• Author, Camilla Veras Mota
  • Role, Da BBC News Brasil em São Paulo
  • Twitter, @cavmota

Crédito, Sebastião Moreira/EPA-EFE/REX/Shutterstock

Legenda da foto,

Morador em São Sebastião, no litoral paulista, tenta recuperar objetos levados pela enchente

A região de São Sebastião, uma das mais afetadas pelas inundações e deslizamentos no litoral norte de São Paulo, recebeu 640 mm de chuva em 24 horas.

O volume é mais de três vezes maior que o registrado em 2014, quando choveu 179 mm em dez horas – o evento climático mais extremo da história recente do município, conforme relatório do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).

Elaborado em 2018 e divulgado no ano seguinte, o documento, chamado de Plano Municipal de Redução de Riscos para São Sebastião, mapeou as principais áreas vulneráveis, os riscos de inundações e dos chamados “movimentos de massa”, termo que engloba vários tipos de instabilidade de solos, rochas e detritos, entre eles os deslizamentos.

Além do diagnóstico, ele traz recomendações de ações para mitigação das ameaças, que, conforme Fabrício Araújo Mirandola, diretor técnico da Unidade de Negócios em Cidades, Infraestrutura e Meio Ambiente do IPT, vinham sendo observadas em São Sebastião nos últimos anos.

“Temos conhecimento de que o município vinha atuando no planejamento e na gestão dos riscos, com implementação de medidas estruturais e não estruturais e na regularização fundiária de alguns bairros”, disse, por e-mail, à reportagem da BBC News Brasil.

Para ele, eventos climáticos como os que afetaram a região nos últimos dias “são esporádicos e difíceis de prever, como no caso dos terremotos”.

“As prefeituras dos municípios atingidos estavam com equipes em alerta e prontidão, e estas fizeram diversos atendimentos emergenciais desde o início das chuvas. Esse fato, sem dúvida, salvou diversas vidas”, afirmou, acrescentando que a média de chuvas para o mês de fevereiro inteiro na região é de 225 mm.

“Ou seja, em 24 horas tivemos três vezes o volume de chuvas esperado para 28 dias.”

O IPT tem no momento duas equipes em campo nas áreas afetadas, em São Sebastião e em Ubatuba.

‘Certificado de resiliência’

Na manhã de segunda (20/2), técnicos do instituto, junto com a Defesa Civil, sobrevoaram parte da rodovia SP-055 (trecho da BR-101 conhecido como Rio-Santos) para elaborar um diagnóstico geológico-geotécnico das situações mais críticas e identificar os bairros e núcleos que acabaram ficando isolados devido às dezenas de deslizamentos ocorridos ao longo da estrada.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), afirmou na noite de segunda que a rodovia tem dez pontos de bloqueio e que alguns de seus trechos podem ter sido arrastados pelas enxurradas.

Até o momento, há 40 mortos – 36 em São Sebastião -, mais de 40 desaparecidos e centenas de desalojados e desabrigados.

O município é um dos 66 em São Paulo que receberam neste ano um “certificado de resiliência”, dado com base em indicadores de gestão de risco e desastres no âmbito do Programa Município Resiliente, criado em 2019 pelo governo do Estado.

Conforme a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo, o programa é uma das iniciativas colocadas em prática para tentar fazer frente à “crise climática global, que está cada vez mais grave, tem causado ocorrências mais frequentes de eventos extremos como deslizamentos, inundações, erosão acelerada e tempestades, e tem afetando gravemente populações em situação de vulnerabilidade, socioeconômica e ambiental”.

A reportagem tentou contato com a Prefeitura de São Sebastião para conversar sobre os eventos climáticos extremos dos últimos anos, sobre a implementação do plano de redução de riscos e sobre os alertas de temporais na região nos últimos dias, mas não obteve retorno.

A forte chuva registrada no município em 2014, que ocorreu na madrugada de 23 de dezembro, bloqueou trechos da Rio-Santos e também provocou deslizamentos, alagamentos e isolou praias em São Sebastião.

O relatório do IPT traz a análise de que o episódio atingiu “excepcional gravidade provavelmente porque combinou a ação de diversos fenômenos: maré alta, alagamento por insuficiência da rede de microdrenagem e, considerando a topografia acidentada da região, enxurradas produzidas por precipitações em regiões montanhosas”.

O documento mostra ainda o cálculo do chamado “período de retorno”, que é o “o intervalo de tempo médio em anos que um determinado evento é igualado ou superado ao menos uma vez”, e conclui que eventos como esse podem frequentes e que “medidas devem ser tomadas no sentido de prover sistemas de alerta e de contingência, de modo a evitar consequências danosas, sobretudo à população mais vulnerável”.

À BBC News Brasil, Mirandola afirmou que um novo estudo deve ser realizado após o evento climático do fim de semana, já que dados novos de entrada – especialmente quando estão fora da média pluviométrica – são relevantes para se definir o período de retorno.

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