Apesar do petróleo ser um commodity, ou seja, uma matéria-prima que tem o preço determinado uniformemente pela oferta e demanda internacional, o preço final para o consumidor da gasolina — e de outros derivados de petróleo, como diesel e gás GLP — varia imensamente ao redor do mundo.
Na última semana (de 7 a 13 de junho) o preço do litro da gasolina para o consumidor ia de US$ 0,02 (R$ 0,11) na Venezuela a US$ 3 (R$ 15,4) em Hong Kong, segundo o ranking Global Petrol Prices, que pesquisa os preços em 168 países, semanalmente na maioria deles.
Além da Venezuela, os países onde a gasolina está mais barata são Líbia (2° lugar), Iran (3°), Síria, Argélia, Kuwait, Angola, Nigéria, Turcomenistão e Malásia.
E os lugares onde ela está mais cara são Hong Kong (168º na ordem do mais barato para o mais caro), Noruega (167°), Dinamarca (166º), Finlândia, Islândia, Grécia, Países Baixos, República Central Africana, Mônaco e Cingapura.
E o Brasil? Fica no meio, em 83º lugar, com a gasolina a US$ 1,41 (R$ 7.25) na média — ou pelo menos ficava na semana passada, antes do reajuste anunciado pela Petrobrás de 5,2% no preço do combustível na refinaria (que compõe 38% do valor para o consumidor final). O ranking com os preços para o consumidor desta semana deve sair na segunda (20).
Motivos da variação
O preço do barril de petróleo — definido internacionalmente — é determinado por dois tipos de fatores. “Os fatores endógenos, ou seja, que têm a ver com a própria indústria, como oferta e demanda”, explica o economista Maurício Canêdo, professor da Fundação Getúlio Vargas, “e fatores exógenos, como guerras, ataques terroristas etc.”
“No momento, o mundo todo está pagando caro pelo barril de petróleo por causa da guerra (na Ucrânia)”, afirma o economista.
Mas por que, então, a gasolina varia tanto de país para país?
“O preço varia de acordo com o câmbio da moeda local para o dólar — e no momento o real está muito desvalorizado em relação ao dólar”, diz Canêdo, “e de outros fatores como a lógica tributária e as políticas de subsídios de governos nacionais.”
Transição energética
Os países que estão no topo do ranking das gasolinas mais baratas são produtores de petróleo ou têm o combustível quase totalmente subsidiado pelo governo. Ou as duas coisas, como é o caso da Venezuela.
Além disso, a variação tem outro padrão: a gasolina tende a ser mais barata em países em desenvolvimento e mais cara em países desenvolvidos — com exceção dos EUA (76°) e da Austrália (77°).
“A carga de impostos sobre o combustível é maior nesses países com o objetivo de desincentivar o seu uso, torná-lo menos competitivo e permitir a transição para energias renováveis”, explica Canêdo.
De maneira geral, os países do ranking onde a gasolina mais cara é resultado de políticas públicas de redução do impacto ambiental “são países onde não há uma desigualdade tão grande como no Brasil, onde a população mais vulnerável é desproporcionalmente afetada pela alta nos combustíveis, especialmente o preço do gás de cozinha”.
O preço da gasolina no Brasil
No Brasil, durante muito tempo, o preço da gasolina não tinha paridade com o preço internacional do barril.
“No passado, o que se fazia era o que chamamos de controle ortodoxo: usar o balanço da Petrobras como ferramenta de controle de preços”, explica Canêdo.
Ou seja, se o preço do barril ou o da gasolina refinada que importamos — porque o Brasil não têm grande capacidade de refino e precisa importar — estivesse muito alto, a Petrobras vendia mais barato do que comprava, ficando no vermelho.
Desde que foi instaurada a política de paridade de preços internacionais (PPI), a Petrobras tenta parear o preço da gasolina na refinaria com o preço internacional.
Mas o valor ainda está defasado, explica Pedro Rodrigues, sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), e deve continuar mesmo com o aumento anunciado nesta sexta (17).
A defasagem média do preço médio da gasolina em relação ao mercado internacional na última semana estava calculada em cerca de 19%, segundo a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom). E segundo o banco Goldman Sachs, o reajuste não foi suficiente para zerar essa defasagem.
É possível segurar os preços?
Com a política de PPI, o governo perdeu a capacidade que tinha antes de controlar os preços da gasolina, do diesel e do gás praticados pela Petrobras, explicam os analistas.
O governo ainda é acionista majoritário da empresa, portanto, indica o presidente e 6 dos 11 membros do conselho de acionistas.
O presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou em maio demitir o presidente da Petrobras, José Mauro Pereira Coelho, que ele mesmo havia indicado, e os conselheiros apontados pelo governo, mas a mudança precisa ser aprovada na empresa, o que não é imediato.
No entanto, mesmo se o presidente e os conselheiros forem trocados, os executivos que os substituírem não têm mais espaço para evitar a paridade de preços por causa de uma série de regras de compliance (conjunto de normas para fazer com que a empresa cumpra regras legais e internas) adotadas pela Petrobras, afirma Pedro Rodrigues, do CBIE.
“O governo tem todo o direito de trocar o presidente da empresa e os conselheiros por pessoas mais próximas, mas os novos não podem simplesmente ignorar as regras. Eles podem responder legalmente como indivíduos se fizerem isso”, explica o analista. “Também causa estranhamento que a troca seja tão frequente (como tem sido no governo Bolsonaro).”
No entanto, o governo ainda pode influenciar o preço para o consumidor através de políticas públicas. Na quarta, o Congresso aprovou um projeto de lei para limitar a 17% a cobrança de ICMS (imposto estadual que incide sobre mercadorias e serviços). O projeto deve ser sancionado por Bolsonaro.
“É uma política pública válida, mas que tem impacto na entrada de recursos. O que precisa ser questionado é se é nossa prioridade nesse momento usar recursos públicos para conter os preços para todo mundo”, afirma Canêdo.
O economista defende que, para proteger as pessoas mais vulneráveis que são desproporcionalmente afetadas pela alta, o governo crie políticas de transferência de renda. “Como um vale-gás, por exemplo”, diz.
Privatizar a Petrobras diminuiria os preços?
Para Maurício Canêdo, a privatização não faria os preços da gasolina caírem — muito pelo contrário.
“Com a privatização os preços seriam totalmente pareados, seria totalmente PPI”, explica ele. “Ou seja, sem a defasagem que temos hoje, eles na verdade iriam aumentar.”
“Há uma série de motivos para fazer a privatização, mas a diminuição dos preços não é um deles”, diz.
Já Rodrigues afirma que, no longo prazo, poderia haver uma série de vantagens no sentido de resolver problemas estruturais que encarecem o combustível no país — mas seria preciso que a privatização fosse feita com muito cuidado e planejamento.
“Com a vinda de investimento privado, é possível conseguir suprir a necessidade de capacidade para refino e criar infraestrutura de transporte”, diz ele. “Mas se a privatização foi feita de qualquer jeito, você corre o risco de substituir o modelo atual por um monopólio privado — o que não traz absolutamente nenhuma vantagem.”
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