- José Carlos Cueto
- BBC News Mundo
Já aconteceu com muitos de nós. Ouvimos dizer que uma pessoa conhecida com menos de 40 anos foi diagnosticada com câncer, foi operada e passou por tratamentos complexos.
E provavelmente nos perguntamos por que isso está acontecendo com essa pessoa em uma idade tão jovem.
Pode não ser tão comum quanto em adultos com mais de 60 anos, mas pessoas entre 15 e 39 anos não estão isentas de risco e também podem desenvolver câncer.
De fato, acreditar que essa doença é “coisa de idosos” pode causar detecção tardia e prognóstico irreversível.
“Estamos longe de ter o nível adequado de conscientização e conhecimento público sobre o câncer em adultos jovens”, adverte Daniel Stark, líder da Unidade de Oncologia de Adolescentes e Jovens Adultos no Reino Unido, à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Então, quais são os cânceres mais comuns nessa faixa etária? Existe alguma forma de preveni-los?
Os tipos de câncer mais comuns em adultos jovens
De acordo com vários especialistas e diferentes organizações de saúde pública consultadas pela BBC, alguns dos cânceres ou grupos de cânceres mais comuns entre 15 e 39 anos em todo o mundo são:
- Tumor cerebral;
- Câncer de mama;
- Câncer do colo do útero;
- Carcinomas: especialmente no sistema digestivo;
- Câncer de testículos e ovários;
- Câncer de tireoide;
- Linfomas.
Como muitas mudanças morfológicas importantes ocorrem entre as idades de 15 e 39 anos, a incidência desses cânceres varia consideravelmente de acordo com a idade.
“Por exemplo, entre 29 e 39 anos, os carcinomas são muito mais comuns do que em idades anteriores”, explica à BBC a Dra. Annalisa Trama, especialista do Instituto Nacional de Tumores de Milão, na Itália.
“Nas faixas etárias mais jovens, leucemias, linfomas, cânceres do sistema nervoso, sarcomas e tumores genitais são mais comuns”, acrescenta Trama.
A incidência de câncer também varia de acordo com o sexo. As mulheres são mais propensas a desenvolver câncer de mama, tireóide, colo do útero e ovários.
“Enquanto nos homens os diagnósticos mais comuns são linfomas, câncer de testículo, leucemia e tireoide”, afirma o especialista.
No caso da leucemia, é um câncer com maior incidência em mais jovens.
“É uma doença que se torna menos comum após os 8-10 anos de idade”, diz Stark.
Quais são os mais perigosos?
Segundo o professor Stark, os tumores que representam o maior desafio para adolescentes e adultos jovens são os tumores cerebrais e os carcinomas, principalmente os localizados no aparelho digestivo.
“Os tumores cerebrais são um desafio porque as possibilidades de tratamento e o prognóstico de recuperação são extremamente ruins”, diz o especialista.
De acordo com o serviço público de saúde britânico (NHS), os tumores cerebrais podem se manifestar com dores de cabeça, convulsões, tonturas, náuseas recorrentes, problemas de memória, alterações de personalidade, fraqueza progressiva e paralisia em uma parte do corpo e problemas de visão ou fala.
No caso dos tumores do aparelho digestivo, o desafio é que ainda são uma “área em mudança na epidemiologia do câncer”.
“Estamos vendo um rápido aumento de carcinomas nesta área em adultos jovens nos últimos 10-15 anos. É uma doença que raramente vemos, mas agora está longe de ser incomum”, diz Stark.
De acordo com a Sociedade Americana Contra o Câncer, os sintomas de câncer do trato digestivo podem incluir perda de apetite, perda de peso inesperada, dor e desconforto abdominal, sensação de peso no estômago após uma refeição leve, azia, náusea, vômito, inchaço abdominal, sangue nas fezes e anemia.
A organização esclarece que esses sintomas também são comuns em outras doenças, mas se persistirem, deve-se consultar um médico para esclarecer as causas.
Por que os cânceres nessas idades são um desafio tão grande?
Embora as chances de desenvolver câncer em adolescentes e adultos jovens sejam menores do que em idades mais avançadas, esse grupo populacional apresenta certas características que maximizam seu risco quando se trata de tratamento e identificação.
Por exemplo, sendo idades em que ocorrem muitas mudanças fisiológicas, a epidemiologia do câncer inclui tumores pediátricos e adultos.
