- Author, Petra Zivic
- Role, BBC
Dias depois de moradores de Billings, a maior cidade do Estado americano de Montana, observarem no céu um “grande círculo branco” — que mais tarde foi identificado pelos Estados Unidos como um objeto de espionagem chinês —, mais três objetos voadores foram derrubados pelos EUA.
As informações sobre eles são limitadas e as especulações sobre o que são se intensificaram nos últimos dias.
O último foi derrubado perto da fronteira entre EUA e Canadá, sobre o lago Huron. O objeto foi descrito pelas autoridades de defesa dos EUA como uma “estrutura octogonal” não tripulada que poderia ser um “tipo de balão gasoso” ou ter “algum tipo de sistema de propulsão”.
Ele estava viajando a 6,1 mil metros e pode ter afetado o tráfego aéreo comercial.
“Ainda não descarto nada”, disse o general Glen VanHerck, chefe do Comando de Defesa Aeroespacial, quando questionado se era possível que os objetos fossem extraterrestres.
VanHerch acrescentou, porém, que não há indícios de qualquer ameaça.
Quais objetos os EUA derrubaram?
As autoridades ainda estão recolhendo restos de objetos voadores abatidos recentemente sobre os EUA e o Canadá, mas pouco disseram sobre sua origem ou propósito.
“Acho que os americanos estão tentando descobrir se há algum dado coletado nesses objetos que eles possam recuperar”, disse Christoph Bluth, professor de relações internacionais e segurança da Universidade de Bradford, à BBC.
Não está claro se o objeto abatido no domingo sobre o lago Huron, em Michigan (EUA), era usado para vigilância, dúvida que paira também sobre objetos abatidos no Alasca na sexta-feira e em Yukon (no noroeste do Canadá) no sábado.
“Esses objetos não eram parecidos entre si e eram muito menores do que o balão (abatido na Carolina do Sul). Não podemos caracterizá-los até que possamos recuperar os destroços”, disse um porta-voz da segurança nacional da Casa Branca no fim de semana.
O balão ao qual o porta-voz se referiu foi avistado pela primeira vez em 28 de janeiro ao passar pelas Ilhas Aleutas, no Alasca. Ele chegou a entrar no espaço aéreo canadense, pairou por dias sobre os EUA — inclusive sobre o Estado de Montana, que abriga um dos três silos de mísseis nucleares do país. Em 4 de fevereiro, ele foi derrubado por um caça F-22 na costa da Carolina do Sul.
Segundo o Pentágono, esse balão tinha uma gôndola do tamanho de três ônibus, pesava mais de uma tonelada e era equipado com várias antenas e painéis solares capazes de abastecer vários sensores de coleta de informações.
Por que balões ainda são usados?
“Essas coisas já aconteceram antes. Durante o governo Trump, três balões foram descobertos sobre os EUA, mas eles só foram vistos após deixarem o espaço aéreo americano”, lembra Juliana Suess, analista do centro de pesquisas Royal United Services Institute.
“Os balões têm sido usados para espionagem desde as guerras revolucionárias francesas”, explica Suess.
“Hoje, eles são preenchidos com hélio em vez de hidrogênio. Eles se expandem durante o dia e, à noite, esvaziam. Eles permanecem flutuando até que o hélio seja consumido.”
Mas Christoph Bluth afirma que os balões têm perdido relevância.
“Os balões têm sido relativamente incomuns para espionagem, em parte porque obviamente se movem muito lentamente e as pessoas os consideram uma tecnologia menos importante hoje em dia”, diz o professor.
Um balão típico usado para vigilância pode rastrear diversos tipos de informação e coletar imagens.
“Os balões têm tido um papel menos significativo nos últimos tempos porque temos a tecnologia de satélite, que é extremamente avançada e pode observar objetos muito pequenos no solo”, explica Bluth.
Então, por que alguém ainda usaria os balões que podem, ao contrário dos satélites, ser vistos pelo público?
