Crédito, Giulia Granchi/BBC News Brasil

“Comecei a acampar para ver a Taylor Swift em janeiro, bem antes de ela anunciar a turnê no Brasil”, conta Jéssica Araújo, de 29 anos, a primeira da fila para comprar os ingressos para a data extra do show da cantora americana em São Paulo, que fará no total três apresentações na capital paulista e duas no Rio de Janeiro.

Jéssica era uma das fãs entre as centenas que se revezam em plantões durante a quinta-feira (15/6) no estádio Allianz Parque, na Zona Oeste da capital paulista, onde será a apresentação, à espera do início das vendas dos ingressos na segunda-feira (19/6).

Já antecipando que os ingressos seriam muito concorridos, ela conta que passou os três primeiros meses do ano se revezando com um grupo em frente ao estádio onde ocorrerá o show, na esperança de que as datas fossem anunciadas a qualquer momento.

“Em abril, cansamos de esperar e voltamos para casa. Aí, no primeiro dia de junho recebemos um boato de um site chileno dizendo que o anúncio seria no dia seguinte e voltamos para a acampar imediatamente”, diz ela.

Jéssica conta que trabalha em um call center e organiza sua escala de forma a não ameaçar perder seu lugar.

“Já são meses de fila e posso dizer que valeu a pena. Nosso lugar é um privilégio mesmo, e a gente se esforçou bastante para conseguir isso.”

A vinda de Taylor Swift, inédita no Brasil e com passagem apenas por São Paulo e Rio de Janeiro, tem sido esperada por Jéssica e milhares de outros como ela. “Sou fã há 12 anos. Muita gente estava esperando.”

Jéssica é a responsável por uma das mais de 40 barracas de fãs amontoadas embaixo de um viaduto próximo ao local, enfrentando frio e chuva.

Eles estavam em frente ao estádio, mas tiveram que mudar de lugar não atrapalhar os shows da banda Titãs programados para sexta-feira e sábado.

Muitos passam o dia todo dia ali, com pequenos intervalos para comer e ir ao banheiro em um shopping próximo.

Eles se revezam em turnos cuidadosamente organizados em planilhas compartilhadas, o que inclui às vezes passar a noite acampado ali.

Os fãs dizem que, como cada pessoa pode comprar até quatro ingressos, alguns de um mesmo grupo ficam responsáveis por comprar para outras pessoas.

Uma barraca só pode ter revezamento para, de acordo com as regras estipuladas pelos próprios grupos ali presentes, no máximo 10 pessoas. Mas algumas acabam tendo bem mais.

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Acampados dividem espaço sob viaduto próximo à bilheteria

‘Chance única’

Vários fãs disseram à reportagem que também estão dispostos a fazer o que for necessário para não perder uma “chance única” – e isso se reflete os números dos shows no país até agora.

Compradores da turnê anterior de Swift, Lover Fest, cancelada em 2019 por conta da pandemia de covid-19, assim como clientes de uma bandeira de cartões específica, tiveram acesso privilegiado às vendas antes, deixando essa corrida ainda mais acirrada.

Quando a venda foi aberta para o público geral, a cobiçada nova turnê, chamada de The Eras Tour, tomou proporções ainda maiores.

Mais de meio milhão de pessoas se registraram em uma fila online só para os shows em São Paulo, que acontecerão no Allianz Parque – com capacidade para comportar 55 mil fãs. Os lugares esgotaram em cerca de 30 minutos.

Alguns que não conseguiram ingresso desistiram e voltaram para casa. Outros dediciram ficar por ali na esperança de uma nova data fosse anunciada.

Quando isso aconteceu, na segunda-feira (12/6), teve gente que se arrependeu e voltou a acampar na porta do estádio – mas teve que ir para o final da fila.

O show extra é considerado por vários fãs como a última oportunidade.

Fãs do Rio de Janeiro, que só poderiam ver a cantora no dia 18 de novembro, também ganharam mais uma oportunidade com um show extra no dia seguinte.

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João Pedro diz que ficará o tempo necessário para conseguir seu ingresso

João Pedro Dantas Damasceno, de 26 anos, ainda tenta seu ingresso.

