- Leandro Prazeres
- Da BBC News Brasil em Brasília
A pouco menos de seis meses para as eleições deste ano, a maior parte dos pré-candidatos às eleições presidenciais reforça suas equipes e prepara estratégias para atrair o voto do eleitorado jovem, particularmente entre 16 e 24 anos de idade. Entre as táticas que deverão ser usadas por eles estão a aposta no endosso de influenciadores, presença em aplicativos até então negligenciados, como TikTok, e produção de conteúdo que possa viralizar ou virar meme.
Especialistas ouvidos afirmam que os principais desafios para conquistar o eleitorado jovem são: entender a forma como esse público se comunica; ter conhecimento sobre seus principais anseios, estar presente nas redes sociais onde eles se concentram e produzir com linguagem adequada um conteúdo voltado para cada uma dessas redes.
A BBC News Brasil procurou as campanhas dos principais pré-candidatos e pré-candidatas às eleições presidenciais. O critério adotado foi falar com aqueles vêm pontuando nas principais pesquisas de intenção de voto divulgadas nos últimos meses.
As candidaturas contatadas pela reportagem foram de: Jair Bolsonaro (PL), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), André Janones (Avante), João Doria (PSDB), Luis Felipe D’Ávila (Novo) e Vera Lúcia (PSTU).
Apesar de pontuarem nas pesquisas de intenção mais recentes, o ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro (União Brasil) e o ex-governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite (PSDB) não foram procurados pela reportagem porque ambos anunciaram que abriram mão de suas pré-candidaturas nas últimas semanas.
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de março deste ano mostram que há 21,6 milhões de eleitores entre 16 e 24 anos de idade aptos a votar. Esse número representa apenas 14,7% do total dos eleitores do país, em torno de 146 milhões.
Mas apesar da participação relativamente pequena, os estrategistas das campanhas entendem que, em uma campanha que promete ser acirrada, cada voto é importante e o público jovem não pode ser deixado de lado.
Nas últimas semanas, o TSE, políticos e artistas incentivaram os jovens brasileiros a tirarem o título de eleitor. Entre os artistas que se engajaram nessa campanha estão atores estrangeiros como Leonardo Di Caprio e Mark Ruffalo, que usaram suas redes sociais para convocar os jovens a participar das eleições.
O objetivo é reverter a tendência de baixo interesse demonstrado por esse público em relação à disputa eleitoral. Pesquisa do Instituto Datafolha divulgada em março mostra que o público entre 16 e 24 anos apresenta a menor taxa de interesse pelas eleições. Apenas 31% dos entrevistados nessa faixa etária afirmaram ter “grande” interesse sobre o assunto. Nas outras faixas, o percentual é sempre superior a 40%.
O consenso entre os marqueteiros e especialistas ouvidos pela BBC News Brasil é de que o principal canal para atingir esse público são as redes sociais. Ainda de acordo com o Datafolha, 84% dos brasileiros com mais de 16 anos de idade (que já têm o direito de votar, portanto) têm contas em redes sociais.
“As redes sociais são uma espécie de praça onde o jovem está e por onde ele circula. Se você quiser falar com ele, tem que ir nessa praça. E ela tem vários cantos, com muitas tribos. E você precisa estar em todos eles”, afirma o publicitário Mateus Braga, consultor na área de mídias sociais.
Lula: influenciadores e reconstrução de imagem
As principais pesquisas de intenção de voto apontam que Lula lidera entre o público mais jovem. Segundo o Datafolha, em março Lula aparecia com 51% das intenções de voto entre quem tem 16 e 24 anos de idade. Bolsonaro vinha em segundo, com 22%. De acordo com o PoderData, a tendência é semelhante: Lula tem 51% das intenções de voto nessa faixa, enquanto Bolsonaro aparece com 29%.
Apesar da liderança, a campanha de Lula vem sendo criticada por aliados e apoiadores justamente por falhar em se comunicar com o público jovem.
A principal queixa é a de que a coordenação da sua pré-candidatura atuava de forma “analógica” em uma campanha em que o virtual deverá ser fundamental. Nas últimas semanas, o PT trocou o marqueteiro da candidatura e o jornalista Franklin Martins, que era responsável pela comunicação, deixou o posto.
Segundo a secretária de juventude do PT, Nádia Garcia, a estratégia de Lula e do PT voltada para o eleitorado mais jovem vem sendo discutida tanto pela coordenação da campanha quanto pelo comando do partido.
