• Chris Baraniuk
  • Da BBC Future

Crédito, Grzegorz Kiarszys

Legenda da foto,

As pessoas que moravam nas bases deviam conhecer a ameaça da guerra nuclear

Em uma base militar soviética no meio da floresta na Polônia, a quilômetros da vila mais próxima, a família de um funcionário público passava mais uma manhã de sábado.

As crianças escovaram os dentes rapidamente depois do café da manhã e correram para fora, para brincar de soldados com pistolas de plástico. Seu pai vestiu o uniforme, com o emblema da foice e do martelo brilhando, enquanto sua mãe se sentava para um jogo de xadrez.

Mas eles sabiam que, embaixo dos seus pés, guardadas com o máximo segredo, havia ogivas nucleares, provavelmente muito mais poderosas que as bombas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki em 1945.

“Os comandantes sabiam muito bem que, para sua saúde psicológica, é muito importante criar uma ilusão de vida pacífica no dia a dia”, afirma Grzegorz Kiarszys, arqueólogo da Universidade de Szczecin, na Polônia, que estudou as ruínas e pilhas de lixo em três bases soviéticas de armas nucleares, abandonadas há muito tempo no noroeste da Polônia.

Cada uma dessas bases – Podborsko, Templewo e Brzeźnica Kolonia – foi, um dia, o lar de cerca de 140 pessoas. A maior parte era composta de soldados, mas havia também alguns funcionários públicos e suas famílias imediatas, que foram autorizadas a viver ali.

Kiarszys observou evidências fotográficas que confirmam a presença dessas famílias, mas foram os materiais impressos e o lixo que elas deixaram para trás que revelaram as visões mais surpreendentes sobre a sua vida na Polônia.

O lixo pode contar muito sobre uma pessoa ou uma comunidade. Seu estudo é chamado de garbologia. Nessas antigas bases isoladas, uniformes antigos permanecem se decompondo junto às folhas, ao lado de embalagens de doces, patos de borracha e telefones de brinquedo. O texto em alguns desses materiais confirma sua data e origem: a União Soviética.

Kiarszys afirma que o lixo das bases soviéticas é “completamente diferente” do que você encontraria em uma lixeira polonesa comum na mesma época. Há sapatos de marca do Ocidente, por exemplo, e brinquedos que poderiam ser peças de Lego – coisas que apenas poucas pessoas, como funcionários soviéticos com acesso a moeda estrangeira, poderiam comprar no regime comunista do bloco oriental.

Os moradores locais do oeste da Polônia sabiam que o exército soviético operava diversas instalações naquela parte do país durante a Guerra Fria, mas somente depois da queda da União Soviética em 1991 é que os poloneses souberam como algumas dessas bases eram usadas para armazenar armas nucleares.

“Por muitos anos, eles nos disseram que não havia armas nucleares no território polonês”, afirma Kiarszys. Essas bases escondidas abrigavam um incrível poder de destruição que poderia ter sido lançado durante uma eventual guerra no continente europeu. “A ideia, por si só, era maluca”, segundo o pesquisador. “Mas era assim que os generais soviéticos acreditavam que se daria a guerra na Europa.”

As imagens mostram as descobertas de Kiarszys.

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Interior do bunker da antiga base soviética de Templewo, na Polônia. Não existem plantas dessas bases nos arquivos nacionais da Polônia, de forma que Kiarszys precisou mapeá-las sozinho

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Em uma parte isolada de floresta na Polônia, repousam a céu aberto fragmentos de vidas que um dia eram secretas

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Que tal um jogo de xadrez? Uma peça esquecida há muito tempo entretinha o pessoal militar ou suas famílias

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Os visitantes só acreditaram em Kiarszys quando eles próprios viram o lixo. “Ele realmente mostra o poder da cultura material”, segundo ele

Crédito, Mieczyslaw Zuk

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A escova de dentes é vermelha para combinar com a estrela? Alguns dos tubos usados de creme dental levam a marca “Fluorodent”, em alfabeto cirílico

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Insígnia com a foice e o martelo afixada a um uniforme soviético

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Material militar misturado com lixo comum. “Eles ficavam a vários quilômetros das vilas mais próximas e das guarnições militares maiores”, segundo Kiarszys

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Os soviéticos cavaram trincheiras e túneis em volta das bases, para que fossem usados em caso de defesa

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Armas de brinquedo foram encontradas nas pilhas de lixo. O recipiente de plástico quadrado, que parece ser um frasco de tinta, possui texto em cirílico em alto-relevo

Crédito, Mieczyslaw Zuk

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Em 1974, a Pepsi foi o primeiro produto de consumo norte-americano a ser produzido e comercializado na União Soviética

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Kiarszys examinou imagens de satélites e explorou as bases pessoalmente, para melhor entendê-las

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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A base de Podborsko agora é aberta ao público, como parte de um museu local

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As outras duas bases estão em condições muito mais precárias. Este é o bunker da base de Brzeźnica Kolonia

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Forte símbolo de status para as crianças soviéticas, Lego não era acessível para a maioria na Polônia durante a Guerra Fria, embora esta peça possa ser de outra marca

Crédito, Mieczyslaw Zuk

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As datas e o texto das embalagens de alimentos ajudaram a confirmar a origem do lixo

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Entalhes na casca de uma árvore. O ano (88) é visível, abaixo de inscrições em alfabeto cirílico

Crédito, Mieczyslaw Zuk

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Além de armas de brinquedo, existem bonecos de plástico, aviões em miniatura, tanques, telefones e outros brinquedos

Crédito, Grzegorz Kiarszys

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Os soviéticos deixaram vestígios extraordinários da sua atividade na Polônia, como este campo de futebol e pista de corrida na base de Brzeźnica Kolonia, longe da vila mais próxima

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