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Legenda da foto, Há muitas especulações sobre futuro do presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa

O partido do Congresso Nacional Africano (ANC), que governa a África do Sul, foi um dos grandes derrotados das eleições realizadas nesta semana, segundo a apuração de quase todos os votos divulgada neste sábado (1/6).

Apesar de conquistar 40% dos votos, o ANC perdeu a maioria que possuía no parlamento sul-africano pela primeira vez em 30 anos. Este foi o pior resultado eleitoral do partido de Nelson Mandela desde a sua grandiosa vitória de 1994, após o fim do sistema racista do apartheid.

O resultado eleitoral é um duro golpe para o presidente Cyril Ramaphosa e o seu partido. Muitos especialistas previam que o partido chegaria perto de 50% e, na pior das hipóteses, perto de 45%. Na eleição anterior, o partido havia conquistado 58% dos votos.

Com 97% dos distritos eleitorais já com resultados declarados, o ANC está com 40% das cadeiras. Os sul-africanos foram às urnas na quarta-feira (29/5). O resultado final deve ser divulgado no domingo (2/6).

Analistas dizem que muitos eleitores culpam o ANC por elevados níveis de corrupção, criminalidade e desemprego no país.

O que acontece agora?

O ANC será forçado a formar uma coligação, inaugurando uma nova era para a política sul-africana. Analistas dizem que a escolha do parceiro de coalizão terá enorme impacto na direção futura da África do Sul.

As suas opções são o Aliança Democrática (DA), que está em segundo lugar na apuração dos votos, com 22%, o partido uMkhonto we Sizwe (MK) liderado pelo ex-presidente Jacob Zuma, com 15%, ou os radicais Combatentes pela Liberdade Económica (EFF) com 9%.

A liderança do ANC já começou a realizar consultas internas para se preparar para negociações complexas de formação de coligação.

O partido MK, liderado por Zuma, disse que não formará coalizão com o ANC enquanto Ramaphosa continuar como seu líder. Ramaphosa substituiu Zuma como presidente e líder do ANC, após uma disputa ferrenha pelo poder em 2018.

A Aliança Democrática, um partido com uma forte política pró-mercado livre, ficou em segundo lugar e poderia ser uma alternativa para o ANC. Mas existe resistência dentro do partido à uma coligação com a DA por causa da sua agenda e da sua reputação como partido da minoria branca.

O presidente do ANC, Gwede Mantashe, disse que é improvável que o seu partido forme uma aliança com a DA.

Ele disse que precisaria haver “alinhamento político” entre os partidos para formar um acordo de coalizão.

Tanto a EFF como o MK defendem a apreensão de terras pertencentes a brancos e a nacionalização das minas do país.

Os eleitores do MK celebraram durante a noite em Durban, o maior reduto do partido, na província de KwaZulu-Natal. O partido só recém-formado em dezembro.

Não está claro se o presidente Cyril Ramaphosa permanecerá no poder. Neste sábado, havia especulações de que ele poderia renunciar.

“O ANC pode transformá-lo num bode expiatório, e grupos dentro do partido podem fazer pressão para que ele seja substituído pelo seu vice, Paul Mashatile. A EFF e o MK também provavelmente exigirão sua demissão antes de concordarem com qualquer coligação com o ANC”, disse o professor William Gumede, presidente da organização sem fins lucrativos Democracy Works Foundation, à BBC antes da divulgação dos resultados.

Um analista disse à BBC que outra alternativa para o ANC seria fazer um convite para negociações com os partidos da oposição.

Os sul-africanos não votam diretamente para presidente. Em vez disso, elegem os membros do parlamento que escolherão o presidente.

Os resultados mostraram que o ANC sofreu pesadas perdas para o MK, especialmente em KwaZulu-Natal, onde o partido de Zuma lidera com 43% dos votos contra 21% do ANC.

Zuma causou uma grande surpresa ao anunciar, em dezembro, que estava abandonando o ANC para fazer campanha pelo MK.

KwaZulu-Natal é a região natal de Zuma e a província com o segundo maior número de votos, o que a tornou crucial para determinar se o ANC manteria a sua maioria parlamentar.

Embora Zuma tenha sido impedido de concorrer ao parlamento devido a uma condenação por desacato ao tribunal, o nome dele ainda apareceu no boletim de voto como líder do MK.

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Legenda da foto, As filas, como esta em Joanesburgo, lembram a votação de 1994 na África do Sul

Longas filas

Um responsável eleitoral em Joanesburgo disse à BBC que as filas do pleito deste ano lembravam as históricas eleições de 1994, quando os negros puderam votar pela primeira vez.

Sifiso Buthelezi, que votou no Joubert Park de Joanesburgo – o maior colégio eleitoral da África do Sul – disse à BBC: “A liberdade é ótima, mas precisamos combater a corrupção.”

A mudança tem sido um sentimento recorrente, especialmente entre os eleitores mais jovens.

“A participação entre eles foi elevada e votaram contra o ANC”, diz o professor Gumede.

Ayanda Hlekwane, membro da chamada geração “nascida livre” da África do Sul, o que significa que nasceu depois de 1994, disse que, apesar de ter três diplomas, ainda não tem um emprego.

“Estou trabalhando na minha proposta de doutorado para poder voltar a estudar caso não consiga um emprego”, disse ele à BBC em Durban.

Mas Hlekwane disse estar otimista quanto à possibilidade de as coisas mudarem.

O apoio ao ANC é maior entre a geração mais velha.

Uma mulher de 89 anos, Elayne Dykman, disse à BBC que espera que os jovens na África do Sul não considerem o voto dela como garantido.

Concorreram um recorde de 70 partidos e 11 independentes, com os sul-africanos votando num novo parlamento e em nove legislaturas provinciais.

O DA assinou um pacto com dez deles, concordando em formar um governo de coligação se obtiverem votos suficientes para tirar o ANC do poder.