- Guillermo López Lluch
- The Conversation*
“Mens sana in corpore sano” (“Uma mente sã num corpo são”). Costumamos usar essa citação em latim para ressaltar o efeito benéfico da atividade física nas habilidades mentais.
Na verdade, a frase apareceu na Sátira X escrita pelo comediante romano Juvenal no século II e era mais longa: indicava que era preciso orar para ter um espírito saudável em um corpo saudável (“orandum est ut sit mens sana in corpore sano”).
Mas é verdade que manter o corpo saudável, equilibrado e exercitado ajuda a manter as capacidades mentais do nosso cérebro? Sim, e há muitas evidências científicas para provar isso, especialmente quando se trata de envelhecimento.
O cérebro perde volume durante o envelhecimento
À medida que envelhecemos, tecidos e órgãos se degeneram. A capacidade de manter a funcionalidade das células diminui e há uma perda de tecido. Isso também ocorre no cérebro, com a consequente neurodegeneração ou perda de neurônios.
Seja em patologias como o mal de Alzheimer ou na perda de funcionalidade devido ao envelhecimento, ocorrem no cérebro diversas alterações associadas à perda de função. Entre eles, afinamento da área cortical, perda de tecido cinza (corpos neuronais) e branco (condução nervosa), aumento do volume dos ventrículos (orifícios dentro do cérebro onde está o líquido cefalorraquidiano) e diminuição de neurônios em diferentes áreas, principalmente no hipocampo.
Em um estudo longitudinal envolvendo centenas de voluntários durante anos, o estudo Baltimore, foi demonstrado que a redução da capacidade metabólica associada ao envelhecimento está relacionada ao aumento do volume do ventrículo cerebral — o espaço “oco” do cérebro. E isso leva a um aumento na neurodegeneração e atrofia do órgão pensante.
Se a redução da capacidade metabólica implica perda de volume cerebral, podemos deduzir que um melhor uso da energia através do exercício poderia retardar a perda de tecido cerebral.
Mais exercício, mais memória
É assim que funciona? A resposta não é tão fácil. Especialmente porque um dos principais obstáculos que encontramos ao determinar o efeito de qualquer intervenção no cérebro é a impossibilidade prática de verificar rapidamente suas consequências.
O cérebro não é como sangue ou músculo, que rapidamente mostram uma resposta facilmente mensurável diretamente ou a partir de componentes do sangue.
A boa notícia é que a chegada de métodos de imagem cada vez mais confiáveis está permitindo detectar algumas mudanças estruturais em determinadas áreas do cérebro.
Há muito temos evidências de que a prática de exercícios físicos melhora a capacidade cognitiva e aumenta o tamanho de certas áreas do cérebro, especialmente aquelas relacionadas à memória.
Por exemplo, um artigo de 2011 publicado na revista científica PNAS indicou que o exercício físico aumenta o volume do hipocampo, a seção do cérebro onde reside a memória. Outros estudos em idosos mostraram que o exercício físico também preveniu a perda de volume nessa área do cérebro.
Por outro lado, a prática de exercício físico controlado em uma população de idosos revelou que existe uma correlação positiva entre a prática de exercício físico e a quantidade de massa cinzenta em outras áreas do cérebro sensíveis à degeneração associada ao envelhecimento.
Nós tendemos a pensar em nosso corpo como um sistema compartimentalizado. Se temos um problema de fígado, focamos no fígado, e se for no rim, então no rim.
Mas nosso corpo não funciona assim: tudo está interligado. É por isso que um problema renal pode acabar agravando doenças cardíacas, ou um problema hepático pode causar isquemia cerebral.
No envelhecimento em particular, os complexos equilíbrios corporais encontram-se numa situação muito precária.
Quando nos exercitamos, colocamos nosso corpo sob estresse moderado, pois forçamos as células a aumentar o gasto de energia. Isso implica mobilizar nutrientes, que devem passar dos estoques para os músculos. Todas as mudanças fisiológicas necessárias para lidar com esse estresse moderado são conhecidas como hormese.
No processo de hormese, os músculos liberam substâncias que informam ao restante dos órgãos que a demanda de energia está aumentando. Essas substâncias, as miocinas, são liberadas no sangue, que as distribui para o restante dos órgãos.
Algumas dessas miocinas chegam ao cérebro e ali induzem a expressão de genes e proteínas que aumentam a capacidade dos neurônios de estabelecer novas conexões ou fortalecer as já existentes.
Uma dessas miocinas é chamada de BDNF (fator neurotrófico derivado do cérebro), essencial para que os neurônios estabeleçam conexões e, assim, as mantenham ativas. Desta forma simples podemos explicar porque o exercício físico mantém o volume cerebral durante o envelhecimento.
Por outro lado, o exercício físico também aumenta o fluxo sanguíneo e a oxigenação, tendo um impacto positivo na atividade cerebral também em idosos.
Além disso, outros estudos mostraram que o exercício físico moderado produz efeitos anti-inflamatórios que podem afetar o cérebro, por exemplo, reduzindo assim a progressão do Alzheimer ou demência senil.
Evidências científicas, diretas e indiretas, deixam claro que praticar atividade física no envelhecimento ajuda a prevenir a degeneração cerebral, dando pleno sentido à frase “mens sana in corpore sano”.
É melhor evitar a inatividade e o sedentarismo se quisermos acrescentar vida aos anos e não apenas anos à vida.
*Guillermo López Lluch é professor da área de Biologia Celular, pesquisador associado do Centro Andaluz de Biologia do Desenvolvimento e pesquisador em metabolismo, envelhecimento e sistemas imunológico e antioxidante na Universidade Pablo de Olavide, na Espanha
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em espanhol).
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