Donna Langley é uma mulher com planos ambiciosos, inclusive enviar Tom Cruise ao espaço.
Como presidente do Universal Filmed Entertainment Group, ela é a primeira britânica a dirigir um grande estúdio de cinema americano.
Isso a torna uma das pessoas mais poderosas de Hollywood. Nada mal para quem chegou a Los Angeles com 20 e poucos anos sem nenhum contato no ramo.
Trinta anos depois, Langley diz que ainda se sente “culturalmente muito inglesa, mesmo que meu sotaque varie um pouco”.
Langley mudou os rumos da Universal e tem dirigido o mais antigo estúdio de cinema dos Estados Unidos em meio às dificuldades de uma pandemia e da ascensão das plataformas de streaming.
Ela é impressionante e pé no chão – mas o projeto que a Universal está desenvolvendo com Cruise é literalmente de outro mundo.
Langley disse à BBC News que Cruise planeja levar um foguete até a Estação Espacial Internacional. A trama do filme, que Cruise e o diretor Doug Liman apresentaram a ela, “na verdade, acontece na Terra, e, então, o personagem precisa ir ao espaço para salvar o dia”.
A esperança, ela acrescenta, é que Cruise seja “o primeiro civil a fazer uma caminhada espacial fora da estação”.
Para a Universal, o filme espacial claramente ainda é uma aspiração neste estágio. Mais definitiva é a lista de 44 filmes anunciados para 2022/23, enquanto a indústria tenta voltar aos níveis pré-covid-19.
Haverá as franquias lucrativas (entre elas, outro filme dos Trolls; o 10º Velozes e Furiosos; e 4º Meu Malvado Favorito). Mas também há uma gama mais criativa.
Langley atraiu Steven Spielberg de volta ao estúdio onde ele fez Tubarão (1975) e E.T.: O Extraterrestre (1982). Os Fabelmans acaba de estrear no Festival de Cinema de Toronto. Christopher Nolan lançará seu próximo filme Oppenheimer com a Universal depois de trocar a Warner Bros pelo estúdio de Langley.
She Said é estrelado por Carey Mulligan como uma dos jornalistas que desvendaram o escândalo de Harvey Weinstein.
‘Instinto’ para o sucesso
Escolher filmes com potencial de sucesso é “instinto”. Em vez de racionalizar as decisões através das lentes do modelo de negócios, trata-se de “sentir a história em um nível muito humano”, diz ela.
Seu ponto de vista vem do aprendizado no início de sua carreira sobre “fazer filmes voltados para um público específico”, muitas vezes pessoas tradicionalmente ignoradas por Hollywood.
Ela descobriu que filmes atrativos para mulheres ou minorias étnicas, por exemplo, eram “um bom negócio”. “A quantidade de dinheiro que [os filmes] ganham é relativa ao que eles custam, então eles são extremamente lucrativos.”
Ela defendeu Straight Outta Compton – A História do N.W.A. (2015), filme que retrata a ascensão do grupo de hip-hop e que arrecadou US$ 201 milhões (R$ 1,09 bilhão) em todo o mundo.
Langley lutou por Mamma Mia! – O Filme (2008) quando outros não estavam interessados. O filme, baseado no catálogo clássico do grupo musical Abba, foi um sucesso estrondoso, com US$ 600 milhões (R$ 3,12 bilhões) em bilheteria.
“São filmes que eu não via como inerentemente arriscados. É fácil para mim dizer isso hoje, quando eles já se provaram um sucesso.”
Mas, para Langley, há um ponto comum para esse sucesso, mesmo que outros não o tenham visto. Eram histórias universais com as quais o público poderia se identificar.
Phyllida Lloyd, diretora de Mamma Mia!, elogia a “clareza e calma” de Langley. Ela diz que a executiva da Universal tinha “uma abordagem de negócios”. “Ela realmente não se preocupava com as pequenas coisas.”
Sharon Waxman, editora-chefe do site The Wrap, uma das publicações mais influentes de Hollywood, descreve Langley como “muito respeitada”. Claro que nem tudo é sucesso, e Waxman aponta para o decepcionante fim de semana de estreia de Bros – Uma História de Amor, a comédia romântica gay da Universal, o primeiro grande estúdio a fazer um filme desse tipo.