“Os detalhes que você pode ver de cima dependem da distância, e os satélites ficam muito mais alto que os balões. Então, embora a tecnologia dos satélites seja muito avançada, ainda pode ser mais vantajoso chegar mais perto (das informações de interesse)”, explica Bluth.
Juliana Suess menciona outras vantagens dos balões
“Eles têm um custo muito menor, podem ser implantados muito mais rapidamente e, embora os satélites se movam em órbitas previsíveis e possam sobrevoar a mesma área algumas vezes ao dia, eles não têm o benefício de analisar uma área por um longo tempo de forma a detectar alterações”, diz Suess.
De acordo com os dados dos EUA, a China tem uma extensa rede de vigilância no espaço de quase 300 satélites, um número que fica atrás apenas da rede dos EUA.
Satélites também já foram derrubados antes.
“Mas eram satélites do próprio Estado. Os chineses abateram um de seus próprios satélites, os russos já fizeram o mesmo. Nenhum deles jamais derrubou um satélite em outra nação”, aponta Suess.
A pesquisadora lembra da disseminação dos drones atualmente, embora eles raramente saiam dos países dos quais foram lançados.
Não foi assim durante a Guerra Fria, quando outros meios de vigilância foram usados.
“Durante o período inicial da Guerra Fria, os Estados Unidos usaram vários aviões, até que a União Soviética se tornou boa em derrubá-los”, recorda Bluth.
A Guerra Fria trouxe novas regras quando se trata de práticas de vigilância.
“Ficou claro que o envio de aviões espiões era considerado uma violação do território. Por outro lado, houve um acordo de que o uso de satélites de observação era permitido, e não uma violação do direito internacional”, explica Bluth.
Mas usar objetos voadores para coletar informações continua sendo “uma área complicada”, acrescenta.
“Algumas coisas são permitidas e outras não. Quando se trata de balões estrangeiros, o governo dos EUA não considera isso permitido.”
Mas Bluth aponta que aviões de espionagem são usados até hoje.
“Os próprios Estados Unidos usam muitos aviões espiões, eles meio que rodeiam o território de outros países. Houve incidentes em que aviões foram derrubados. Um avião americano foi abatido na China e este foi um incidente diplomático que durou alguns durante o governo Bush”, diz o especialista.
Quais podem ser as consequências da situação atual?
Desde a derrubada de quatro objetos voadores, as forças dos EUA estão em alerta máximo.
O primeiro incidente com o balão levou o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, a cancelar uma viagem planejada a Pequim.
A China negou que o objeto fosse usado para espionagem e disse que se tratava de um dispositivo de monitoramento do clima que havia explodido.
O Ministério das Relações Exteriores da China disse na segunda-feira que os EUA lançaram balões em seu espaço aéreo mais de 10 vezes no ano passado.
E enquanto as autoridades americanas estão tentando descobrir qual era o propósito de três objetos voadores ainda não identificados, Bluth acha que a falta de evidências de que eles estavam coletando informações pode significar que eles eram civis.
“Eles estavam baixo na atmosfera e foram derrubados porque possivelmente estavam interferindo nos vôos. Já o balão estava muito mais alto”, afirma o pesquisador
Bluth acredita que o incidente do balão pode trazer novos desdobramentos.
“Eventualmente, os Estados Unidos tentarão reduzir as tensões com a China e encontrar algum tipo de acordo para que esse tipo de ação não seja permissível e para que, se houver algum tipo de balão meteorológico ou objeto voador civil, que haja algum tipo de notificação pela entrada no espaço aéreo dos EUA”, acrescenta.
Suess diz que “as pessoas raramente pensam em objetos de coleta de informações até que os vejam” e que essa é uma das razões pelas quais o suposto balão de espionagem chinês causou tanto furor.
“Acho que as pessoas esquecem quantos satélites existem e como eles tiram fotos e coletam outras informações todos os dias.”
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