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Como Steve Kerr, que perdeu pai em atentado no Líbano, se tornou voz ativa contra a violência armada

Mais do que comandar o multicampeão Golden State Warriors — que pode se classificar nesta quinta-feira às finais da NBA se vencer o Dallas Mavericks, às 22h (de Brasília) —, o técnico Steve Kerr chamou a atenção nos últimos dias pelo forte discurso da última terça-feira sobre o ataque a tiros na escola primária Robb, em Uvalde, no estado do Texas, que deixou 21 mortos, sendo 19 crianças.

— Nos últimos 10 dias, tivemos idosos negros mortos em um supermercado em Buffalo, tivemos fiéis asiáticos mortos no sul da Califórnia, agora temos crianças assassinadas na escola. Quando vamos fazer alguma coisa? Estou cansado. Estou cansado de subir aqui e dar condolências às famílias devastadas que estão lá fora… Estou cansado dos momentos de silêncio. Chega! — declarou, aos gritos, o técnico.

A fala potente pode até assustar quem está acostumado com a apatia dos atletas brasileiros, principalmente no futebol. Mas o discurso faz jus ao histórico de Kerr desde a formação.

Filho de Ann e Malcolm Kerr, dois ex-professores da Universidade Americana de Beirute (AUB), Steve Kerr nasceu no Líbano, foi para a Califórnia ainda criança, mas cresceu em diversos países do Oriente Médio, como Egito e Tunísia. Apaixonado por beisebol e basquete, como seu pai, foi um jovem competitivo e que, de vez em quando, precisava dos conselhos cuidadosos e das lições sábias de Malcolm para manter a tranquilidade e os pés no chão — perfil completamente diferente do que demonstra atualmente, sempre sereno, à beira das quadras da NBA.


 

Malcolm trabalhou na AUB por 40 anos. Por isso, foi nomeado para dirigir a universidade em março de 1982. Mesmo sabendo que era um cargo extremamente perigoso, por conta da guerra civil que assolava o Líbano, que estava no meio de um conflito entre Síria e Israel, ele aceitou o convite.

O trágico atentado

À época, Steve Kerr era estrela do time de basquete do seu colégio, na Califórnia. Em 1983, quando foi visitar o pai junto com o irmão Andrew e sua mãe, Steve levou um susto com uma explosão na pista de embarque. Mas esse não foi o maior baque que o futuro astro teria de lidar.

No meio de uma noite de janeiro de 1984, Kerr recebeu um telefonema de Vahe Simonian, um amigo da família e vice-presidente da AUB, que morava em Nova York. Na ligação, Simonian disse ao técnico que seu pai havia sido assassinado.

Em 18 de janeiro de 1984, Malcolm Kerr, à época com 52 anos, desceu do elevador em direção ao seu escritório no hall da universidade e foi baleado duas vezes na nuca. Os assassinos conseguiram escapar. Horas depois, um grupo que se autodenominava “Islamic Holy War” assumiu a autoria.

No obituário de Malcolm Kerr, Thomas L. Friedman, repórter do “New York Times” radicado no Beirute, escreveu: “Ele foi morto, seus amigos insistem, não por ser quem ele era, mas porque agora que os fuzileiros navais e a embaixada americana em Beirute estão totalmente protegidos pela segurança, (então) ele era o americano proeminente mais vulnerável no Líbano e um alvo escolhido para militantes que tentavam intimidar os americanos a sair.”

Trajetória e posicionamentos

Desde então, Kerr utiliza os ensinamentos do pai para fortalecer seu basquete. Como jogador da Universidade do Arizona, chegou a ouvir provocações sobre seu pai de torcedores rivais, que imitavam barulhos de tiro:

— Quando ouvi, deixei cair a bola e comecei a tremer. Eu sentei por um minuto. Admito que eles me pegaram. Tinha lágrimas nos meus olhos. Por um lado, trouxe de volta memórias do meu pai. Mas, por outro lado, era triste que as pessoas fizessem algo assim — recordou.

Como atleta, Steve Kerr foi peça importante do lendário Chicago Bulls de Michael Jordan, Scottie Pippen e Dennis Rodman — com direito a cesta no “clutch time” das finais de 1997 contra o Utah Jazz. Como técnico, é o comandante dos Warriors e também da seleção americana.

Há alguns anos, Kerr também virou o militante contra a facilidade com que a população americana tem para obter armas, além de outras temas, como racismo e homofobia. Em 2015, em jantar de comemoração do título da NBA com o presidente Barack Obama, o técnico elogiou o presidente por seus esforços em relação ao controle da posse de armas. No ano seguinte, criticou Jerry Brown, então governador da Califórnia, a quem chamou de louco, “por não adotar verificações de antecedentes mais rígidas sobre arma”.

Steve Kerr vem lutando pelo que acredita. Na última terça-feira, tomou conta do noticiário com o desabafo. Além do treinador, outras estrelas da NBA, como Jayson Tatum e Ime Udoka, do Boston Celtics, falaram sobre a tragédia.

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Fonte: Folha PE

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