Mas ela credita isso ao fato de ela correr riscos. Bros, por exemplo, “não é um filme para o qual todos os estúdios dariam o sinal verde”.
Fã do Abba
Contar histórias (e o Abba), diz Langley, foi uma parte importante de sua infância. Seu pai biológico era egípcio, e ela foi adotada ainda bebê. Sua mãe era uma ativista (“ela me fez bater lata na rua em nome do Greenpeace ou do desarmamento nuclear”), enquanto seu pai trabalhava para a Autoridade de Aviação Civil, órgão que regula o setor no Reino Unido.
Ir ao cinema não era um evento familiar comum, embora ela se lembre de sua irmã levá-la para ver um filme do show do Abba na década de 1970 (que foi como “90 minutos no céu, eu estava tão feliz”). Em vez disso, a família lia muito, e talvez isso a atraiu para o cinema.
“Como britânicos, crescemos com um profundo amor pela literatura”, diz ela. Livre para passear na Ilha de Wight, onde cresceu, “minha imaginação corria solta com a história do lugar, fosse contrabandistas ou aristocracia”.
Na ilha, sua descendência significava que ela era vista, como diz maliciosamente, como “exótica”, acrescentando: “Isso me deu uma sensação de independência”. Ela diz que foi “um pouco perseguida” na escola e achou no humor uma forma de lidar com os “momentos mais difíceis”.
Então, como aquele garota se tornou tão um nome tão importante em Hollywood? Langley me disse que “não via futuro” para si mesma no Reino Unido no início dos anos 1990, embora “não tivesse ideia de que eu iria trabalhar no cinema”. Ela admite “Eu tenho momentos em que olho para trás e penso ‘como tudo isso aconteceu?'”.
Langley tinha apenas 22 anos quando chegou a Los Angeles com uma carta de apresentação para um agente literário, planejando ficar apenas alguns meses. Mas “ficou óbvio que eu precisava ficar”. Ela achou os Estados Unidos “menos restritivos”, me dizendo que enquanto a Grã-Bretanha era muito hierárquica, na América, “se você tem uma ideia, uma ética de trabalho, você pode fazê-lo”.
Ela teve sua primeira chance enquanto trabalhava em uma boate no Sunset Boulevard de Hollywood. Um dos frequentadores a contratou para o estúdio New Line Cinema. Ela credita seu sucesso a “um pouco de autoconfiança delirante” e muito trabalho duro, embora a Hollywood da época não fosse “para os fracos de coração, você tinha que ter alguma ousadia”.
Langley está comprometida com o cinema britânico. Jurassic World: Domínio (2022), da Universal, filmado nos arredores de Londres, foi o primeiro blockbuster de Hollywood a retomar as filmagens durante a pandemia, e, em breve, começará a produção de Wicked no Reino Unido.
Ben Roberts, presidente do British Film Institute, organização que promove a indústria cinematográfica britânica, me disse que ela é “uma das executivas britânicas de maior sucesso no ramo – e estamos muito satisfeitos que a Universal tenha decidido produzir tantos de seus filmes aqui no Reino Unido”.
Com o futuro do cinema ainda em jogo, Langley aceita que o streaming de filmes veio para ficar. Ela ganhou a fúria das redes de cinema quando decidiu durante a pandemia lançar o novo Trolls direto em uma plataforma deste tipo. Ela diz que foi um “momento divisor de águas”. Certamente rompeu a tradição de grandes filmes chegarem primeiro aos cinemas.
Waxman acredita que os maiores desafios de Langley agora são “reabastecer o pipeline da Universal com os tipos de sucessos de bilheteria, como a franquia Velozes e Furiosos, que gerarão sucessos globais de bilhões de dólares”.
Para Langley, a “questão de US$ 100 bilhões” é o que atrairá o público de volta aos cinemas. Ela aceita que parte disso acontecerá com “os grandes filmes de efeitos especiais… mas o que mais?”.
Enquanto “o nível de exigência está ficando mais alto” para os tipos de filmes que as pessoas querer sair de casa para assistir, ela acredita que “para os filmes serem importantes, para fazê-los se conectarem com o zeitgeist cultural, para criar estrelas de cinema e para criar diretores e carreiras, realmente precisa se oferecida uma experiência cinematográfica”, diz ela.
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