“Esse grupo também possui biologia tumoral e genômica específica, que difere de crianças e idosos. Além disso, devido à diferença de idade, a farmacologia é diferente, assim como o impacto potencial da eficácia da terapia”, explica Trama.
Soma-se a isso a falta de conscientização de que o câncer é uma possibilidade nessa faixa etária — fenômeno que ocorre tanto em pacientes e familiares quanto em profissionais de saúde.
“É um grupo que também teve participação limitada em pesquisas clínicas e dificuldade de acesso a tratamentos especializados”, diz Trama.
Em certa medida isso se deve ao fato de que, até as últimas décadas, grande parte das pesquisas sobre o câncer se concentrava em tumores infantis ou na população mais adulta, de acordo com Ronald Barr, professor emérito de pediatria da Universidade McMaster, em Hamilton, no Canadá.
“Um adulto desenvolve câncer em uma idade média de 65 anos. Se você pensar bem, aqueles com menos de 40 anos que o desenvolvem são uma proporção relativamente menor e acabam em um limbo onde não são jovens o suficiente ou velhos o suficiente para serem tratados por oncologistas acostumados a tratar pessoas com mais de 60 anos”, diz Barr.
E embora nos últimos anos tenham sido feitos mais esforços para resolver esse problema, os especialistas consultados pela BBC News Mundo apontam que ainda há muito trabalho a ser feito.
Entre o sobrediagnóstico e o subdiagnóstico
Encontrar um equilíbrio entre o problema do sobrediagnóstico e do subdiagnóstico é um dos maiores desafios médicos ao lidar com o câncer em adolescentes e adultos jovens.
Por um lado, há uma proporção substancial de jovens com câncer que nunca são diagnosticados.
“A maioria deles vive em países de baixa e média renda (em regiões como América do Sul, África e Sudeste Asiático), que infelizmente é onde vive o maior número de pessoas”, diz Barr.
“Muitos pacientes nessas regiões podem nunca ir ao hospital ou chegar muito doentes para ter um diagnóstico específico”, acrescenta Stark.
Por motivos como esses, especialistas alertam para a dificuldade de estabelecer dados mais concretos em escala global sobre uma incidência mais precisa de câncer em pessoas mais jovens.
No entanto, o sobrediagnóstico também se tornou um desafio que dificulta tanto estatísticas quanto soluções médicas.
Está acontecendo, por exemplo, com câncer de tireoide. Em países como os Estados Unidos, os cânceres de tireoide estão sendo diagnosticados por exames de ultrassom.
Stark diz que muitas vezes esses testes são realizados por pessoas inexperientes e sem necessidade real de executá-los. Isso resulta em uma imagem distorcida da verdadeira magnitude do câncer de tireoide, com muitos diagnósticos confirmados em casos em que não havia risco real de agravamento.
“Existem cânceres ou estados de câncer que, mesmo que cresçam, podem nunca causar problemas. Um sobrediagnóstico pode tratar um desses cânceres como se fosse uma doença que exige um manejo mais agressivo”, diz Stark.
Isso faz com que alguns pacientes acabem recebendo muito material radioativo, uma grande operação ou medicamentos tóxicos quando apenas precisavam ser monitorados, avaliados e tratados quando o problema se tornasse preocupante.
Recomendações
Trama lista alguns tipos de câncer que têm sido associados a estilos de vida pouco saudáveis e condições como a obesidade: carcinomas do sistema digestivo, câncer de tireoide ou ovário. Em outras palavras, com chances de ser prevenidos seguindo recomendações públicas como as do World Cancer Research Forum (WCRF).
Algumas dessas diretrizes incluem:
- manter peso adequado;
- ser fisicamente ativo;
- ter uma dieta melhor, rica em uma variedade de grãos integrais, vegetais, frutas e legumes;
- evitar alimentos altamente calóricos;
- limitar o consumo de carnes vermelhas e processadas, álcool e bebidas açucaradas.
Especialistas como Stark também pedem maior conscientização.
“Precisamos que os jovens conheçam os sintomas do que pode ser câncer. Precisamos que eles saibam que também podem desenvolvê-lo e precisamos de médicos que levem mais a sério os jovens que vão às consultas de oncologia, em vez de pressupor que não podem desenvolver câncer nessa idade”, diz Stark.
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