Receitas também seguem a moda. Assim como roupas, carros, músicas, candidatos, jeito de arrumar a mesa e de receber os amigos. Bom exemplo de prato que está na moda hoje é o risoto. E talvez melhor, daqueles que saíram, seja o estrogonofe. Nos anos 70, nenhuma refeição requintada prescindia dele. Depois, coitado, acabou relegado ao mais cruel e injusto esquecimento. Passou a ser considerado prato de segunda categoria. Outro dia, quando amigos apareceram de surpresa para jantar, lembrei dele. Então aproveitei uma sobra de filé perdido na geladeira e ressuscitei o estrogonofe. Valeu a pena. E virou o prato preferido (do momento) de José Paulo.
Tudo começou na Rússia do séc. XVI. Quando as rações dos soldados era basicamente carne cortada em pedaços. Essas carnes, nos depósitos de mantimentos das tropas, ficavam em grandes barris – misturadas com sal grosso e aguardente, para que se conservassem por mais tempo. Na hora de preparar, se fritava em gordura e servia com cebolas. Só mais tarde o prato ganhou esse nome – no reinado de Pedro, o Grande (1682-1725). Mais precisamente quando o Imperador pediu a seu cozinheiro que preparasse jantar especial, em homenagem ao General Stroganov. Não era um militar qualquer. Pertencia a família nobre de Novgorod, lugarejo que fica no entorno de São Petersburgo – esta, cidade fundada pelo próprio Pedro. Os Stroganov construíram vilas, fortalezas, fabricas de armas e, como se fosse pouco, até conquistaram a Sibéria. Sem contar que esse ilustre General acabara de derrotar, na Poltava, Carlos XII, em 1709. O experiente cozinheiro então decidiu servir algo que lembrasse aquela carne picada, tão apreciada pelo General nos campos de batalha. Dando ao prato, claro, novo visual. Acrescentando creme azedo, o mesmo usado nos blinis (espécie de panqueca) do Imperador. A aprovação foi apoteótica. Depois o prato acabou ganhando novos ingredientes. E passou a frequentar todas as mesas nobres.
No final do séc. XIX Thierry Coster, famoso cozinheiro francês, passou uma temporada trabalhando em palácios da Rússia. E aproveitou para introduzir, na receita, requintes europeus – cogumelos franceses, mostarda alemã, páprica dos húngaros. Foi mais longe. Decidiu flambar a carne com conhaque, ainda substituindo aquele creme azedo por um creme de leite fresco. A receita logo ganhou o mundo na bagagem da aristocracia russa expulsa de sua terra pelos bolcheviques de Lênin, na revolução de 1917. Na França fez tanto sucesso que acabou até incluída, pelo conde Serge Alexandrovitch, no cardápio de Maxim’s de Paris.
Ao Brasil chegou na segunda guerra, trazida por imigrantes russos. Entre elas uma descendente da família Stroganov, Sophie – que casou e viveu em São Paulo, até agosto de 96, quando morreu no frescor de seus 82 anos. Aqui novos jeitos de preparar o prato foram surgindo, tendo como base já não apenas carne, mas também frango, camarão ou presunto. Hoje os descendentes de Sophie reconstruíram a velha mansão em Novgorod, que passou a ser um museu. Expondo feitos e pertences da família. Inclusive a origem do prato famoso. Moda vai, moda volta. A vida tem seus mistérios. Agora falta só voltar à moda o velho e bom estrogonofe. Na minha casa já voltou e faz sucesso.
RECEITA: ESTROGONOFE (receita de D. Sophia Stroganov)
INGREDIENTES:
1 kg de filé mignon
100 g de manteiga
1 cebola grande picada
Alho picado a gosto
Sal e pimenta do reino, moída a gosto.
Páprica doce
Suco de ½ limão
300 g de cogumelos
½ litro de creme de leite
½ xícara de conhaque
PREPARO:
· Corte o filé em tiras finas (no sentido das fibras da carne).
· Tempere com sal, pimenta, páprica e limão.
· Frite a carne na manteiga (junto com cebola e alho), até que fique dourada.
· Despeje o conhaque e flambe.
· Esfregue bem o fundo da panela, fazendo um molho escuro. Se necessário acrescente água. Deixe reduzir o molho.
· Junte creme de leite e cogumelos.
Sirva com arroz branco e batatas cozidas, passadas ligeiramente na manteiga.
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Fonte: Folha PE
Autor: Letícia Cavalcante