Ela diz que entre as principais estratégias para consolidar a liderança de Lula neste segmento está ampliar sua presença nas redes sociais e se aproximar de influenciadores digitais que tenham identificação com as pautas defendidas por ele.
Atualmente, Lula é um dos políticos brasileiros com o maior número de seguidores em redes sociais, mas está bem atrás de Bolsonaro na maioria delas. No Instagram, por exemplo, Lula tem 4,8 milhões de seguidores, enquanto o presidente tem 19,7 milhões.
Além disso, Lula ainda não tem uma conta no TikTok, aplicativo preferido do público entre 16 e 24 anos e onde Bolsonaro tem um perfil com 1,4 milhão de seguidores. Nesta semana, a comunicação do PT anunciou que Lula teria um perfil verificado no TikTok e no Kwai.
A estratégia de se aproximar de influenciadores digitais é outro braço da tentativa de se aproximar desse eleitorado. Experiências como uma postagem de Lula com a influenciadora digital Deolane Bezerra, que tem 13,9 milhões de seguidores no Instagram, são vistas como um sucesso. Só no perfil da influenciadora, a foto teve 2,1 milhões de visualizações. No perfil de Lula no Twitter, foram mais de 229 mil curtidas.
“A gente pretende, sim, se aproximar de influencers que se identifiquem com as nossas pautas. Isso tem um retorno enorme e ajuda a chegar nos eleitores jovens que estão nas redes sociais”, diz Nádia Garcia.
Outro “case” considerado de sucesso pela campanha de Lula é a participação dele no podcast Podpah, em dezembro de 2021. O podast é um dos mais populares do Brasil e tem 5,6 milhões de seguidores no YouTube. Até agora, a entrevista já foi visualizada 8,9 milhões de vezes.
A secretária explica que um dos grandes desafios de Lula em relação ao voto do jovem é transmitir a ele o que ela classificou como o “legado” de Lula.
“O Lula é muito conhecido, mas a maior parte dos jovens não sabe o que era o Brasil antes do Lula ser presidente e também cresceu com o Lula fora da presidência. Só conhecem o Lula descrito pela Operação Lava Jato. A gente está tentando encontrar formas de contar pra esse jovem qual foi o legado do presidente, principalmente em áreas como a educação, que é muito importante pra ele”, explica.
Para o publicitário Mateus Braga, este é, exatamente, o principal desafio da candidatura de Lula junto ao público jovem.
“A equipe do Lula precisa explicar os casos de corrupção que ocorreram nos governos do PT para esse jovem que não sabe ou não lembra como foram essas gestões. Isso é importante porque esse eleitor não viveu outros momentos dos governos petistas e vai ser bombardeando com informações dos adversários sobre corrupção”, explica Braga.
Bolsonaro: ironias, Anitta e presença maciça
Parte dos analistas políticos afirmam que Jair Bolsonaro conseguiu se eleger, em grande parte, por conta do sucesso que teve nas redes sociais, em 2018. A julgar pelos números, a estratégia continua a render frutos.
Entre os principais pré-candidatos à presidência, Bolsonaro é o que tem o maior número de seguidores em quase todas as redes sociais mais usadas pelo público brasileiro. No Instagram, ele lidera com 19,7 milhões de seguidores. No Facebook, são 14 milhões. No TikTok, onde chegou ainda no ano passado, já são mais de 1,4 milhão.
Apesar disso, o presidente ainda está atrás de Lula na faixa etária entre 16 e 24 anos, oscilando entre 22% e 29% das intenções de voto.
A pré-campanha de Jair Bolsonaro não atendeu aos contatos da reportagem.
O pesquisador Eurico Mattos, da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV DAPP), analisou dados de redes sociais entre os dias 4 e 24 de abril e detectou que Bolsonaro passou a adotar uma linguagem mais próxima da utilizada pelo público mais jovem.
“Ele passou a usar emojis, ironias e um pouco de sarcasmo. Esse tipo de linguagem gera um engajamento grande nessas redes sociais, especialmente no público jovem”, explicou Mattos.
Um dos exemplos em que Bolsonaro aconteceu em 13 de abril.
Um usuário do Twitter questionou o presidente sobre o motivo de o governo impor sigilo de 100 sobre documentos relacionados a suspeitas de irregularidades. O perfil de Bolsonaro no Twitter respondeu de forma irônica.
