Agora, seis meses depois, a família vai vendê-la de volta ao condado por US$ 20 milhões.
“O que foi roubado da família foi a propriedade, mas o que a propriedade representava era a capacidade de gerar, preservar e transmitir a riqueza entre gerações”, disse o advogado da família, George Fatheree, ao jornal Los Angeles Times.
“E permitir que a família agora tenha a garantia de vender a propriedade para o condado, pegando o dinheiro e investindo em seu futuro, isso também é uma reparação.”
O terreno do Bruce’s Beach foi comprado em 1912 por Willa e Charles Bruce para criar um local de lazer para a comunidade negra, em uma época em que havia segregação racial na Califórnia.
Localizada na valorizada cidade de Manhattan Beach, a propriedade foi desapropriada pelo conselho municipal em 1924.
Mas, em junho do ano passado, as autoridades do condado de Los Angeles votaram a favor de devolver o terreno à família, acordando que o condado o arrendaria por US$ 413 mil por ano. Uma cláusula incluída no contrato permitia sua venda dentro dos dois anos seguintes.
A família recorreu a essa cláusula para vender a propriedade por US$ 20 milhões, seu atual valor de mercado, segundo cálculos incluídos no contrato — que agora volta para as mãos do condado.
Ambas as partes têm até o final de janeiro para formalizar a venda, embora o acordo já esteja fechado.
Cidadela para afrodescendentes
Willa e Charles Bruce compraram o terreno por US$ 1.225 em 1912 — eles construíram uma infraestrutura que incluía refeitório, salão de festas e vestiários, afirmou Duane “Yellow Feather” Shepard, historiador e porta-voz da família, à BBC no ano passado.
A Bruce’s Beach se tornou uma “cidadela para afro-americanos que vieram de todas as partes do sul da Califórnia em busca de lazer”.
Willa disse a um repórter na época : “Sempre que tentamos comprar um terreno para um resort na praia, somos recusados. Mas eu possuo essa terra e vou mantê-la”.
Mas logo depois, por volta de 1914 ou 1915, de acordo com “Yellow Feather” Shepard, “a Ku Klux Klan [organização supremacista branca] e os vizinhos brancos decidiram que não queriam que a família Bruce permanecesse lá”.
O departamento de polícia local colocou placas limitando o estacionamento a 10 minutos, e um vizinho pregou cartazes de alerta do tipo “passagem proibida”, obrigando as pessoas a caminhar quase um quilômetro em qualquer direção para chegar ao mar, explicou.
Mas essas medidas não dissuadiram os visitantes, então as autoridades locais decidiram desapropriar o terreno com base em uma lei destinada a permitir que o governo forçasse a venda de uma propriedade para a construção de estradas e edifícios públicos.
A desculpa era que iriam construir um parque, e a família Bruce foi obrigada a vender a propriedade uma década depois. De acordo com Shepard, “o parque só foi construído em 1957, e o terreno ficou vazio até aquele ano.”
A recuperação do terreno
Duane “Yellow Feather” Shepard, que é membro da família desapropriada e também descendente de indígenas, liderou a iniciativa para recuperar a propriedade.
Ao longo dos anos, eles realizaram manifestações e eventos para chamar a atenção para sua causa.
Em junho do ano passado, o conselho do condado de Los Angeles aprovou a moção para devolução do terreno, reconhecendo que estava “bem documentado” que a expropriação “tinha motivação racial para expulsar um negócio negro bem-sucedido e sua clientela”.
A devolução da propriedade foi resultado de um processo longo e árduo. Durante anos, a praia teve uma placa em homenagem a Willa e Charles, e a assembleia estadual teve que aprovar uma lei permitindo sua devolução.
“Este é um dia que não tínhamos certeza de que chegaria”, disse Anthony Bruce, tataraneto de Willa e Charles, na ocasião.
“Isso os destruiu financeiramente. Destruiu a chance de realizarem seu ‘sonho americano’. Gostaria que eles pudessem ver o que aconteceu hoje.”
O impacto da expropriação é sentido ainda hoje, segundo disse Shepard “Yellow Feather” à BBC.
“Fomos expulsos daquela comunidade… atualmente há apenas 1% de afrodescendentes em Manhattan Beach”, acrescentou.
Agora a família decidiu devolver a propriedade ao condado.
“Pareceu a eles que o melhor a fazer era vender o terreno por US$ 20 milhões, e finalmente recuperar a riqueza que deveria ter passado de geração em geração, e que foi negada a eles por quase um século”, afirmou em comunicado divulgado na terça-feira (03/01) Janice Hahn, presidente do conselho de supervisores do condado, que participou da devolução do imóvel à família.
“É assim que funcionam as reparações, e espero que seja um modelo para os governos de todo o país”.
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