Em Londres para o funeral da rainha Elizabeth 2ª, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (PL), divulgou vídeo na noite de domingo (18/9) em que dizia que a gasolina no Brasil era “uma das mais baratas do mundo”, e fez uma comparação com o Reino Unido.
Diante de um posto de combustíveis na capital britânica, que vendia o litro da gasolina por 1,61 libra (equivalente a cerca de R$ 9,70), Bolsonaro afirmou que o valor era “praticamente o dobro da média de muitos Estados do Brasil”.
“Estou aqui em Londres, Inglaterra. O preço da gasolina: 1,61 libras. Isso dá aproximadamente 9 reais e 70 centavos o litro. Ou seja, praticamente o dobro da média de muitos Estados do Brasil”, disse.
No entanto, a fala do presidente não leva em conta as diferenças de renda da população entre os dois países — e, portanto, quanto tempo um cidadão teria de trabalhar para abastecer seu carro.
No Reino Unido, o salário mínimo é de 9,50 libras por hora. Considerando o preço da gasolina a 1,61 libra por litro, como indicava o letreiro do posto diante do qual Bolsonaro fez o vídeo, um cidadão britânico recebendo salário mínimo teria de trabalhar o equivalente a 10 minutos para comprar um litro de gasolina.
Em relação à renda per capita — o PIB (Produto Interno Bruto, ou soma de bens e serviços produzidos por um país) dividido por sua população, a gasolina também é mais barata para o britânico do que para o brasileiro.
No ano passado, a renda per capita anual do Reino Unido foi de US$ 49.675, enquanto a do Brasil, US$ 16.506, segundo o Banco Mundial.
Sendo assim, considerando o correspondente dos valores mencionados acima em dólar, o litro de gasolina custaria 0,004% da renda média do britânico, ao passo que 0,006% da renda média do brasileiro.
“Bolsonaro fez a mera conversão de câmbio nominal”, explica à BBC News Brasil Fabio Terra, professor de Economia da UFABC (Universidade Federal do ABC). “Não é só preço o que importa, importa muito a renda porque ela é o que permite que se compre algum ‘preço’, ou seja, algum produto”, acrescenta.
Um economista ouvido pela BBC News Brasil lembrou que toda comparação “tem suas limitações” e acrescentou que a fala de Bolsonaro ignora “as realidades locais não só de renda, mas também a respeito da legislação, de o Brasil ser um país produtor de petróleo”.
Terra, da UFABC, acrescenta que, apesar disso, “importamos parte razoável do que consumimos aqui também”.
“No caso do diesel, a importação chega a 30%. Importamos também muitos refinados de petróleo. E fazemos essa importação com uma moeda fraca quando comparada ao dólar, moeda em que se cota o petróleo, enquanto que o Reino Unido faz com moeda forte”, assinala.
Nas redes sociais, usuários também apontaram a contradição matemática de Bolsonaro.
Segundo um ranking elaborado pela plataforma de monitoramento Global Petrol Prices, o Brasil tem a 34ª gasolina mais barata entre 168 países e territórios (0,99 dólar por litro). E os brasileiros também pagam menos por esse combustível do que a média mundial (1,33 dólares por litro).
No entanto, essa lista tem forte influência da taxa de câmbio, pois os valores são convertidos em moeda local para o dólar.
Nesse sentido, como a libra esterlina é mais valorizada ante o dólar americano que o real brasileiro, o Reino Unido aparece nesse ranking como tendo gasolina “mais cara” do que o Brasil.
De acordo com a Global Petrol Prices, o país onde a gasolina é mais barata é a Venezuela. Ali, o litro da gasolina custa o equivalente a US$ 0,02.
Mas Terra, da UFABC, ressalva: “No caso da Venezuela são duas coisas, por um lado a abundância de petróleo; por outro, a política de precificação que eles usam para transpor os preços ao produtor para os preços ao consumidor”.
O governo venezuelano mantém os preços da gasolina sob rígido controle e subsidia grande parte do custo, mantendo os valores baixos para o consumidor final.
Gasolina em queda
De fato, porém, o valor médio da gasolina no Brasil vem caindo. E isso se deve a um conjunto de medidas tomadas pelo governo.
Bolsonaro zerou as alíquotas de PIS e Cofins, dois tributos federais, sobre o diesel e o gás de cozinha até dezembro de 2022, e anunciou um amplo pacote de R$ 53 bilhões para tentar reduzir o preço dos combustíveis.
Essa é uma das maiores “pedras no sapato” do presidente em sua busca por reeleição — até os caminhoneiros, que o apoiaram rumo ao Planalto em 2018, fizeram críticas duras à política de preços da Petrobras.
Na semana passada, pela primeira vez desde julho de 2020, o preço médio da gasolina no Brasil caiu para menos de R$ 5, segundo a ANP, em valores corrigidos pelo IPCA, que mede a inflação oficial.
Foi uma queda de 32,7%, ou R$ 2,42, frente ao pico de R$ 7,39 por litro registrado no fim de junho, antes dos cortes de impostos estaduais e federais aprovados pelo Congresso Nacional.
Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!
Você precisa fazer login para comentar.