“Em 100 anos saberá”, disse Bolsonaro.
Outra estratégia adotada por Bolsonaro, segundo Eurico, foi a interação dos perfis do presidente com personalidades populares no segmento jovem. Um exemplo aconteceu no mês passado, quando ele interagiu com a cantora Anitta.
Bolsonaro compartilhou uma postagem da artista em que ela defendeu que a bandeira brasileira não fosse apropriada por grupos políticos. O caso causou comoção porque a cantora se manifestou afirmando que seu nome estaria sendo usado para gerar “buzz” ou engajamento. A artista já criticou o presidente diversas vezes e, neste episódio, ela acabou bloqueando Bolsonaro em suas redes sociais.
Eurico diz que mesmo as chamadas “tretas” com celebridades notoriamente contrárias a ele podem ser interessantes para Bolsonaro.
“Esse tipo de estratégia permite que Bolsonaro entre em uma parte do público no qual ele não tinha presença antes. Esse engajamento, mesmo tendo um viés aparentemente negativo, pode ser bom para ele, especialmente por envolver um público jovem”, explicou.
Além do grande número de seguidores, outro fator tem contribuído para a manutenção da popularidade de Bolsonaro nas redes sociais é o que alguns analistas classificam como “espontaneidade” do presidente ao se comunicar. Isso faria sucesso, em especial, em redes como o TikTok, uma das favoritas do público jovem.
A pesquisadora Maria Carolina Lopes é especialista em democracia e comunicação digital e analisou as interações envolvendo o nome de Bolsonaro e de Lula no TikTok. Segundo os dados que ela coletou, as interações envolvendo o presidente são até 13 vezes mais volumosas que as de Lula.
De acordo com ela, essa disparidade acontece por dois motivos. O primeiro é a existência de uma ampla rede de pessoas produzindo conteúdo sobre ele na rede. O segundo é o fato de ele já ter um perfil na rede.
“Essa combinação faz com que as interações sobre Bolsonaro sejam muito maiores que as do Lula, por exemplo. Além disso, a gente percebe que há um domínio da linguagem. Os vídeos sobre Bolsonaro são mais toscos do ponto de vista estético do que os do Lula. Mas é essa a linguagem que funciona no TikTok”, explica.
Para o publicitário Mateus Braga, o principal desafio para a candidatura de Bolsonaro está nas pautas adotadas pelo presidente.
“Os temas abordados pelo presidente são de uma agenda muito tradicionalista, de costumes. Isso não gera tanta empatia do eleitorado jovem. Me parece que há uma certa desconexão dele com esse público”, explica Braga.
Ciro Gomes: bigdata e estratégia
Se, para Mateus Braga, Bolsonaro adota um discurso desconectado com o público jovem, por outro, Ciro Gomes é, na sua avaliação, o pré-candidato que está melhor posicionado junto a essa faixa do eleitorado. Isso aconteceria porque o político do PDT começou, há mais de um ano, a intensificar sua presença em redes sociais como o TikTok e o Twitch.
“O Ciro é quem está jogando melhor. Ele entendeu que, nessa praça onde os jovens estão, não adianta chegar de terno e gravata. Ele foi o candidato que, numa metáfora, conseguiu tirar o terno e conversar de igual pra igual com esse público”, diz o publicitário Mateus Braga.
Apesar desse empenho, Ciro tem apenas 6% das intenções de voto do público entre 16 e 24 anos, segundo pesquisa mais recente do Datafolha.
A campanha de Ciro vem sendo tocada pelo marqueteiro João Santana, que já trabalhou para campanhas petistas e foi alvo da Operação Lava Jato.
O coordenador de redes da pré-campanha de Ciro, Lucas Fontelles, diz que sua equipe vem utilizando análise de bigdata (grandes quantidades de dados) e pesquisas qualitativas para avaliar quais são as demandas do público jovem. Segundo ele, esse segmento foi dividido em dois grupos.
O primeiro iria dos 16 aos 20 anos, aproximadamente. Nessa faixa, a principal preocupação seria o acesso à universidade. A outra iria dos 21 aos 24 anos. Nesse segmento, o foco é a inserção no mercado de trabalho.
“A gente faz uma coleta de dados e analisamos as redes pra saber o que os principais influencers nessa faixa etária estão comunicando. Nós cruzamos esses dados com as pesquisas qualitativas que fazemos e também ouvimos bastante a militância do partido”, explica.
