- Giulia Granchi
- Da BBC News Brasil em São Paulo
“Acordei com o barulho da chuva às quatro e meia da manhã. Eu, minha filha e minha mãe tentamos tirar a água, mas a correnteza vinha muito forte. Só deu tempo de pegar as crianças, os documentos, e sair. Em cinco minutos a água já estava no teto”, diz Luana José, de 39 anos, moradora do bairro Monteiro, em Recife.
Na casa de Luana, moravam também três crianças – pela agilidade em sair da casa, ninguém se machucou.
A família foi uma das tantas afetadas pelas fortes chuvas e deslizamentos de terra causados pelas tempestades na região do Grande Recife devido. Nas últimas 24 horas, pelo menos 30 pessoas morreram, além dos outros cinco óbitos ocorridos na última quarta-feira (25/5), totalizando 35 vítimas.
Todos os móveis, roupas e outros objetos da família de Luana ficaram na casa inundada. “Perdi tudo que juntei a vida inteira, agora não sabemos o que fazer. Tenho depressão e a situação não é nada boa.”
A família agora tem planos de buscar abrigo na escola Estadual Silva Jardim, um dos vários pontos escolhidos pela prefeitura da capital para receber pessoas que perderam a casa.
Mas, de acordo com Luana, ela tem medo de sair do local, e após a água baixar, alguém tentar invadir a propriedade. “Sabemos que estão entrando em casas que ficaram destrancadas, por isso estamos aqui, sem comer nada o dia todo, olhando, mesmo que de longe”, afirma a moradora, que ainda tem esperança de conseguir salvar algo que ficou na residência.
De acordo com a Codecipe (Central de Operações da Coordenadoria de Defesa Civil do Estado de Pernambuco), assim como Luana e sua família, mais de 700 pessoas que residiam na região do Grande Recife estão desabrigadas.
Com chuvas ainda previstas para a região nas próximas horas, a depender da extensão da destruição causada pelos alagamentos, a saúde dos moradores ainda pode estar risco em médio e longo prazo.
“Essas enchentes e deslizamentos de grandes áreas têm capacidade de destruição do sistema de saneamento – caso ele exista na região”, explicou Carmen Fróes, professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e pesquisadora do tema de exposição à poluentes ambientais, à BBC em entrevista feita em fevereiro de 2022.
Com isso, a população pode ter seu sistema de água contaminado por escombros e esgoto, ambos contando com a possível presença de agentes biológicos nocivos. “Um risco bastante comum é ter o aumento dos casos da doença chamada leptospirose, causada por um microorganismo presente na urina do rato”.
Além do risco de ingestão direta de água contaminada pelo extravasamento do sistema de saneamento, há ainda a possibilidade de que, ao se deslocar de um lugar para outro, a pessoa que tenha qualquer tipo de ferida não cicatrizada — por menor que seja — se contamine por ter contato com a água ou com a lama.
Sem o controle dos órgãos públicos e concessionária, a água potável que passaria por tratamento é oferecida com contaminação por esgoto, aumentando as chances de quadros associados às precárias condições de saneamento básico, como diarreia bacteriana, febre tifoide e hepatite.
Mexer nos escombros também é perigoso por aumentar o risco de tétan. “É uma infecção causada pela bactéria Clostridium tetani, que é geralmente encontrada no solo, na poeira e em fezes de animais, e acessa o organismo através de ferimentos ou lesões de pele”, afirmou a especialista.
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