervisionar campos de pouso clandestinos no sul do México. Mas o avião tomou rumo dos Estados Unidos e pousou em El Paso, no Texas.
O jornal New York Times diz que foi Joaquín Guzmán López quem enganou Zambada. O filho de El Chapo teria ajudado a prender o traficante e se entregado. Segundo a Fox News, ele culpava Mayo pela captura de seu pai.
Em uma nota na quinta-feira (25/7), o procurador-geral dos EUA, Merrick Garland, disse que os dois homens “lideram uma das organizações mais violentas e poderosas de tráfico de drogas do mundo”.
“O fentanil é a maior ameaça mortal por drogas que nosso país já enfrentou, e o Departamento de Justiça não vai descansar até que todos os líderes de carteis, integrantes e associados responsáveis por envenenar nossas comunidades sejam responsabilizados”, disse.
Segundo promotores americanos, o cartel de Sinaloa é o maior fornecedor de drogas para os EUA.
As autoridades americanas ofereciam US$ 15 milhões pela captura de Zambada.
Durante o julgamento de El Chapo em 2019, advogados de defesa do traficante disseram que Zambada havia subornado “todo” o governo mexicano em troca de sua liberdade.
“Na verdade, [Guzmán] não controlava nada”, disse o advogado de Chapo na ocasião. “Era Mayo Zambada quem controlava.”
Além de indiciamentos relacionados ao fentanil, ele também está sendo acusado de tráfico de drogas, assassinato, sequestro, lavagem de dinheiro e crime organizado.
Em maio, o sobrinho de Zambada — Eliseo Imperial Castro, conhecido como “Cheyo Antrax” — foi morto em uma emboscada no México. Ele também era procurado por autoridades dos EUA.
Zambada é um dos maiores traficantes do mundo. Ele nunca havia sido preso. Sua prisão chocou muitos no México.
De traficante a líder
A ascensão de Mayo de “soldado raso” a “chefe dos chefes”, como costumam chamá-lo, é uma história de pragmatismo, astúcia e corrupção.
Depois de um curto tempo como entregador de móveis nas ruas de Cuilacán, Zambada começou a trabalhar nos anos 1970 como traficante no cartel de Guadalajara, que foi pioneiro no comércio de ópio, maconha e — posteriormente — cocaína.
Em seguida, ele trabalhou no cartel de Juárez, primeiro como gerente em um patamar médio e depois como líder, cada vez mais próximo de Amado Carrillo, conhecido como “Senhor dos Céus”. Foi ali que ele teria criado sua rede de contatos na Colômbia, país onde fez grandes amigos e sócios produtores de cocaína.
Na medida em que outros chefes foram morrendo ou sendo capturados, Zambada foi se tornando mais poderoso. Ele raramente tinha problemas de traição com aliados.
Outra característica diferente dos demais chefes é que ele sempre se manteve discreto. Praticamente não se tem imagens dele. Há relatos de que ele fez algumas cirurgias para mudar de aparência. Sabe-se que ele tem 1,8 metro e que é grande e forte. Ele tem muitas mulheres e filhos.
Ele passou décadas mudando de lugar em regiões montanhosas do México. Era pouco comum dormir duas noites no mesmo lugar.
Empreendedor entre traficantes
Um de seus filhos, Vicente Zambada Niebla, foi detido pelas autoridades mexicanas em 2009. Seu diário escrito na prisão foi divulgado.
No documento e em depoimentos a autoridades americanas, o filho de Mayo Zambada contou que seu pai chegou a pagar US$ 1 milhão em propinas por mês. Ele também revelou que a rede de corrupção envolvia bancos e governos, e que ele tinha contatos no departamento americano de combate às drogas (DEA, na sigla em inglês).
Um dos motivos que Mayo Zambada virou uma espécie de mito no México é porque ele sempre foi preocupado em criar vínculos com as comunidades onde operava.
Ele era considerado um mecenas no vilarejo de El Álamo, sua terra natal, e em outras cidades da região de Sinaloa, financiando obras e festas públicas.
Além de ser mais discreto e estabelecer mais raízes sociais com as comunidades, El Mayo também era conhecido como um traficante que pouco traficava. Mais do que trabalhar na exportação de drogas, ele criou uma rede para lavagem de dinheiro que era gerenciada pelas mulheres de sua família.
Acredita-se que ele chegou a lavar bilhões de dólares para o cartel.
O departamento do Tesouro dos Estados Unidos atribui a ele a propriedade de grandes empresas de construção, leite e serviços.
Um dos herdeiros de El Chapo
Sobre Joaquín Guzmán López, o filho de El Chapo que foi preso junto com Mayo, não se sabe muitos detalhes de sua vida.
O homem de 38 anos, conhecido como El Güero, é filho de Chapo e de Griselda López Pérez, a segunda esposa do narcotraficante. Seu papel na organização é tido como secundário ao de seu irmão Ovidio.
Com o tempo, foi se descobrindo mais negócios envolvendo Joaquín.
Em 2015, ele esteve implicado na operação que permitiu a fuga de El Chapo de uma prisão.
Fonte: BBC
Você precisa fazer login para comentar.