É com base nessa análise que a equipe criou formatos diferentes para tentar aproximar o candidato dessa faixa etária. Entre eles está o “Ciro Games”, uma espécie de programa no qual Ciro interage enquanto joga videogame.
Fontelles explica que outra estratégia a ser adotada pela equipe é tentar atrair o endosso de influenciadores de digitais. Ele diz, no entanto, que essa estratégia vem esbarrando nas cláusulas contratuais dessas personalidades. Muitas estariam evitando se posicionar com receio de perder patrocinadores e contratos.
“A gente mapeou influenciadores digitais que gostam do Ciro e que poderiam nos endossar. O problema é que como a política está muito polarizada, muitos estão com receio de se manifestar e ter prejuízos financeiros. A gente espera que com o avanço da corrida eleitoral, esse cenário mude”, afirma.
Doria: corrida contra a formalidade
O ex-governador de São Paulo enfrenta um paradoxo. O empresário que já foi estrela da versão brasileira do programa de TV O Aprendiz vem enfrentando dificuldades em decolar nas pesquisas. Em março, segundo o Datafolha, ele tinha apenas 2% das intenções de voto. Entre os eleitores de 16 a 24 anos, ele tinha apenas 3% da preferência.
Para reverter essa tendência, Doria profissionalizou a comunicação de sua pré-candidatura e sua equipe aposta alto no marketing digital. Entre as estratégias adotadas pelo ex-governador, está ampliar sua presença nas redes sociais, interagir com celebridades que atinjam o público mais jovem e produzir conteúdo específico para cada tipo de rede social.
“A gente vem se engajando em situações consideradas importantes para esse segmento como a campanha para emissão do título de eleitor ou quando o Doria parabenizou a Anitta quando ela alcançou a liderança na lista do Spotify”, explica o coordenador de planejamento e comunicação digital da campanha de João Doria, o publicitário Daniel Braga.
Uma das táticas que deverão ser usadas por Braga e sua equipe durante a campanha é a customização do conteúdo de acordo com as redes sociais. A ideia é adotar a linguagem utilizada em redes sociais como o TikTok ou Kwai em vez de simplesmente repostar conteúdo de outras mídias e que teria menos chances de viralizar.
“Não adianta a gente pegar um vídeo lindo com qualidade de cinema e jogar no Tik Tok. Não é isso que o jovem quer ver. A gente tem pensado muito sobre como vamos chegar nesse jovem com conteúdos que façam sentido pra ele”, explica o publicitário.
Daniel Braga explica o principal desafio de Doria para se aproximar desse segmento é a grande quantidade do público que não o conhece e a sua “formalidade”.
“O João (Doria) é muito formal. Ele tem essa coisa da liturgia do cargo e isso acaba não criando uma proximidade tão grande assim com o jovem”, explica o publicitário.
A campanha de Felipe D’Ávila, do Novo, disse estar presente no Twitter, Instagram, Facebook, Youtube, Tik Tok e WhatsApp. Por meio de nota, a campanha disse utilizar o monitoramento de redes sociais e tendências como ferramentas para identificar as necessidades do público jovem.
Ainda de acordo com a campanha, as principais preocupações dessa faixa do eleitorado são: renda e emprego. De acordo com a nota, o Novo não pretende procurar o endosso de influenciadores digitais para alavancar a candidatura de D’Ávila.
O coordenador nacional de comunicação do PSTU, Diego Cruz, afirma que a pré-campanha de Vera Lúcia à presidência está em fase incipiente e que as estratégias de comunicação para o eleitorado jovem ainda estão sendo definidas.
“Nosso trabalho de comunicação é militante e não temos uma empresa específica para isso. Devemos entrar no Tik Tok, mas ainda não temos uma data”, afirmou.
A assessoria do deputado André Janones foi contatada pela BBC News Brasil, mas não houve retorno.
A equipe de Simone Tebet também foi contatada, mas nenhuma resposta foi enviada.
O publicitário Mateus Braga explica que candidatos com menos popularidade, como a senadora Simone Tebet, enfrentam um desafio a mais na tentativa de atrair o voto jovem. Segundo ele, é importante se fazer conhecido.
“No caso da Simone Tebet, por exemplo, ela precisa ser conhecida pelo público jovem. Ela precisa encontrar soluções que façam com que ela comece a se comunicar com essa faixa do eleitorado”, disse.
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