- Fidelma Fitzpatrick
- The Conversation*
A maioria de nós associa resfriados e gripes com o clima mais frio. Mas isso não significa que você não pode pegar um resfriado durante o verão.
Alguns vírus são até mais comuns no verão do que no inverno.
O vírus da gripe e o vírus sincicial respiratório (VSR) são mais comuns nos meses de inverno, uma vez que as temperaturas mais frias e a maior permanência em ambientes fechados junto a outras pessoas proporcionam condições favoráveis à sua propagação.
Mas no verão, os enterovírus e o parainfluenza 3 são muito mais comuns, com as infecções por estes vírus tendendo a atingir o pico no verão e no início do outono, quando o clima é mais quente e úmido.
Ambos os vírus provocam sintomas típicos de resfriado, incluindo coriza, baixa de energia, dores musculares, tosse, dor de cabeça e dor de garganta.
O parainfluenza às vezes pode levar à bronquite e pneumonia em pessoas que possuem um sistema imunológico fragilizado.
Embora estes sintomas sejam semelhantes aos de alergias respiratórias, a principal diferença é que as alergias tendem a não causar febre ou dores no corpo — e raramente provocam tosse.
Os resfriados duram de alguns dias a duas semanas, mas, dependendo do que desencadeou a alergia, os sintomas da mesma podem durar todo o verão para algumas pessoas.
Parece estranho que certas infecções virais sejam mais comuns nos meses mais quentes, quando passamos mais tempo ao ar livre.
Mas nos meses mais quentes, também socializamos e viajamos mais — o que significa que estamos nos misturando com um número maior de pessoas, às vezes de diferentes partes do mundo.
Muitos de nós também buscam ambientes fechados com ar-condicionado quando o clima está quente.
Mas a estrutura de um vírus também pode explicar por que alguns se espalham mais facilmente nos meses mais quentes.
Para que um vírus se propague e infecte células saudáveis, ele precisa sobreviver tanto fora quanto dentro do corpo — e também precisa usar o maquinário das células humanas (como seu DNA) para criar cópias de si mesmo.
Os vírus são envoltos por um “revestimento” de proteína, chamado capsídeo, que não apenas dá forma ao vírus, como também protege seu material genético interno.
O capsídeo também ajuda o vírus a se ligar às células humanas para causar infecções.
Diferenças estruturais
Alguns vírus (chamados de “vírus envelopados”) também são envoltos por um envelope lipídico (ácido graxo).
Este envelope viral ajuda o vírus a evitar ser destruído pelo sistema imunológico. E também desempenha um papel na interação com células humanas para causar infecção.
Muitos vírus “de inverno” (incluindo influenza e RSV) são vírus envelopados. Os vírus envelopados tendem a ser mais vulneráveis ao calor e à secura do que os vírus que não possuem envelopes.
Esta é uma das razões pelas quais se acredita que os vírus do resfriado de inverno sobrevivem melhor no ambiente mais frio da estação.
Enquanto alguns vírus causadores de resfriados de verão (como os enterovírus) não possuem envelope, outros (parainfluenza 3) têm envelope.
Na verdade, o vírus parainfluenza 3 é mais comum quando as temperaturas são altas e a umidade é baixa (embora possa sobreviver em diferentes umidades).
Isso sugere que outras partes da estrutura de um vírus, além do envelope, podem desempenhar algum papel sobre em que condições ele pode sobreviver e se espalhar melhor — mas são necessárias mais pesquisas para entender melhor isso.
A interação entre a temperatura e a resposta imune a um vírus também pode exercer um papel nisso.
Um estudo mostrou que camundongos expostos a temperaturas de 36°C apresentam uma resposta imune reduzida contra o vírus da gripe.
No entanto, mais pesquisas são necessárias para confirmar esta descoberta em humanos.
Resposta imune
Muita gente relatou ter tido resfriado de verão neste ano, deixando muitos se perguntando por que isso aconteceu — e se a pandemia de covid-19 desempenhou um papel nisso.
A imunidade ao vírus do resfriado comum é de curta duração. Assim, a cada estação, quando somos expostos a novas variantes, nosso sistema imunológico precisa se adaptar.
Mas durante a pandemia de covid-19, várias medidas — como lockdown, distanciamento e uso de máscaras — limitaram a exposição que muita gente teve a estes vírus.
Quando voltamos a nos reunir após o lockdown, os vírus do resfriado começaram a circular, mas nossa imunidade não havia sido reforçada pela exposição a estes vírus no ano anterior.
Embora a previsibilidade dos vírus sazonais tenha mudado desde o surgimento da covid-19, os aumentos nos resfriados de verão observados neste ano provavelmente se devem ao fato de estarmos viajando mais, de haver mais interação social, menos uso de máscara e distanciamento e menos exposição a vírus respiratórios no ano anterior.
Neste ano, muitas partes do mundo também registraram temperaturas extremamente altas e uma série de ondas de calor.
Estas flutuações de temperatura e umidade podem ter desempenhado um papel na transmissão do vírus do resfriado comum neste ano.
Estes fatores também vão se tornar ainda mais relevantes no futuro — e podem até mudar a época do ano em que vemos certos vírus.
As mudanças climáticas podem piorar ainda mais a propagação dos vírus no futuro.
Como não há vacina para resfriados de verão, a melhor coisa que você pode fazer para evitar pegar é ficar longe de pessoas doentes (se possível), lavar as mãos e evitar tocar o rosto.
Se você der o azar de pegar, o conselho para se recuperar é o mesmo de um resfriado de inverno: tome muito líquido, descanse bastante e coma alimentos nutritivos.
Para proteger os outros, também é recomendado cobrir o nariz e a boca com a parte interna do cotovelo ou usar lenço de papel ao tossir ou espirrar.
Também pode valer a pena pensar em como você pode se proteger de ficar doente à medida que as temperaturas esfriam nos próximos meses (no hemisfério norte).
A vacina contra a gripe é recomendada todo inverno para certas pessoas, por isso é aconselhável verificar se você deve tomar a vacina contra a gripe neste ano.
Neste ano, a gripe foi particularmente ruim para a Austrália, e as previsões sugerem que será o mesmo cenário para muitas partes do mundo no inverno.
* Fidelma Fitzpatrick é microbióloga clínica do Beaumont Hospital, em Dublin, na Irlanda; e chefe do departamento de microbiologia clínica da Universidade de Medicina e Ciências da Saúde RCSI, na Irlanda.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).
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