- Bernd Debusmann Jr & Nathan Williams
- BBC News
Dois ônibus transportando imigrantes foram enviados do Texas para a residência da vice-presidente americana, Kamala Harris, em Washington, na quinta-feira (15/09), em meio a uma crescente disputa política sobre imigração.
O governador republicano do Estado disse que a medida foi intencional e fez um apelo por políticas de imigração mais rígidas.
O episódio aconteceu um dia depois de a Flórida enviar imigrantes para uma ilha de Massachusetts.
Ambos os Estados parecem estar intensificando uma tática na qual Estados com governadores republicanos enviam migrantes para regiões democratas.
À medida que cresce a tensão política em relação ao número de pessoas que chegam à fronteira EUA-México, Estados como Texas e Arizona enviam milhares de imigrantes para cidades como Chicago, Nova York e Washington, que eles acusam de não cumprir plenamente as leis de imigração.
Embora especialistas jurídicos digam que a tática provavelmente será contestada no tribunal, ainda não está claro qual seria a base legal para tal contestação.
Grupos de imigração em Washington e na próspera ilha de Martha’s Vineyard, em Massachusetts, disseram que não receberam nenhum aviso prévio sobre as chegadas.
Imagens exibidas na rede de televisão Fox News mostraram dois ônibus (supostamente transportando entre 75 e 100 pessoas) chegando perto da residência da vice-presidente — e imigrantes, em sua maioria venezuelanos, recolhendo seus pertences e parados nas proximidades. Uma organização não-governamental teria posteriormente os levado para uma igreja.
“Harris afirma que nossa fronteira é ‘segura’ e nega a crise”, escreveu mais tarde o governador do Texas, Greg Abbott, no Twitter. “Estamos enviando imigrantes para seu quintal para pedir ao governo Biden que faça seu trabalho e proteja a fronteira.”
‘Estamos no limbo’
Entre os imigrantes nos ônibus em Washington, estavam Delinyer Mendoza e sua companheira Maybel, um jovem casal venezuelano que chegou aos EUA há cinco dias após uma árdua jornada pela América Central e México.
Embora as autoridades do Texas tenham dito ao casal que estavam indo para Washington, os dois só souberam que estavam na casa da vice-presidente quando foram informados por jornalistas.
“Nós não sabíamos”, diz Maybel. “Estamos descobrindo isso por vocês… estamos no limbo, e estávamos andando por aí sem saber onde estávamos.”
O casal afirmou que planeja passar o dia com uma organização humanitária local antes de seguir para o norte, para Nova York, onde Mendoza tem família.
Outro migrante, o cubano Leonardo Perdomo, disse à agência de notícias Reuters que embarcou no ônibus no Texas depois que autoridades ofereceram a ele passagem para Washington “de graça”.
Uma voluntária local que ajuda os migrantes, Carla Bustillos, contou que as organizações de imigração só foram informadas sobre as chegadas no último minuto.
“Enquanto estamos fazendo este espetáculo político, temos seres humanos sentindo que seu sofrimento está sendo explorado”, afirmou.
Em um movimento semelhante na quarta-feira, dois aviões transportando migrantes foram enviados para Martha’s Vineyard, em Massachusetts. O balneário é um destino de verão tradicional para estrelas de Hollywood, e o ex-presidente Barack Obama está entre aqueles que têm uma casa de férias lá.
Os migrantes, incluindo crianças, chegaram por volta das 15h (horário local) de quarta-feira sem qualquer aviso, de acordo com o senador do Estado de Massachusetts Julian Cyr.
As autoridades e voluntários “moveram céu e terra” para preparar uma resposta, como “faríamos no caso de um furacão”, disse ele. Os migrantes receberam comida e roupas, além de serem submetidos a testes para covid-19.
Muitos não sabiam onde estavam, de acordo com o deputado estadual de Massachusetts Dylan Fernandes. Eles haviam sido informados que receberiam moradia e emprego, segundo ele.
No Twitter, Fernandes descreveu a medida como um plano “diabólico e desumano” para usar “vidas humanas — homens, mulheres e crianças — como peões políticos”.
Ao falar em um evento na Flórida, o governador Ron DeSantis disse que o Estado está disposto a ajudar a facilitar a movimentação de migrantes para poderem ir a “pastos mais verdes”.
Ele também disse que a Flórida não era um Estado “santuário”. As chamadas cidades-santuário nos EUA são cidades que têm políticas para ajudar imigrantes sem documentação.
“Todas aquelas pessoas em Washington e Nova York batiam no peito quando Trump era presidente, dizendo como estavam orgulhosas de serem jurisdições santuário”, afirmou DeSantis.
“No momento em que uma pequena fração do que essas cidades fronteiriças lidam todos os dias é levado até sua porta, elas de repente enlouquecem.”
Aleksander Cuic, advogado de imigração e diretor da Clínica de Imigração da faculdade de direito da Case Western Reserve University, afirma que, embora acredite que os esforços para realocar migrantes desta maneira serão contestados legalmente, ainda não está claro que leis — se for o caso — podem ter sido violadas.
“A grande questão é o que está sendo dito a eles, e se há algum tipo de fraude ou incentivo”, diz ele à BBC.
“Mas como alguém vai saber se não há nada escrito? Pode ser que eles [os migrantes] estejam dizendo de bom grado que irão se houver empregos e oportunidades.”
Cuic acrescenta que as autoridades do Texas e da Flórida provavelmente vão argumentar que “estão fazendo a mesma coisa” que o governo, que movimenta regularmente imigrantes detidos por todo o país.
O governador DeSantis já havia citado Martha’s Vineyard como um possível destino para os migrantes enviados para fora do seu estado, dizendo a jornalistas no ano passado que, se fossem, a “fronteira estaria segura no dia seguinte”.
Neste ano, deputados da Flórida reservaram US$ 12 milhões para o transporte de migrantes.
Não está claro quantos migrantes a Flórida planeja enviar para outros Estados. A BBC entrou em contato com o gabinete do governador DeSantis para comentar.
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