“Estou aqui desde o dia 2 de junho, quando foi anunciada a turnê, e ainda não consegui comprar”, diz ele, que tem um restaurante de comida japonesa com seu pai e tem o apoio dele para se ausentar do trabalho por algumas horas por dia.

“Continuo com esperança, tranquilo, tenho que tentar. Se abrir outra data, fico aqui mais uma semana.”

Além da concorrência entre fãs, grupos de cambistas também montaram barracas. A prática de comprar ingressos para revender com lucro é ilegal.

Durante as tentativas passadas de vendas de ingressos para os shows da artista, houve relatos de brigas verbais e ameaças entre cambistas e fãs.

Uma fã de 23 anos que preferiu não se identificar diz que a confusão foi causada pela entrega de senhas antecipada pela organização do evento aos que estavam na fila para a venda geral.

“A organização da T4F combinou verbalmente conosco de entregar fichas numéricas para a compra dos ingressos, mas acabaram entregando bem antes, e várias pessoas tinham saído para tomar banho, trocar turnos… Isso causou muita confusão.”

À reportagem, o Allianz afirmou que a responsabilidade da venda dos ingressos – física e online – é da produtora do evento, no caso, a Tickets For Fun, ou T4F.

Até o momento da publicação da reportagem, a empresa não respondeu aos questionamentos sobre a atuação dos cambistas, a entrega de senhas e possíveis medidas para organização e segurança dos fãs na fila.

Mas, apesar dos desentendimentos nos últimos dias, o clima entre fãs e cambistas agora é de paz.

Aconteceram, inclusive, momentos de confraternizações como um churrasco feito pelos cambistas e aberto aos fãs na última semana, como forma de passar o tempo e espantar o frio da capital paulista.

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Gustavo Maciel, 18, virou virou fã de Taylor Swift aos 13 anos

Gustavo Maciel, de 18 anos, está na fila desde que a turnê foi anunciada, há duas semanas. Ele diz que, embora tenham ocorrido “momentos tensos”, os cambistas têm ajudado na organização da fila.

“Na falta da empresa responsável pelos shows ajudar o pessoal a criar uma organização, foram os cambistas que começaram a colocar ordem, pegando os números das barracas e os nomes das pessoas.”

Vitória Souza, de anos 23, que saiu de onde mora, no Guarujá, a 100 km da capital, para tentar comprar ingressos, avalia que o melhor foi “se unir aos cambistas”.

“Eles são mais velhos, mais fortes, têm mais experiência. A maioria aqui tem menos de 25 anos, não tem muito que a gente possa fazer. Além disso, eles estão ajudando a gente. Estávamos no Allianz pegando chuva, com as barracas molhadas por dentro… Aqui embaixo do viaduto pelo menos está coberto. Quem achou esse lugar? Os cambistas. Ajudaram também a carregar sacolas, montar barracas… E isso não é o ideal, mas é o que a gente tem.”

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O amor e admiração dos fãs é o que os motiva a enfrentar tantos perrengues para ver a artista

O amor e admiração dos fãs é o que os motiva a enfrentar tantos perrengues para ver a artista.

“As músicas da Taylor marcaram minha adolescência e quero ter essa experiência. Estar nessa situação aqui do viaduto, acampando por um ingresso, é humilhante, é triste. Mas tá todo mundo tá com medo de ela não voltar. Sentimos que ela não valoriza o Brasil”, desabafa Vitória.

Para João Pedro, não dá para perder um show de uma turnê que promete passar por todos os álbuns que a cantora já lançou.

Já Felipe Araújo quis acampar não simplesmente para conseguir ir ao show, mas para ter a melhor visão possível do espetáculo.

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Felipe Araújo mostra sua tatuagem em homenagem a Taylor Swift

Jéssica Araújo, a administradora da primeira barraca da fila, lembra que Taylor Swift é definida como “a própria indústria”, por críticos especializados.

“Ela é uma artista completa, e isso vai muito além do que ela faz, mas inclui a identificação que os fãs têm com as músicas dela. A gente já sentiu aquela dorzinha do amor, sabe? Aquela animação, aquela história sobre amizade… Os fãs da Taylor têm esse vínculo com ela.”