Crédito, Alexandra Mazur/Universidade de Gotemburgo

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A embarcação R/V Nathaniel B. Palmer, usada pelos cientistas, fotografado de um drone na frente da geleira Thwaites em fevereiro de 2019

Com praticamente o tamanho do Estado do Paraná ou do Reino Unido, a geleira Thwaites da Antártida é alvo de um constante monitoramento — e um trabalho publicado no início de setembro mostra que o colapso de parte dessa estrutura gigantesca pode acontecer mais rápido do que se esperava.

Com o degelo completo desse colosso, o nível dos oceanos poderia subir entre 0,9 e 3 metros, projetam os cientistas.

E isso, por sua vez, pode representar uma ameaça para cerca 40% da população humana que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), vive em regiões costeiras ou zonas próximas do mar.

Para chegar a essas conclusões, um grupo de cientistas de vários países resolveu analisar o passado dessa geleira para projetar qual pode ser o futuro dela.

Mergulho gelado

O artigo, publicado no periódico Nature Geoscience, descreve em detalhes o trabalho de investigação feito por especialistas de diversas instituições dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Suécia.

Eles analisaram o assoalho do mar próximo à geleira e as formações geológicas que são encontradas ali.

Para isso, eles recorreram ao Rán, um robô motorizado laranja capaz de aguentar condições extremas de temperatura e pressão.

Crédito, Anna Wåhlin/Universidade de Gotemburgo

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O veículo autônomo Rán entre o gelo marinho na frente da Thwaites, após uma missão de 20 horas em que mapeou o fundo do mar

Durante uma expedição realizada em 2019, o equipamento ficou 20 horas coletando imagens e dados do solo oceânico que fica exatamente na frente da Thwaites e é conhecida em inglês como doomsday glacier (ou ‘geleira do fim do mundo’, em tradução livre).

Ao longo desse tempo, ele vasculhou uma área equivalente à cidade de Houston, nos Estados Unidos, a 700 metros de profundidade.

Isso permitiu que os cientistas obtivessem pistas sobre o passado da geleira, incluindo os momentos em que ela também passou por recuos e derretimentos significativos.

“Esse foi um estudo pioneiro sobre o fundo do oceano, que só foi possível graças aos avanços tecnológicos recentes”, descreveu a oceanógrafa física Anna Wåhlin, da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, em comunicado divulgado à imprensa.

“As imagens coletadas pelo Rán nos dão informações vitais sobre os processos que acontecem na junção entre a geleira e o fundo do oceano”, complementa.

Crédito, Alastair Graham/Universidade do Sul da Flórida

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Uma imagem em 3D do fundo do mar na frente da Thwaites coletada pelo veículo Rán

Os resultados

A varredura marítima detectou 160 cumes paralelos, que são “pegadas” geológicas sobre os antigos recuos da geleira.

“É como se você estivesse olhando para um medidor das marés no fundo do mar”, resumiu o geofísico marinho Alastair Graham, da Universidade do Sul da Flórida, nos EUA, e autor principal do artigo.

“Realmente me impressionou como os dados obtidos são belos”, acrescenta.

Crédito, Frank Nitsche

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Os cientistas Alastair Graham (à direita) e Robert Larter (à esquerda) observam a face de gelo em ruínas da margem da Thwaites

Segundo os especialistas, as novas informações servem como uma espécie de “bola de cristal” sobre a Thwaites: ao revelarem o que aconteceu no passado, elas ajudam a entender o que pode ocorrer num futuro próximo.

E o que os resultados mostram? Em algum ponto nos últimos 200 anos, a parte frontal da geleira perdeu contato com o fundo do mar e recuou (ou colapsou) a uma taxa de 2,1 quilômetros por ano.

Esse fenômeno teria acontecido num curto espaço de tempo, menor que seis meses.

Essa velocidade de recuo, de 2,1 km ao ano, representaria o dobro da taxa documentada entre 2011 e 2019, por meio de imagens de satélites.

“Nossos resultados sugerem que recuos muito rápidos ocorreram na geleira nos últimos dois séculos”, concluiu Graham.

“A Thwaites está realmente se segurando hoje ‘na ponta dos dedos’, e devemos estar preparados para grandes mudanças em pequenas escalas de tempo no futuro — mesmo de um ano para o outro”, declarou o geofísico marinho Robert Larter, coautor do trabalho e integrante do grupo Pesquisa Antártica Britânica.

Obviamente, os achados precisam ser confirmados por outros estudos na área. Mesmo assim, a pesquisa representa uma mudança de perspectiva, garantem os especialistas.

Antes, se pensava que as camadas de gelo na Antártica demoravam a responder às mudanças do ambiente — mas as pistas geológicas recentes mostram que isso pode acontecer bem mais rápido do que se esperava.

E, como mencionado no início da reportagem, o despejo de bilhões de toneladas de gelo no oceano a cada ano reforça o impacto que essas alterações podem ter em todo o mundo, especialmente nas cidades costeiras.

Os cientistas que analisam a região calculam que a perda total da Thwaites e das geleiras próximas representaria um aumento de 0,9 a 3 metros no nível do mar.

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