Cor branca será predominante e se estenderá à crista do maior calunga do estado em homenagem à população idosa. Manto sagrado reverencia populações originárias e ganha referências de artesanato indígena como varandas e renascença cenográfica. (Foto: Marcos Pastich/PCR)
A maior e mais famosa escultura de arte contemporânea do Brasil, que reina anualmente sobre o rio Capibaribe no epicentro do maior Carnaval em linha reta, desembarcará na Ponte Duarte Coelho em 2024 evocando a união, convergência e gentileza entre os povos. Este será o Galo Gigante da Paz, alegoria assinada pelo artista plástico, designer e consultor pernambucano Leopoldo Nóbrega com produção executiva de Germana Xavier. Sustentabilidade, reverência aos povos originários e cocriação da alegoria também são pontos basilares do processo, que convida o brincante a fazer do Carnaval um momento de reflexão, quando a folia também pode ceder espaço para o combate a todos os tipos de violência e preconceito: do racismo, ao etarismo passando pela violência de gênero e a exigência do respeito a todos, todas e todes em busca de um mundo mais justo e menos bélico.
O branco será a cor predominante da escultura, que ganha ainda os tons dos cinco continentes: amarelo (Ásia), preto (África), vermelho, (América), azul (Europa) e verde (Oceania). “Este ano a escultura do Galo Gigante surgiu a partir de temas como gentileza, ancestralidade, sustentabilidade, inclusão e se torna um mensageiro divino da esperança de paz para o nosso tempo. A obra também homenageia seres iluminados que dedicaram sua existência pela paz no mundo, como Dom Hélder Câmara, Cacique Raoni, Madre Teresa de Calcutá e Martin Luther King, entre outros. Também marca os 79 anos da Organização das Nações Unidas (ONU) em sua missão de paz pelo mundo”, pontua Nóbrega. As penas do rabo de sua majestade, por sua vez, trarão a palavra “Paz” escrita em 16 idiomas distintos.
Pesando oito toneladas e com 28 metros de altura, a escultura ratifica seu compromisso com a preservação do meio ambiente e a inovação de procedimentos artísticos para a promoção da sustentabilidade, por meio da adoção do upcycling. Este ano, mais de 90% do material que vestirá a estrutura é fruto de descarte de materiais e reaproveitamento de resíduos tecnológicos, como dois mil metros de lonas de materiais publicitários, além de 10 mil CDs e DVDs, frutos de doação. Os interessados em contribuir para a obra monumental podem fazer doações de CDs e DVDs em horário comercial nos dias úteis na Unidade de Tecnologia na Educação para a Cidadania (UTEC) do Largo Dom Luiz ou nas dependências da Escola de Samba Galeria do Ritmo, no Morro da Conceição.
O destaque, entretanto, fica para a crista do Galo que, pela primeira vez, traz o branco e prata dos grisalhos e grisalhas que não dispensam uma boa folia, evocando o respeito e a inclusão no Carnaval que é feito para todos. Assim, sua majestade fica de pé sobre a ponte Duarte Coelho com um black power branco e prata, digno de quem ostenta sobre a cabeça o resultado natural de muita experiência, alegrias, vida e anos vividos.
Aos pés do Galo, assim como na última edição, a arte se torna instrumento de conscientização e sensibilização para um Carnaval de mais inclusão e respeito. As faces da base de sustentação ganharão grafites em torno da temática de paz e combate a todos os tipos de preconceito e violência de gênero, além de racismo e QR Code para que os foliões possam acessar as plataformas municipais onde podem realizar denúncias. No Chão, também como no ano precedente, mensagens alusivas à temática de paz e harmonia em um Carnaval que também é palco de reflexão e democracia.
O corpo encantado do galo, por sua vez, ganha uma espécie de body branco em uma releitura de renascença cenográfica realizada manualmente pelo Ateliê Arte Plenna e inspirada na produção de Pesqueira. Para a obra, as rendas estão sendo confeccionadas em eletrodutos (conduítes) e cujas amarrações serão realizadas com material de garrafas PET. Os desenhos foram criados pelo próprio Leopoldo, que decidiu aplicar, na altura do coração do Gigante, uma réplica de sombrinha de frevo. As asas do galináceo mais amado da folia trarão ‘tatuagens’ do símbolo pela paz, em voga desde a década de 70, mesma década de fundação do Galo da Madrugada.
Sobre os ‘ombros’, a indumentária de sua majestade irá reverenciar os povos indígenas e seus raros mantos tupinambás, vestimentas feitas em Arte Plumária, cujo exemplar mais famoso foi subtraído e levado para a Dinamarca desde o século XVII e será devolvido ao Brasil em 2024. Serão empregadas 1000 ‘penas’ feitas das lonas plásticas de 1,10 m X 40 cm na técnica Arte Plumária Upcycle. As peças podem trazer suas cores originais ou ainda ganhar intervenções de grafitagem e apliques de tintas.
Para garantir a inclusão e cocriação, 250 delas serão confeccionadas em oficinas realizadas em parceria com a Associação Nacional de Idosos (ANATI) para pessoas de 60 anos ou mais. Nelas, serão ministradas técnicas de pintura para escrita de palavras de gentileza no manto sagrado. Além das pessoas idosas envolvidas na cocriação, fazem parte do processo o Núcleo de Mulheres Artesãs Arte Plenna e o movimento Catamisto, que propõe reflexões a partir de obras de arte fruto de misturas de materiais que seriam descartados.
Nas pernas, a artesania das ‘varandas’, apliques feitos em tecido com técnica de macramê, será realizada pelas artesãs da Cooperativa Coopertextil, de Caraibeiras, terra dos Pankararus. O bico do galo, por sua vez, ganha um tom que evoca as formações étnicas dos mamelucos, além de trazer uma maquiagem com a paleta que permeia a obra.