A Rússia afirma ter usado armas a laser no campo de batalha na Ucrânia, embora os EUA digam que não viram nenhuma evidência disso, e a Ucrânia tenha ridicularizado a alegação, classificando como propaganda.
Mas, afinal, o que são armas a laser e quão eficazes elas podem ser no conflito?
Yury Borisov, vice-primeiro-ministro russo responsável pelo desenvolvimento militar, disse à TV estatal que um protótipo a laser chamado Zadira estava sendo usado na Ucrânia e que havia queimado um drone ucraniano em cinco segundos a uma distância de 5 km.
Ele se soma a um sistema de laser anterior chamado Peresvet — em homenagem a um monge guerreiro ortodoxo medieval —, que pode ser usado para ofuscar satélites orbitando bem acima da Terra e impedi-los de coletar informações.
“Se o Peresvet cega, então a nova geração de armas a laser leva à destruição física do alvo — destruição térmica, eles queimam”, afirmou Borisov.
No entanto, uma autoridade do Departamento de Defesa dos EUA disse que não viu “nada que corrobore os relatos sobre uso de lasers” na Ucrânia.
Enquanto isso, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, zombou da alegação russa, comparando-a com as chamadas “armas milagrosas” que a Alemanha nazista alegou estar desenvolvendo durante a Segunda Guerra Mundial.
“Quanto mais claro ficava que eles não tinham chance na guerra, mais propaganda havia sobre uma arma incrível que seria tão poderosa a ponto de garantir uma reviravolta”, disse ele em um discurso em vídeo.
“E então vemos que no terceiro mês de uma guerra em grande escala, a Rússia está tentando encontrar sua ‘arma milagrosa’… tudo isso mostra claramente o fracasso completo da missão.”
O que as armas a laser podem — e não podem — fazer
Pouco se sabe sobre o sistema de laser Zadira, mas em 2017, a mídia russa afirmou que a Rosatom, agência nuclear estatal, ajudou a desenvolvê-lo como parte de um programa para criar armas baseadas em novos princípios da física, informou a agência de notícias Reuters.
Mas há pelo menos um país que desenvolveu uma arma a laser. No mês passado, Israel divulgou um vídeo mostrando um sistema de laser derrubando foguetes e drones.
O primeiro-ministro israelense, Naftali Bennett, disse que poderia derrubar drones, morteiros e foguetes por apenas US$ 3,50 por disparo.
“Pode parecer ficção científica, mas é real”, afirmou.
Mas o especialista em defesa antimísseis Uzi Rubin, do Instituto de Estratégia e Segurança de Jerusalém (JISS, na sigla em inglês), acredita que a tecnologia de armas a laser não alteraria o equilíbrio de poder no campo de batalha na Ucrânia.
“Zelensky está certo — não é uma arma milagrosa”, diz ele à BBC.
“Levaram vários segundos para derrubar o UAV (sigla em inglês para “veículo aéreo não tripulado”, mais conhecido como drone). Há maneiras muito melhores de fazer isso, usar um Stinger ou qualquer míssil antiaéreo teria sido mais barato, mais rápido e de maior alcance.”
Os lasers funcionam enviando um feixe de luz infravermelha que aquece seu alvo até que entre em combustão.
Rubin afirma que até mesmo a potência de armas a laser avançadas ainda era muito fraca para fazer uma diferença significativa no campo de batalha, e lembra que estas armas têm uma “taxa de letalidade” baixa.
“Não é como em Star Wars, em que eles apontam uma arma a laser para os vilões, rapidamente apertam um botão, e o vilão explode. Na realidade, é mais como um mero forno de micro-ondas. Se você quiser colocar um copo de água para ferver, leva algum tempo. O laser é a mesma coisa. Você precisa colocá-lo no alvo e esperar até que o aqueça e o destrua”, explica.
O laser só consegue focar em um alvo de cada vez, acrescenta Rubin, enquanto os sistemas de defesa antimísseis podem destruir vários alvos simultaneamente.
Além disso, os lasers são neutralizados pelo mau tempo porque não funcionam na chuva ou na neve e não conseguem penetrar nas nuvens.
No entanto, o “Feixe de Ferro” de Israel tem uma lógica, segundo ele, mas sobretudo como uma forma de economizar dinheiro. Os caros mísseis interceptadores do Domo de Ferro são projetados para proteger as principais cidades dos mísseis que chegam, em vez de morteiros ou drones.
“A guerra com mísseis é uma guerra de recursos. É mais barato fabricar foguetes do que se defender deles. Portanto, tudo o que você pode fazer para reduzir os custos da defesa é útil”, explica.
“As armas de energia podem ser úteis na redução de custos — mas não vão fazer uma revolução.”
Além disso, a Rússia poderia usar lasers no campo de batalha para cegar soldados ucranianos, conforme afirmou o general de brigada aposentado do exército australiano Mick Ryan ao jornal americano Washington Post, embora isso seja proibido de acordo com um protocolo de 1995 adicionado ao tratado da ONU que proíbe armas que causem ferimentos excessivos ou tenham impacto indiscriminado.
A Rússia, os EUA e o Reino Unido estão entre os países signatários do protocolo.
O histórico das ‘armas milagrosas’
A referência de Zelensky às “armas milagrosas” — Wunderwaffen — remete à propaganda nazista alemã disseminada em um momento em que a guerra estava indo mal para eles.
O ministério da Propaganda, dirigido por Joseph Goebbels, tentou elevar o moral da população e manter os alemães acreditando na vitória, insinuando que estavam chegando novas armas especiais que “virariam” a guerra decisivamente a seu favor.
Quando os nazistas começaram a disparar sua bomba voadora V-1 contra a Grã-Bretanha, a máquina de propaganda nazista começou a dizer que isso forçaria o país a abandonar a guerra, de acordo com Michael Neufeld, curador do Smithsonian Museum em Washington, nos EUA.
“A propaganda dizia: Vamos nos vingar e virar esse jogo. Não estou surpreso que Zelensky possa se referir a esse episódio da Segunda Guerra Mundial”, diz ele à BBC.
Houve desilusão quando isso não aconteceu — mas a ideia de que estas novas armas poderiam ter sido decisivas sobrevive até hoje, observa Neufeld, que diz ter passado sua carreira lutando contra isso.
No entanto, ele adverte contra traçar um paralelo muito direto com o anúncio da Rússia sobre sua arma a laser, dizendo que Moscou sempre enalteceu seu arsenal, com referências a armas nucleares e hipersônicas.
“Pode ser prematuro ver isso como um caso de reação porque a guerra está indo mal”, avalia.
“No início da guerra, eles presumiram que falar sobre estas novas armas intimidaria e forçaria a Ucrânia a desistir. E agora eles podem estar dando a volta por cima e dizendo que ainda são superiores.”
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