- Author, Mariana Sanches
- Role, Enviada da BBC News Brasil a Nova York
Depois de uma hora de uma reunião bilateral entre o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, nesta quarta-feira (20/09), o chanceler ucraniano Dmytro Kuleba afirmou que a reunião, que começou às 4h05 do horário de Nova York, serviu para “quebrar o gelo”.
Na sequência, tentou corrigir sua afirmação. “Não que houvesse gelo entre os nossos países, mas a conversa foi muito calorosa e honesta e acho que agora os dois presidentes entendem melhor o lado de cada um”, complementou.
A declaração de Kuleba revela a tensão que cercou a relação entre os dois países nos últimos meses. Por um lado, o governo do Brasil via Zelensky como “soberbo” em sua interação com o líder petista.
Por outro lado, o ucraniano acusava Brasília de tomar posição pró-Rússia ao defender cessar-fogo com congelamento de ocupação russa em territórios ucranianos e rechaçou uma aparente sugestão de Lula de que a paz só seria alcançada com a cessão de territórios.
Em menos de um minuto de pronunciamento, Kuleba ainda cometeu um ato falho, ao chamar Lula de Putin, em referência ao líder russo Vladimir Putin, responsável pela invasão à Ucrânia.
“Apreciamos a decisão do presidente Putin, digo, presidente Lula, com o seu conselheiro de Segurança Nacional, de continuar a participar nas reuniões de coordenação sobre a fórmula de paz proposta pelo presidente Zelensky. Então foi um momento muito importante e temos muito trabalho pela frente”, disse Kuleba, em referência a um grupo liderado por Dinamarca e Noruega que tem tentado mediar soluções diplomáticas entre Rússia e Ucrânia.
Ao lado de Kuleba, o chanceler brasileiro Mauro Vieira disse que a conversa foi “uma longa discussão num ambiente tranquilo e amigável” e que o Brasil se colocou à disposição para participar de qualquer grupo que queira discutir a paz entre os dois países ou até mesmo de apenas apoiar essas iniciativas, sem tomar parte nelas.
Reformas na ONU
Os dois presidentes também teriam conversado sobre as relações bilaterais entre Brasil e Ucrânia e sobre a reforma de organismos multilaterais.
Nesta quarta, Zelensky discursou ao Conselho de Segurança da ONU e defendeu que uma reforma para incluir novos membros era necessária.
Porém, não passou despercebido pelos brasileiros que Zelensky não citou o Brasil, mencionando apenas Alemanha, Japão e Índia.
Zelensky apenas mencionou genericamente que deveria haver uma vaga para a América Latina.
Para o governo brasileiro, o encontro acontece em um momento em que Zelensky está na maior baixa desde o início da guerra.
Ainda sem resultados militares robustos na contraofensiva à Rússia, tendo tido que demitir seu ministro da defesa recentemente sob alegações de corrupção e recebido críticas públicas sobre sua estratégia militar dos americanos, os maiores financiadores do esforço bélico ucraniano, Zelensky não atravessa uma boa fase e talvez isso tenha aumentado sua disposição para encontrar com Lula.
Mas o governo brasileiro fez um esforço para não deixar que a agenda Zelensky eclipsasse aquelas que eram as prioridades da viagem: o discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU, na qual Lula quis reapresentar as credenciais do Brasil ao mundo, e a bilateral com o presidente americano Joe Biden, com lançamento de uma iniciativa conjunta pelo trabalho digno.
Diplomatas com quem a BBC News Brasil conversou demonstraram desconfiança até o último momento de que Zelensky pudesse furar o encontro, o que geraria novo desgaste político para Lula.
Na quinta-feira (21/09), o chanceler Mauro Vieira se encontrará em Nova York com o colega russo Sergey Lavrov. E o governo brasileiro não descarta que um encontro entre Lula e Putin possa ocorrer em breve.
Fonte: BBC
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