- Author, Merlyn Thomas e Jake Horton
- Role, BBC Verify
À medida que o número notificado de palestinos mortos em Gaza passa de 30 mil, Israel é alvo de preocupações cada vez maiores pelo número de civis mortos, além de pressão para provar que está eliminando o Hamas, como prometeu após 7 de outubro.
A BBC Verify, unidade de checagem da BBC, analisou as declarações sobre quantos combatentes do Hamas já foram mortos no conflito.
Os militares israelenses afirmam ter matado mais de 10 mil combatentes em bombardeios aéreos e operações terrestres em resposta ao ataque do Hamas, que deixou cerca de 1,2 mil mortos.
As Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) têm defendido repetidamente suas táticas, enfatizando que estão tentando ser precisas ao mirar nos combatentes e infraestruturas do Hamas, ao mesmo tempo que tentam minimizar as mortes de civis.
O Hamas não fornece nenhum número sobre as mortes de seus militares. A agência de notícias Reuters informou que um oficial havia admitido que 6 mil combatentes haviam sido mortos, mas o Hamas negou esse número à BBC.
O número de mortos registrado pelo Ministério da Saúde de Gaza, administrado pelo Hamas, considerado confiável pela Organização Mundial de Saúde (OMS), não faz distinção entre civis e combatentes. Mas desde que a guerra começou, os números mostram que pelo menos 70% dos mortos foram mulheres e crianças.
A BBC Verify pediu repetidamente às IDF que explicassem sua metodologia de contagem das mortes de combatentes do Hamas, mas eles não responderam.
Analisamos referências à morte de combatentes em comunicados à imprensa e em canais de rede social das IDF.
Em 19 de fevereiro, o jornal The Times of Israel noticiou que as IDF afirmaram que 12 mil combatentes haviam sido mortos. Apresentamos esse número às IDF que, em duas respostas separadas, nos disse que o número é “aproximadamente 10 mil” e “mais de 10 mil”.
Em meados de janeiro, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, afirmou que Israel tinha “destruído” dois terços dos regimentos de combate do Hamas em Gaza, mas não contabilizou os combatentes mortos. Uma estimativa das IDF antes da guerra sugeria que o Hamas tinha cerca de 30 mil combatentes em Gaza.
E, em dezembro, as IDF descreveram a análise de que estão matando dois civis para cada combatente do Hamas como “tremendamente positiva”, dados os desafios que enfrentavam no campo de batalha.
Mas, em 14 de novembro, pouco mais de um mês após o início da guerra, o canal das IDF no Telegram se referiu a “1.000 terroristas” mortos por “forças de divisão”.
Na época, o Ministério da Saúde havia anunciado 11.320 mortes.
A BBC Verify também revisou todos os 280 vídeos publicados no canal das IDF no YouTube de 7 de outubro a 27 de fevereiro — e descobriu que muito poucos continham evidências visuais de um grande número de combatentes mortos.
Destes, apenas um — publicado em 13 de dezembro — parece mostrar corpos de combatentes. Um punhado de vídeos mostram combatentes sendo baleados.
Também tentamos contar o número de alegações feitas individualmente sobre combatentes do Hamas mortos no principal canal das IDF no Telegram. Encontramos 160 mensagens em que alegavam terem matado um número específico de combatentes, num total de 714 mortes.
Mas também havia 247 referências que usavam termos como “vários”, “dezenas” ou “centenas” de mortos, tornando impossível uma contagem global significativa.
Contabilizar as mortes de combatentes é um desafio em qualquer zona de guerra. Em Gaza, muitos combatentes usam roupas civis, operam principalmente em redes de túneis no subsolo, e grande parte das mortes resulta de ataques aéreos.
Desde o início da incursão das IDF em Gaza, os militares acusaram o Hamas de usar a população civil como escudo humano.
Mas alguns especialistas estão preocupados que as IDF possam estar contando alguns não-combatentes como combatentes só porque eles fazem parte da gestão do território administrado pelo Hamas.
Andreas Krieg, professor de estudos de segurança na Universidade King’s College London, no Reino Unido, afirma:
“Israel adota uma abordagem muito ampla em relação aos ‘membros do Hamas’, que inclui qualquer ligação com a organização, incluindo gestores e funcionários públicos.”
Os dados de mortalidade do atual conflito fornecidos pelo Ministério da Saúde de Gaza mostram um aumento acentuado na proporção de mulheres e crianças entre os mortos, em comparação com as guerras anteriores.
“(Isso) indica uma taxa de morte de civis muito mais alta”, afirma Rachel Taylor, diretora-executiva da Every Casualty Counts, organização com sede no Reino Unido que visa registrar vítimas de conflitos violentos.
Quase metade da população de Gaza tem menos de 18 anos — e cerca de 43% dos mortos na guerra também são crianças. Para Taylor, o fato de que as mortes acompanham de perto os dados demográficos da população em geral “indica uma matança indiscriminada”.
“Em contrapartida, em 2014, havia um percentual bastante elevado de homens em ‘idade de combate’ entre os mortos, mas isso é muito menos evidente hoje”, diz ela.
Em média, mais de 200 pessoas foram mortas por dia desde o início do conflito, conforme indicam os dados do Ministério da Saúde de Gaza.
O ritmo das mortes parece, à primeira vista, ter desacelerado em comparação com as primeiras fases do conflito, de outubro a dezembro. Mas especialistas disseram à BBC que a dimensão real de mortos pela ofensiva de Israel provavelmente vai ser significativamente maior, uma vez que muitos hospitais, onde normalmente as mortes são registradas, não estão mais funcionando.
Estes números também incluem apenas mortes causadas por ataques militares, e não as decorrentes da fome ou de doenças, que preocupam cada vez mais as organizações internacionais de ajuda humanitária.
A B’tselem, organização de direitos humanos com sede em Jerusalém, disse que a guerra atual é muito mais mortal do que os conflitos anteriores entre Israel e Gaza.
“Estes são números que nunca vimos em guerras e ataques anteriores em Gaza ou em outros territórios”, declarou Dror Sadot, porta-voz da organização.
Ele disse que o número de mortos ilustra a abordagem descrita por um porta-voz das IDF no início da guerra, que disse que “embora balanceamos a precisão com a dimensão dos danos, neste momento estamos focados no que causa dano máximo”.
Fonte: BBC
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