Dali, ele seguiu na direção do mar – amplo, quente e profundo. Até chegar ao Recife, fim da viagem, destino, cidade que escolheu para viver. Trouxe, na bagagem, a memória de muitos sabores. “Bode assado e guisado com pirão; carne de sol, farofa de bolão, macaxeira; carne de charque no arrumadinho; fava e sarapatel; buchada” assim escreveu. E, aqui, aprendeu a gostar de “camarão de qualquer jeito, pirão de peixe, pitu”. Também doce de leite (liso ou cortado), doces de todas as nossas frutas, acompanhados de queijo de coalho ou de manteiga, bolo de rolo. Receitas simples e preparadas, quase sempre, por “Mãe Euza”. Temperadas com muito afeto. Até porque cozinhar é, sobretudo, um gesto de amor.
Todos esses sabores ele guardará na memória para sempre. O acompanhará a vida toda, como uma sombra. Porque, como ensina Gilberto Freyre, é na infância, esse período mágico de nossas vidas, que “as preferências do paladar são formadas e condicionadas”. Tanto que as receitas de mães, e avós, quando provadas novamente na idade adulta, despertam saudades. Têm o poder de nos levar de volta a um passado perdido e distante e de nos colocar no aconchego do colo de quem já não está mais entre nós. Olfato e paladar têm esse poder de “convocar o passado”, segundo Proust. Um passado hoje no presente. A infância devolvida à idade adulta.
Agora, por determinação médica, Américo não poderá provar alguns de nossos sabores pernambucanos. Só por algum tempo. Mas não desiste. E pede socorro. “Devolvam minha comida pernambucana. A vida perdeu a graça sem ela, piedade, meu Deus. Ela é boa e essencial por sua visível sensualidade aos olhos e paladar de qualquer cristão, novo ou velho!” Paciência, amigo. Mais importante, agora, é sua saúde. E desde já prometo, em breve, uma mesa com tudo que você tem direito.
RECEITA: BUCHADA
INGREDIENTES:
Bucho, língua, miúdos (coração, fígado, rins, sangue), mocotó, tripas e cabeça de carneiro ou de bode.
Limão
Vinagre
Sal e pimenta-do-reino
6 cebolas
4 dentes de alho socado
6 tomates sem pele e sem semente
Coentro e cebolinho
2 pimentões
3 folhas de louro
4 colheres (de sopa) de banha de porco
PREPARO:
Lave bucho, língua, miúdos, mocotó, tripas e cabeça do animal em água corrente. Com uma faca, raspe a cabeça, aproveitando o crânio com os miolos. Esfregue limão e vinagre. Vire as tripas e raspe, uma por uma, passando também bastante limão e vinagre. Deixe repousar por meia hora. Lave tudo novamente com bastante água. Escalde todos estes ingredientes com água fervendo. Pique os miúdos. Tempere tudo com alho, sal e pimenta a gosto.
Faça refogado com metade das cebolas, do alho, dos tomates, do coentro, do cebolinho, dos pimentões, das folhas de louro, do vinagre e da banha. Junte os miúdos e deixe refogar bastante.
Encha o bucho do animal com o refogado dos miúdos, costure e reserve. Enrole as tripas nos mocotós. Coloque em uma panela grande, o restante das cebolas, alho, tomates, coentro, cebolinho, pimentão, folhas de louro e banha. Junte o bucho recheado, a língua, o mocotó e a cabeça. Acrescente água. Deixe cozinhar bastante por duas horas. Se necessário, junte mais água. Depois de pronto, use o caldo do cozimento para fazer um pirão mexido.
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Fonte: Folha PE
Autor: Letícia Cavalcante