- Author, Vineet Khare
- Role, BBC Hindi
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Em setembro do ano passado, Ebrima Sajnia viu seu filho morrer lentamente diante de seus olhos.
Sajnia, que trabalha como taxista em Gâmbia, diz que Lamin, de três anos, começaria a frequentar a creche em algumas semanas, quando teve uma febre.
Um médico de uma clínica local prescreveu remédios, incluindo um xarope para tosse, mas a criança febril se recusava a tomá-los.
“Eu forcei Lamin a beber o xarope”, lembra Sajnia, sentado em sua casa em Banjul, capital de Gâmbia.
A situação de Lamin piorou nos dias seguintes.
Ele apresentava dificuldades para comer e até urinar. Quando foi internado, os médicos detectaram problemas renais. Em sete dias, Lamin estava morto.
Ele é uma das cerca de 70 crianças – todas com menos de cinco anos – que morreram em Gâmbia por lesões renais agudas entre julho e outubro do ano passado, depois de consumir um dos quatro xaropes para tosse produzidos por uma empresa indiana chamada Maiden Pharmaceuticals.
Em outubro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) relacionou as mortes aos xaropes, dizendo ter encontrado níveis “inaceitáveis” de toxinas nos medicamentos.
Uma comissão parlamentar gambiana também concluiu, após investigações, que as mortes foram resultado da ingestão dos xaropes pelas crianças.
Tanto a Maiden Pharmaceuticals quanto o governo indiano negam – a Índia disse em dezembro que os xaropes cumpriram padrões de qualidade quando testados domesticamente.
Amadou Camara, presidente da comissão gambiana que investigou as mortes, discorda veementemente dessa avaliação.
“Temos evidências. Testamos essas drogas. [Elas] continham quantidades inaceitáveis de etilenoglicol e dietilenoglicol, e foram importadas diretamente da Índia, fabricadas pela Maiden”, ele diz.
O etilenoglicol e o dietilenoglicol são tóxicos para os seres humanos e podem ser fatais se consumidos.
Perda de confiança
Trata-se de uma situação difícil para Gâmbia, um dos menores países da África, que importa a maior parte de seus medicamentos da Índia.
Em luto, alguns pais e mães dizem que não confiam mais nas drogas produzidas na Índia.
“Quando leio que um remédio é da Índia, não encosto nele”, disse Lamin Danso, que perdeu seu filho de nove meses.
Mas é improvável que a dependência das drogas indianas mude tão cedo.
“A maioria dos farmacêuticos ainda traz medicamentos da Índia – é muito mais barato do que importar medicamentos da América ou da Europa”, diz o jornalista Mustapha Darboe.
A Índia é o maior exportador mundial de medicamentos genéricos, atendendo a grande parte das necessidades médicas dos países em desenvolvimento.
Mas as suspeitas de que suas drogas causaram tragédias como a de Gâmbia – e em outros países como Uzbequistão e Estados Unidos – levantaram questões sobre práticas de fabricação e padrões de qualidade.
“Muitos países estão pensando duas vezes, diante dessa tragédia e do tipo de alerta declarado pela OMS. Eles questionam regularmente. Não é muito confortável. Eu chamo isso de aberração. É uma aberração cara”, diz Udaya Bhaskar, diretor geral do Conselho de Promoção de Exportações Farmacêuticas da Índia.
Ele diz que, embora incidentes como o de Gâmbia e do Uzbequistão tenham “afetado” a imagem da indústria farmacêutica indiana, isso não abalou as exportações.
A Índia exportou medicamentos no valor de US$ 25,4 bilhões (R$ 125 bilhões) no ano fiscal encerrado em março de 2023. Destes, US$ 3,6 bilhões (R$ 18 bi) foram para países da África.
Bhaskar diz que o país já exportou mais de US$ 6 bilhões (R$ 30 bi) em medicamentos no primeiro trimestre do atual ano fiscal.
Mas a Índia anunciou medidas de controle, como obrigar empresas a testarem suas amostras de xarope em laboratórios aprovados pelo governo antes de exportá-los.
Gâmbia, que não possui laboratórios de testes de medicamentos, também tornou isso obrigatório para medicamentos exportados da Índia desde julho.
A Índia também estabeleceu prazos para que suas empresas farmacêuticas adotem as boas práticas de fabricação padrão da OMS.
Mas ativistas indianos alegam que o país tem há muito tempo um “sistema de produção de duas classes”.
“No que exportamos para os EUA e Europa, tentamos usar padrões muito mais rigorosos em comparação com medicamentos feitos para consumo local e exportados para mercados menos regulamentados”, diz Dinesh Thakur, ativista de saúde pública.
Bhaskar discorda, dizendo que vários países da África – terceiro maior destino de exportação da Índia – têm mecanismos regulatórios “robustos”.
Um relatório recente do governo gambiano sobre a tragédia recomendou a criação de um laboratório de controle de qualidade e dois reguladores de medicamentos foram demitidos.
“Sabemos da raiva na sociedade. Sabemos da raiva entre as vítimas”, disse Billay G. Tunkara, o líder da maioria na Assembleia Nacional de Gâmbia e chefe de negócios do governo.
Mas pais arrasados dizem que nada mudou no setor de saúde do país desde o ano passado – enquanto o sistema médico tem dificuldades para lidar com o alto fluxo de casos de febre, alguns pais foram forçados a conseguir dinheiro para enviar seus filhos ao vizinho Senegal.
Momodou Dambelleh, um vendedor de madeira, foi um deles.
Ele viu sua filha de 22 meses Aminata pela última vez em uma videochamada. Ela estava deitada inconsciente em uma cama de hospital.
“Eu só via a cabeça dela se movendo. Eu tentava fazê-la saber que era eu, seu pai”, diz ele.
Isso aconteceu pouco antes de ela morrer.
“Aqueles de cometeram esse crime, incluindo o ministro da saúde, devem enfrentar toda a força da lei”, diz Ebrima EF Saidy, porta-voz de um grupo que representa os pais das vítimas.
Ahmadou Lamin Samateh, ministro da Saúde de Gâmbia, não respondeu a um pedido de entrevista da BBC.
Um ano depois, muitos pais dizem que estão determinados a garantir que outras pessoas em Gâmbia não tenham que passar por essa dor novamente.
As famílias de 19 crianças entraram com um processo contra as autoridades de saúde locais e a Maiden Pharmaceuticals no tribunal superior da Gâmbia.
Eles dizem que não hesitarão em procurar também os tribunais indianos e internacionais, se necessário.
“A negligência do governo fez com que as crianças morressem”, diz Sagnia, que faz parte do1 grupo.
Fonte: BBC
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