Se o atual presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, for derrotado nas urnas em 28 de maio, pode haver grandes mudanças na forma como o país se relaciona com outras as nações do mundo.
Sob a liderança de Erdogan, a Turquia irritou aliados ocidentais ao estabelecer uma relação próxima com a Rússia. Também enviou tropas turcas para conflitos no Iraque, Síria e Líbia.
O candidato da oposição, Kemal Kilicdaroglun, prometeu ser mais pró-Ocidente e intervir menos no exterior.
Desde que a República da Turquia foi fundada em 1923, o país tem sido tradicionalmente aliado das potências ocidentais.
A Turquia tem um dos maiores exércitos da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a aliança defensiva do Ocidente. Também se candidatou para fazer parte da União Europeia.
Mas o presidente Erdogan descreve frequentemente as nações ocidentais como “imperialistas” ou “injustas”.
Sob a gestão dele, a Turquia aprofundou os laços com a Rússia.
Em 2019, comprou uma série de sistemas de mísseis de defesa aérea russos S-400.
Em retaliação, os EUA barraram a Turquia do consórcio internacional que desenvolve o caça F-35.
A Turquia também está bloqueando o pedido da Suécia para entrar na Otan após a invasão russa da Ucrânia, dizendo que a Suécia tem dado guarida a inimigos do Estado turco.
Se Kilicdaroglu for eleito presidente da Turquia, ele deve se concentrar em reparar as relações com as nações ocidentais, diz Galip Dalay, da Chatham House, um think tank de relações exteriores em Londres.
“Ele teria relações mais formais com o Ocidente. A política externa seria menos pessoal do que sob a gestão do presidente Erdogan, e mais diplomática.”
Kilicdaroglu diz que, como presidente, retomaria o pedido de adesão da Turquia à União Europeia e garantiria que as decisões do Tribunal Europeu de Direitos Humanos fossem cumpridas no país.
Mas ao ameaçar sair do acordo com a União Europeia para receber milhões de refugiados sírios, ele se mostrou disposto a confrontar as potências ocidentais.
Como a Turquia pode lidar com os refugiados sírios?
Há cerca de 3,7 milhões de sírios registrados oficialmente como residentes na Turquia, após terem fugido da guerra civil em seu país de origem — assim como refugiados de outras nações, como o Afeganistão.
O presidente Erdogan afirmou que a Turquia “não é capaz de lidar” com esse número.
Tanto ele quanto Kemal Kilicdaroglu disseram que querem “normalizar” as relações com a Síria para que os refugiados possam ser enviados de volta.
Mas isso significaria que eles voltariam a viver sob o regime autoritário do presidente Bashar al-Assad.
Neste mês, a imprensa turca citou Kilicdaroglu dizendo: “Vou mandar todos os refugiados de volta para casa assim que for eleito presidente, ponto final”.
Ele ameaçou sair de um acordo com a União Europeia em que a Turquia concordou em acolher milhões de refugiados da Síria, evitando que eles atravessassem para países do bloco europeu para pedir asilo.
Kilicdaroglu afirma que a União Europeia não cumpriu sua parte do acordo.
Como a política da Turquia em relação à guerra na Ucrânia pode mudar?
A Turquia tem tentado equilibrar o apoio que dá à Rússia e à Ucrânia desde o início da guerra.
O país se recusou a impor sanções ocidentais à Rússia, mas vendeu drones militares Bayraktar para a Ucrânia.
A Turquia também atuou como intermediária em um acordo para permitir que grãos ucranianos sejam exportados pelo Mar Negro para o resto do mundo.
Se Kilicdaroglu se tornasse presidente, poderia apoiar menos a Rússia, avalia Hamdullah Baycar, da Universidade de Exeter, no Reino Unido.
“Ele não teria um relacionamento tão profundo”, diz ele. “Mas, novamente, ele não faria inimigos na Rússia.”
Na Líbia, suas forças estão apoiando o Governo de Unidade Nacional — baseado na capital, Trípoli — contra as forças rebeldes no leste do país lideradas pelo general Haftar.
“A Turquia tem interesses comerciais de longa data na Líbia e quer ver o país estabilizado”, afirma Begum Zorlu, da City University, em Londres.
No Iraque e na Síria, as forças turcas se opõem a um grupo chamado Unidades de Proteção Popular, ou YPG, assim como a elementos do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, que foi banido na Turquia e em muitos outros países como uma organização terrorista.
O governo turco suspeita que o YPG apoie o PKK.
Isso irritou os EUA, que veem o YPG como um de seus principais aliados na Síria, se opondo ao regime do presidente Bashar al-Assad.
Kilicdaroglu diz que, como presidente, adotaria uma política externa “não-intervencionista”.
No entanto, não está claro se ele tiraria as forças turcas do Iraque, Síria ou Líbia.
“Há muitos nacionalistas na aliança de oposição a Kilicdaroglu que seriam contra isso”, observa Zorlu.
Como as relações da Turquia com a China podem mudar?
A relação da Turquia com a China gira em torno de comércio e finanças.
O país aderiu à Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês) para melhorar suas relações comerciais e obteve empréstimos da China.
A China forneceu à Turquia suas primeiras vacinas contra covid-19 durante a pandemia.
Erdogan tem tido o cuidado de não aborrecer o governo chinês e tem se mantido em silêncio sobre as denúncias de repressão da China contra os uigures — embora eles sejam considerados um povo turcomano.
Kilicdaroglu diz que, como presidente, falaria abertamente sobre o assunto com o governo da China.
Mas Baycar adverte: “Kilicdaroglu é eloquente agora sobre os uigures, mas pode baixar o tom se chegar ao poder.”
A política externa de ‘soft power’ da Turquia na África pode mudar?
Nos últimos 20 anos, a Turquia estabeleceu novas embaixadas em dezenas de países na África.
E usou seu “soft power” lá, abrindo escolas em todo o continente e oferecendo bolsas de estudo para africanos estudarem na Turquia.
Também vendeu equipamentos de defesa, como drones, para vários governos africanos.
Zorlu diz que o governo de Erdogan tem sido ativo na África porque ele está tentando promover o status da Turquia como defensora das nações mais pobres.
“O presidente Erdogan tem tentado formar uma coalizão de Estados que se sentem abandonados pelo Ocidente”, afirma.
No entanto, segundo ela, a política da Turquia em relação à África provavelmente vai permanecer igual, mesmo que a Presidência mude.
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