- Author, André Biernath
- Role, Da BBC News Brasil em Londres
- Twitter, @andre_biernath
Todos os anos, o Kew Gardens — o Jardim Botânico de Londres, no Reino Unido — realiza um festival de orquídeas com um tema específico.
Na edição de 2024, os curadores do evento decidiram homenagear Madagascar. Os artistas usaram mais de 5 mil orquídeas e outros materiais orgânicos para criar esculturas, arcos e arranjos que ilustram a fauna e a flora desta ilha africana.
Ao lado de outros veículos de imprensa, a BBC News Brasil teve acesso à estufa onde as peças foram montadas antes da abertura da exposição para o público.
Na ocasião, cientistas responsáveis por cuidar e estudar essas plantas também compartilharam os fatos científicos mais curiosos sobre as orquídeas.
Uma dessas flores, por exemplo, serviu de inspiração (e provação) ao famoso naturalista inglês Charles Darwin.
Outra espécie desta mesma família fornece um dos condimentos mais apreciados da gastronomia: a baunilha.
E as orquídeas também podem ser os principais indicadores da saúde e do equilíbrio de um determinado ambiente.
Confira os detalhes sobre esses e outros fatos científicos curiosos sobre essas plantas ao longo desta reportagem.
Um grupo vasto e diverso
Ao lado das margaridas, as orquídeas integram uma das mais vastas famílias de plantas conhecidas pela ciência.
De acordo com estimativas divulgadas pelo Kew Gardens, já foram descritas mais de 25 mil espécies diferentes de orquídeas.
Elas crescem em todos os continentes, com exceção da Antártida.
A variedade delas também chama a atenção. As menores orquídeas do mundo, como a Platystele jungermannioides, têm apenas 3 milímetros de altura.
Já a maior (Vanilla planifolia) possui ramos que chegam até os 20 metros de extensão.
Já a orquídea-tigre, ou Grammatophyllum speciosum, possui hastes de flores com até 2 metros.
O agrônomo brasileiro Marcelo Sellaro, que trabalha no herbário do Kew Gardens, explicou que, apesar de cerca de 70% das espécies de orquídeas crescerem em árvores, elas não são consideradas parasitas.
Isso porque elas usam os troncos e galhos apenas como suporte e não extraem nenhuma seiva da árvore. Por essa razão, são descritas como plantas epífitas.
Outro fato curioso sobre as orquídeas mencionado por Sellaro tem a ver com a relação dessas plantas com os animais que fazem a polinização.
Cerca de 60% das espécies desta família “enganam” pequenos insetos, que são atraídos para as flores — embora os animais não encontrem ali nenhum tipo de recompensa, como o néctar.
Mesmo assim, ao interagirem com a flor da orquídea, os bichinhos saem das pétalas carregando o pólen, que é espalhado pelo ambiente e permite a reprodução dessas plantas.
Inspiração para Darwin
Um capítulo digno de nota na relação entre seres humanos e orquídeas envolve Darwin, o criador da Teoria da Evolução.
Em 1862, ele recebeu uma amostra da Angraecum sesquipedale, uma espécie de Madagascar que é conhecida popularmente como “orquídea-estrela” ou “orquídea de Darwin” — pelos motivos que você entenderá a seguir.
Essa flor de tonalidade branca e amarela possui uma característica marcante: na parte inferior, ela tem um tubo bem alongado, como é possível observar na imagem abaixo.
Ao analisar a espécie, Darwin especulou que deveria existir no habitat da planta algum inseto com uma probóscide (um tipo de língua) tão comprida a ponto de chegar até o fim do tubo e sugar o néctar que se acumula ali.
E isso, por sua vez, garantiria o espalhamento do pólen da Angraecum sesquipedale.
Mas havia um problema: na época em que Darwin fez essa presunção, nenhum animal com essas características havia sido observado em Madagascar.
Alguns especialistas chegaram a ridicularizar a hipótese do naturalista inglês.
No início do século 20, porém, a especulação sobre o “inseto linguarudo” virou realidade: exploradores identificaram a mariposa-falcão, que de fato possui as características descritas por Darwin.
Ela recebeu o nome científico de Xanthopan morganii praedicta — que em latim significa algo como “a mariposa prevista”, em alusão aos escritos de Darwin.
Um artigo publicado no site do Jardim Botânico de Nova York, nos EUA, lembra que o criador da Teoria da Evolução era um ávido pesquisador de orquídeas e chegou a escrever livros específicos sobre elas.
E a Angraecum sesquipedale acabou se tornando um exemplo perfeito de coevolução, que ocorre quando duas espécies — neste caso, orquídea e mariposa — interferem mutuamente nas habilidades de crescimento e adaptação.
Um raro condimento
Outro fato científico curioso relacionado às orquídeas é o fato de a baunilha ser extraída de uma planta que pertence a essa família.
A Vanilla planifolia tem um formato alongado e cresce de forma parecida a uma videira.
Ela é uma espécie típica do México, da América Central e da porção norte da América do Sul, mais especificamente a Colômbia.
A baunilha é extraída das vagens que nascem a partir da floração da planta. Esses frutos são secos e curados — o Kew Gardens pontua que os astecas foram os primeiros a usá-los como condimento, em preparações que também levavam o cacau.
Hoje em dia, as alterações do habitat tornaram a Vanilla planifolia uma espécie ameaçada de extinção — e boa parte do cultivo dela para consumo se concentra em locais onde essa orquídea foi introduzida por seres humanos, como regiões da África e da Ásia.
Ainda segundo o Kew, a baunilha é o segundo condimento mais caro do mundo, atrás apenas do açafrão.
O valor elevado se deve ao trabalho para o cultivo da espécie. Para ter ideia, fora dos locais de origem essa planta precisa ser polinizada à mão.
O ‘canário da mina’
Em entrevista à BBC News Brasil, a horticulturista botânica Solène Dequiret descreve as orquídeas como os “canários da mina” da conservação ambiental.
Esse termo faz alusão à prática de mineradores do século 19, que costumavam levar canários para as minas de carvão.
O animal era usado como um sinalizador de alerta — se ele morresse, havia fortes indícios da existência de gases tóxicos ou da falta de oxigênio naquele ambiente, e os trabalhadores saíam correndo da mina, antes de terem o mesmo fim do pobre passarinho.
Voltando às orquídeas, Dequiret destaca que elas são muito sensíveis — e também sinalizam um perigo premente.
“Elas são as primeiras espécies a desaparecer [quando um ambiente começa a ser degradado]”, resume a especialista, que é a supervisora do Conservatório Príncipe de Gales do Kew Gardens, onde o festival das orquídeas foi montado.
“Ou seja, elas são um bom indicador da saúde do ambiente em que vivem.”
O Kew Gardens estima que cerca de 50% das espécies de orquídeas do mundo estão sob risco de extinção por causa da destruição do habitat delas e das mudanças climáticas.
Fonte: BBC
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